Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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McNeill (2006:60-61) – Analítica do Dasein enquanto protoética

domingo 30 de abril de 2017

Tradução

Expressamente escolher si mesmo aqui se refere à existência autêntica, como Heidegger segue indicando, que demanda "total auto-engajamento", isto é, expressamente atuar sua própria finitude, a finitude do eu concretamente existente, corporificado. Esta atuação explícita de pleno auto-engajamento acarreta vir a ver, e assumir como as bases de suas ações, a finitude que o Dasein "sempre já é, na medida em que existe". Aqui vemos como a analítica do Dasein se desdobra como uma hermenêutica da existência. Demanda de cada indivíduo que ele ou ela descerre, via a interpretação do Dasein como autointerpretação, o que sempre foi, mas que estava oculto nas interpretações dominantes subjacentes à forma cotidiana como conversa de "a-gente" (das Man) - tais interpretações (por exemplo, o eu como "sujeito") sendo aquelas transmitidas pela tradição filosófica dominante. Quando Heidegger fala da relação ontológica ao eu como a "pressuposição" para diferentes possibilidades de comportamento ôntico, tal pressuposto não deve ser entendido como uma "condição de possibilidade" teórico-transcendental, mas existencialmente (isto é, como indicaremos em um momento, em termos da primazia do futuro originário ekstático). Porque tal existir sempre se desdobra facticamente como uma relação singular de corporificação, é irredutível a uma determinação formal ou abstrata da existência humana que poderia simplesmente ser aplicada a casos particulares. Isso não significa apenas que, como hermenêutica, a analítica do Dasein é intrinsecamente protoética; também significa que exige e exorta cada indivíduo a se engajar em autotransformação, a atender a, como diz Nietzsche  : "Como alguém se torna - o que é".

Com efeito, este engajamento ontológico em autotransformação é o que é exigido para que a analítica ontológica do Dasein não se torne um discurso meramente teórico. Lê-lo como tal, como uma descrição teórica da existência humana, é deixar de ouvir desde o início a reivindicação que nos foi dirigida no enunciado de que o Dasein é a entidade que nós mesmos somos em cada caso (je). É entender mal toda a importância da analítica. É a natureza hermenêutica do discurso da analítica do Dasein em Ser e Tempo  , de seu logos, que resiste à redução a um logos meramente teórico. Este discurso, como discurso de "enunciados existencial-ontológicos da essência", não apresenta "teses éticas" sobre a prioridade do egoísmo ou do altruísmo, porque seus enunciados não são redutíveis às posturas de um logos teórico ou representacional. Em outras palavras, o tipo de ética que está sofrendo resistência é precisamente aquela concepção de ética que consideraria a conduta ética adequada como dependente simplesmente (ou mesmo principalmente) da aplicação de uma teoria formal, seja de regras particulares ou de princípios regulatórios gerais. E é isso que está em jogo na insistência de que a ontologia do Dasein não tome como seu objeto um "eu" ou "sujeito" "sem mundo". Assim, Heidegger enfatiza em Ser e Tempo  : "O objeto que tomamos como nosso tema é artificial e dogmaticamente excluído se alguém se restringe ’em primeira instância’ a um ’sujeito teórico’, a fim de então suplementá-lo ’do lado prático’ aderindo a uma ’ética’" (SZ  :316). Da mesma forma, na "Carta sobre ’Humanismo’" de 1946, ao retomar a questão que lhe foi dirigida logo após a publicação de Ser e Tempo  , a questão "Quando você vai escrever uma ética?", Heidegger mostra a ingenuidade da questão ao indicar que, a despeito de certas deficiências, a analítica do Dasein já é protoética, assim como seu pensamento posterior do Ser "não é teórico nem prático" (GA9  :183-88).

Original

Expressly choosing oneself here refers to authentic existence, as Heidegger goes on to indicate, which demands "full self-engagement," that is, expressly enacting one’s own finitude, the finitude of the concretely existing, embodied self. This explicit enactment of full self-engagement entails coming to see, and to assume as the grounds of one’s actions, the finitude that Dasein "always already is, so far as it exists." Here we see how the analytic of Dasein unfolds as a hermeneutic of existence. It demands of each individual that he or she disclose, via the interpretation of Dasein as self-interpretation, what he or she always already was, yet which was concealed in the dominant interpretations underlying the everyday way in which "people" (das Man) talk — such interpretations (e.g., the self as "subject") being those passed down by the dominant philosophical tradition. When Heidegger speaks of the ontological relation to self as the "presupposition" for different possibilities of ontic comportment, such presupposition is not to be understood as a theoretico-transcendental [61] "condition of possibility," but existentially (that is, as we shall indicate in a moment, in terms of the primacy of the originary, ekstatic future). Because such existing always unfolds factically as a singular relation of embodiment, it is irreducible to a formal or abstract determination of human existence that could simply be applied to particular cases. This not only means that, as a hermeneutic, the analytic of Dasein is intrinsically protoethical; it also means that it calls for, and calls upon each individual to engage in self-transformation, to attend to, as Nietzsche   puts it, "How one becomes — what one is." [1]

Indeed, this ontological engagement in self-transformation is what is demanded if the ontological analytic of Dasein is not to become a merely theoretical discourse. To read it as such, as a theoretical description of human existence, is to fail to hear from the outset the claim addressed to us in the statement that Dasein is the entity that we ourselves in each case (je) are. It is to misunderstand the entire import of the analytic. It is the hermeneutic nature of the discourse of the analytic of Dasein in Being and Time  , of its logos, that resists reduction to a merely theoretical logos. This discourse, as a discourse of "existential-ontological statements of essence," does not present "ethical theses" about the priority of egoism or altruism because its statements are not reducible to the positings of a theoretical or representational logos. In other words, the kind of ethics that is being resisted is precisely that conception of ethics which would regard proper ethical conduct as dependent simply (or even primarily) on the application of a formal theory, whether of particular rules or general regulatory principles. And this is what is at stake in the insistence that the ontology of Dasein not take as its object a "worldless" ’I’ or "subject." Thus, Heidegger emphasizes in Being and Time  : "The object we have taken as our theme is artificially and dogmatically foreclosed if one restricts oneself ’in the first instance’ to a ’theoretical subject,’ in order then to supplement it ’on the practical side’ by tacking on an ’ethics’ " (SZ  :316). Similarly, in the 1946 "Letter on ’Humanism,’ " when taking up the question addressed to him shortly after the publication of Being and Time  , the question "When are you going to write an ethics?," Heidegger shows the naivity of the question by indicating that, despite certain shortcomings, [2] the analytic of Dasein is already protoethical, just as his later thinking of Being is "neither theoretical nor practical" (GA9  :183-88). (p. 60-61)

[MCNEILL  , William. The Time of Life. Heidegger and Êthos. New York: State University of New York Press, 2006, p. 60-61]


Ver online : THE TIME OF LIFE


[1These words allude, of course, to the subtitle of Nietzsche’s Ecce Homo.

[2The shortcomings include in particular the Husserlian legacy of attempting a scientific phenomenology which, in seeking to objectify and thematize Being (Sein), is inevitably drawn back to a theoretical stance at odds with the existentiell foundation of the ontological analytic of Dasein. Cf. Heidegger’s admission, in the "Letter on ’Humanism,’ " of the "inappropriate attempt to do science" (GA9:187). This indicates that Being and Time itself calls for a kind of double reading, attentive on the one hand to the continued presence of the "theoretical" ideal (which should not be denied), and on the other hand to the more radical, "protoethical," existentiell foundation that is our focus here.