À primeira vista, o requisito inicial pode parecer obscuro ou redundante. Heidegger está dizendo que é preciso formular a investigação de uma maneira particular. Em vez de perguntar o que é compreensão, o que é culpa ou o que é o mundo, deve-se perguntar o que significa ser aquilo que pode compreender, o que significa ser culpado, o que significa ser em um mundo. Agora, alguém pode protestar que certamente essa exigência é artificial, que a forma gramatical da pergunta não fará tanta diferença. Ou alguém pode protestar que a exigência é desnecessária, já que, se insistirmos na pergunta, ela se torna inevitável se for feita com cuidado. Essas objeções não são bem fundamentadas. No capítulo três, mostramos como a formulação do infinitivo de fato muda consideravelmente o caráter da investigação, concentrando-se [171] diretamente no sentido sem exigir uma elucidação da natureza do assunto. Com relação à possível inevitabilidade de questionar a formulação, não é óbvio que o sentido da existência deva ser formulado de acordo com o que significa ser. Há muitas interpretações da existência humana que não usam essa formulação e, consequentemente, chegam a conclusões diferentes.
Esta exigência insiste que toda e qualquer instância de autoinvestigação seja traduzida de acordo com linhas que a tornem compatível com a fórmula básica: O que significa ser de tal e tal maneira? O conjunto ou a totalidade de tais maneiras constitui um entendimento do que significa ser de fato. Ao insistir nessa formulação, Heidegger deu unidade temática à investigação. Essa unidade temática é importante, pois mantém as várias reflexões e análises da existência vinculadas a um tema ou questão central, evitando, assim, confundir o estranho com o essencial; mais importante ainda, a consistência da formulação permite que uma ordem ou classificação dos vários modos de existência se apresente. Assim, Heidegger pode distinguir a mais ampla dessas reflexões (o que significa ser em um mundo: In-der-Welt-sein) de outras mais específicas (o que significa ser com os outros: Mit-sein), bem como se concentrar no modo subjacente de existência (o que significa ser motivo de preocupação: Sorge). Ao insistir que a pesquisa tenha um tema constante, a primeira condição para dar à pesquisa a autoridade de uma disciplina foi alcançada. Além disso, ao insistir na formulação em termos da questão do que significa ser, a tendência de cair em uma metafísica da substância ou na linguagem do naturalismo é bastante reduzida.
Ao insistir nessa formulação, Heidegger não é culpado de petitio principii. O simples fato de ele interpretar os fenômenos da existência à luz da questão do que significa ser não desacredita sua afirmação de que essa investigação é possível. Afinal de contas, a melhor maneira de mostrar que algo é possível é fazê-lo. Se, ao fazer as perguntas sobre a existência dessa maneira, Heidegger puder desenvolver uma imagem racional e consistente do significado da [172] existência humana, então ele cumpriu sua tarefa. Ele não pode primeiro provar que tais questões são significativas sem fazer as perguntas da maneira que as torna significativas. Pedir-lhe que faça isso seria pressupor o que ele de fato elaborou.