Carneiro Leão
Em razão de a compreensão do Ser flutuar, às mais das vezes, num significado indeterminado e permanecer, no entanto, certa e determinada em nosso saber a seu respeito; em razão de continuar, em toda a sua eminência, obscura e confusa, velada e oculta, deve ser revelada, esclarecida e desocultada. o que só poderá ocorrer, inquirindo essa compreensão do Ser - que, de início, tomamos apenas, como um fato -, a fim de colocá-la em questão.
A investigação é a maneira autêntica, adequada e única de se dignificar o que, por sua suprema eminência, detém, em seu poder, a nossa existência. Essa compreensão do Ser e, mais ainda, o Ser mesmo constitui, portanto, o que há de mais digno de ser posto em questão [das Fragwürdigste] em toda investigação. A autenticidade de nossa investigação se mede assim, quanto mais imediata e diretamente nos mantivermos fiéis ao que é mais digno de ser investigado, a saber, ao fato de que o Ser é para nós a compreensão [das Verstandene] inteiramente indeterminada e, ao mesmo tempo, sumamente determinada.
Compreendemos a palavra "Ser" e com ela todas as suas variações, ainda que tal compreensão pareça indeterminada.
O que compreendemos, o que se nos manifesta, de algum modo, na compreensão, dele dizemos, que tem um sentido. O Ser, porquanto é simplesmente compreendido, tem um sentido. Fazer a experiência e conceber o Ser, como o que mais é digno de ser posto em questão (das Fragwürdigste), inquirir, portanto, o Ser propriamente, não significa outra coisa do que investigar o sentido do Ser.
No Tratado "Ser e Tempo " a questão sobre o Sentido do Ser é posta e desenvolvida pela primeira vez na história da filosofia, COMO QUESTÃO, propriamente dita. Nele também se diz e fundamenta detalhadamente o que se entende por Sentido (a saber a manifestação do Ser e não apenas do ente como tal, cfr. Sein und Zeit , §§ 32, 44, 65).
Por que já não podemos chamar de um fato, o que agora mencionamos? Por que essa designação de fato era, desde o início, enganadora? Porque a nossa compreensão do Ser não se dá simplesmente em nossa existência, como, por exemplo, o fato de possuirmos lóbulos auriculares desse ou daquele feitio. O pavilhão auditivo, ao invés de lóbulos, poderia ser feito de outra forma. Ora, que compreendemos o Ser, não é apenas real mas também necessário. Sem essa abertura do Ser não poderíamos, de forma alguma, ser "homens". Que o sejamos, não é, sem dúvida, absolutamente necessário. De per si subsiste a possibilidade de o homem simplesmente não ser. Houve até um tempo em que o homem não era. Quer dizer, rigorosamente falando, não podemos dizer, houve um tempo em que o homem não ERA. Em todo tempo o homem era, é e será, porque o tempo só se temporaliza [zeitigt], enquanto o homem é. Não houve tempo algum em que o homem não fosse, não porque o homem seja desde toda e por toda a eternidade, mas porque tempo não é eternidade, porque tempo só se temporaliza num tempo, entendido como existência Histórica do homem. Se, porém, o homem está na existência, é uma condição necessária que ele possa estar presente ao Ser [da-sein], i.é que ele compreenda o Ser. Enquanto isso for necessário, o homem será também Historicamente real. Por isso sempre compreendemos o Ser, e não apenas, como poderia parecer, de início, no modo de seu significado verbal flutuante. A determinação, em que lhe compreendemos o significado indeterminado, pode-se, ao contrário, delimitar univocamente [eindeutig], e não só, como algo acessório, mas, como a determinação, que, sem o sabermos, nos domina desde o fundamento de nosso ser. Para mostrá-lo, partimos novamente da palavra, "ser". Deve-se ressaltar, porém, que, de acordo com a questão condutora da metafísica, exposta no primeiro capítulo, a palavra, "ser" se emprega aqui numa tal envergadura, que seu arco só encontra limites no Nada. Tudo, que não seja simplesmente nada, e até mesmo o Nada, "pertence" ao Ser. [GA40PT :109-112]
Fried & Polt
Because the understanding of Being fades away, at first and for the most part, in an indefinite meaning, and nonetheless remains certain and definite in this knowledge — because consequently the understanding of Being, despite all its rank, is dark, confused, covered over and concealed — it must be illuminated, disentangled, and ripped away from concealment. That can happen only insofar as we inquire about this understanding of Being — which at first we simply treated as a fact — in order to put it into question.
Questioning is the genuine and the right and the only way of deeming worthy that which, by its highest rank, holds our Dasein in its power. This understanding of Being of ours, and Being itself altogether, is therefore what is most worthy of questioning in all [88] questioning. We question all the more genuinely the more immediately and directly we hold on to what is most worthy of questioning, namely, that for us Being is what we understand in a completely indefinite and yet supremely definite way.
We understand the word “Being,” and hence all its inflections, even though it looks as if this understanding were indefinite. We say of what we thus understand, of whatever opens itself up to us somehow in understanding, that it has meaning (Sinn). Being, insofar as it is understood at all, has a meaning. To experience and conceive of Being as what is most worthy of questioning, to inquire especially about Being, then means nothing other than asking about the meaning of Being.
In the treatise Being and Time the question of the meaning of Being is first posed and developed especially as a question. The treatise also contains an explicit statement and grounding of what is meant by meaning [namely, the openness of Being, not only of beings as such — see Being and Time , §§ 32, 44, 65]. [1]
Why may we no longer call what we have just mentioned a fact? Why was this designation misleading from the start? Because this, that we understand Being, does not just occur in our Dasein like the fact, say, that we possess earlobes of such and such a sort. Instead of earlobes, some other structure could form part of our hearing organ. That we understand Being is not just actual; it is also necessary. Without such an opening up of Being, we could not be “human” in the first place. Of course, it is not unconditionally necessary that we should be. There is always the possibility that there could be no human beings at all. After all, there was a time when there were no human beings. But strictly speaking, we cannot say there was a time when there were no human beings. At every time, there were and [89] are and will be human beings, because time temporalizes itself [2] only as long as there are human beings. There is no time in which there were no human beings, not because there are human beings from all eternity and for all eternity, but because time is not eternity, and time always temporalizes itself only at one time, as human, historical Dasein. But if human beings stand in Dasein, then one necessary condition for our ability to be here (da-sein) is this: that we understand Being. Insofar as this is necessary, human beings are also historically actual. For this reason we understand Being — and not only, as it might seem at first, as an evanescent meaning of a word. Rather, the definiteness with which we understand the indefinite meaning can be delimited unambiguously, and not as a subsequent addition, but as a definiteness that, unbeknownst to us, rules us from the ground up. In order to show this, we will once again take the word “Being” as our point of departure. But here one must remember that we use the word, in accordance with the guiding metaphysical question that we posed at the start, so broadly that it finds its limit only at Nothing. Everything that is not simply nothing, is — and for us, even Nothing “belongs” to “Being.” [GA40EN :85-89]
Kahn
C’est parce que la compréhension de l’être se perd d’abord et le plus souvent en une signification flottante et indéterminée, tout en restant pourtant ferme et déterminée en tant que savoir, c’est parce qu’ainsi la compréhension de l’être, en dépit de son éminence, est obscure, embrouillée, couverte et latente, qu’il faut l’éclaircir, la débrouiller, et l’arracher à la latence. Cela ne peut se produire que si nous questionnons vers cette compréhension de l’être, que nous avons commencé par accepter seulement comme un fait, et ainsi la mettons en question.
Nous comprenons le mot “ être ”, et par suite toutes ses formes modifiées, quoiqu’il semble que cette compréhension reste indéterminée. Ceci que nous comprenons, et qui toujours s’ouvre à nous de quelque manière dans le comprendre, nous en disons : cela a un sens. L’être, si du moins il est possible de le comprendre, présente un sens. Faire l’expérience de l’être comme de ce qui est le plus digne de question, le concevoir ainsi, re-chercher proprement l’être, ce n’est alors rien d’autre que : questionner vers le sens de l’être.
Ceci, à savoir que nous comprenons l’être, ce n’est pas seulement réel, c’est nécessaire. Sans une telle ouverture de l’être, nous ne pourrions d’aucune façon être “ les hommes. Que nous soyons, ce n’est certes pas absolument nécessaire. Il est parfaitement possible que l’homme ne soit pas. Il a été un temps en effet, où l’homme n’était pas. Toutefois c’est improprement que nous disons : il a été un temps où l’homme n’était pas. En tout temps l’homme était et est et sera, parce que le temps se temporalise seulement du fait que l’homme est. Il n’y a aucun temps où l’homme n’ait pas été, non que l’homme soit de toute éternité et pour l’éternité, mais parce que le temps n’est pas l’éternité et que le temps ne se temporalise que pour chaque temps, à savoir comme être-Là humain proventuel. Mais lorsque l’homme se trouve dans l’être-Là, il y a alors une condition nécessaire pour qu’il puisse être-le-là : c’est qu’il comprenne l’être. C’est parce qu’une telle condition est nécessaire que l’homme est réel proventuellement. C’est pourquoi nous comprenons l’être, et cela non pas seulement, comme il pourrait d’abord le sembler, à la manière d’une signification de mot évanescente. Ce caractère déterminé de notre compréhension d’une signification indéterminée, on peut bien plutôt le délimiter d’une façon univoque, et cela non pas après coup, mais comme un caractère déterminé qui nous gouverne dès le principe sans que nous le sachions. Pour le montrer, partons de nouveau du mot “ être”. Mais ici il faut rappeler que, conformément à la question métaphysique directrice posée au début, nous employons le mot d’une façon si large qu’il n’est limité que par le néant. Tout ce qui n’est pas absolument néant est, et même le néant “ appartient ” pour nous à l’ “ être ”. [GA40FR :91-94]
Original
Weil das Verstehen des Seins zunächst und zumeist in einer unbestimmten Bedeutung verschwebt und dennoch wiederum in diesem Wissen sicher und bestimmt bleibt, weil demnach das Verstehen des Seins bei all seinem Rang dunkel, verworren, verdeckt und verborgen ist, muß es aufgehellt, entwirrt und der Verborgenheit entrissen werden. Das kann nur geschehen, indem wir diesem Verstehen des Seins, das wir erst nur wie eine Tatsache hinnahmen, nachhagen, um es in Frage zu stellen.
Das Fragen ist die echte und rechte und einzige Weise der Würdigung dessen, was aus höchstem Rang unser Dasein in der Macht hält. Dieses unser Verstehen von Sein und vollends das Sein selbst ist daher das Fragwürdigste alles Fragens. Wir fragen um so echter, je unmittelbarer und unentwegter wir beim Fragwürdigsten aushalten, dabei nämlich, daß das Sein uns das gänzlich unbestimmt und doch zuhöchst bestimmt Verstandene ist.
Wir verstehen das Wort »Sein« und damit alle seine Abwandlungen, wenngleich es so aussieht, als bliebe dieses Verstehen unbestimmt. Solches, was wir verstehen, was im Verstehen sich uns überhaupt irgendwie eröffnet, von dem sagen wir: es hat einen Sinn. Das Sein hat, sofern es überhaupt verstanden wird, einen Sinn. Das Sein als das Fragwürdigste erfahren und begreifen, eigens dem Sein nachfragen, heißt dann nichts anderes als: nach dem Sinn von Sein fragen.
In der Abhandlung »Sein und Zeit « wird die Frage nach dem Sinn des Seins erstmals in der Geschichte der Philosophie als Frage eigens gestellt und entwickelt. Dort ist auch ausführlich gesagt und begründet, was mit Sinn gemeint ist [nämlich die Offenbarkeit des Seins, nicht nur des Seienden als solchen, vgl. Sein und Zeit §§ 32, 44, 65].
Warum dürfen wir das jetzt Genannte nicht mehr eine Tatsache nennen? Weshalb war diese Benennung von Anfang an irreführend? Weil dieses, daß wir das Sein verstehen, in unserem Dasein nicht nur auch vorkommt wie etwa dieses, daß wir so und so beschaffene Ohrläppchen besitzen. Statt solcher könnte irgendein anderes Gebilde das Hörorgan mitausmachen. Daß wir das Sein verstehen, ist nicht nur wirklich, sondern es ist notwendig. Ohne solche Eröffnung des Seins könnten wir überhaupt nicht »die Menschen« sein. Daß wir sind, ist freilich nicht unbedingt notwendig. Es besteht an sich die Möglichkeit, daß der Mensch überhaupt nicht ist. Es gab doch eine Zeit, da der Mensch nicht war. Aber streng genommen können wir nicht sagen: es gab eine Zeit, da der Mensch nicht war. Zu jeder Zeit war und ist und wird der Mensch sein, weil Zeit sich nur zeitigt, sofern der Mensch ist. Es gibt keine Zeit, da der Mensch nicht war, nicht weil der Mensch von Ewigkeit her und in alle Ewigkeit hin ist, sondern weil Zeit nicht Ewigkeit ist und Zeit sich nur je zu einer Zeit als menschlich-geschichtliches Dasein zeitigt. Wenn aber der Mensch im Dasein steht, dann ist eine notwendige Bedingung dafür, daß er da-sein kann, dieses, daß er das Sein versteht. Sofern solches notwendig ist, ist der Mensch auch geschichtlich wirklich. Deshalb verstehen wir das Sein, und zwar nicht nur, wie es zunächst scheinen möchte, in der Weise der verschwebenden Wortbedeutung. Jene Bestimmtheit, in der wir die unbestimmte Bedeutung verstehen, läßt sich vielmehr eindeutig umgrenzen, und zwar nicht nachträglich, sondern als eine solche, die uns unwissentlich von Grund aus beherrscht. Um das zu zeigen, gehen wir wieder vom Wort »Sein« aus. Hier ist aber daran zu erinnern, daß wir das Wort gemäß der zu Beginn gestellten metaphysischen Leitfrage so weit gebrauchen, daß es seine Grenze nur am Nichts findet. Jegliches, was nicht schlechthin nichts ist, ist, und sogar das Nichts »gehört«uns zum»Sein«. [GA40 :89-90]