Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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o nada

quarta-feira 13 de dezembro de 2023

Nichts  

Onde procuramos O NADA? Onde encontramos O NADA? Para que algo encontremos não precisamos, por acaso, já saber que existe? Realmente! Primeiramente e o mais das vezes o homem somente então é capaz de buscar se antecipou a presença do que busca. Agora, porém, aquilo que se busca é O NADA. Existe afinal um buscar sem aquela antecipação, um buscar ao qual pertence um puro encontrar?

Seja como for, nós conhecemos O NADA, mesmo que seja apenas aquilo sobre o que cotidianamente falamos inadvertidamente. Podemos até, sem hesitar, ordenar numa "definição" este nada vulgar, em toda palidez do óbvio, que tão discretamente ronda em nossa conversa:

O nada é a plena negação da totalidade do ente. Não nos dará, por acaso, esta característica dO NADA uma indicação da direção na qual unicamente teremos possibilidade de encontrá-lo?

A totalidade do ente deve ser previamente dada para que possa ser submetida enquanto tal simplesmente à negação, na qual, então, o própriO NADA se deverá manifestar.

Mesmo, porém, que prescindamos da problematicidade da relação entre a negação e O NADA, como deveremos nós - enquanto seres finitos - tornar acessível para nós, em si e particularmente, a totalidade do ente em sua omnitude? Podemos, em todo caso, pensar a totalidade do ente imaginando-a, e então negar, em pensamento, o assim figurado e "pensá-lo" enquanto negado. Por esta via obteremos, certamente, o conceito formal   dO NADA figurado, mas jamais o própriO NADA. Porém, entre O NADA figurado e O NADA "autêntico" não pode imperar uma diferença, caso O NADA represente realmente a absoluta indistinção. Não é, entretanto, o própriO NADA "autêntico" aquele conceito oculto, mas absurdo, de um nada com características de ente? Mas paremos aqui com as perguntas. Que tenha sido este o momento derradeiro em que as objeções do entendimento retiveram nossa busca que somente pode ser legitimada por uma experiência fundamental dO NADA. [MHeidegger O QUE É METAFÍSICA?]


A resposta, primeiramente a única essencial para nosso propósito, já foi alcançada se tivermos a precaução de manter realmente formulada a questão dO NADA [Nichts]. Para isto se exige que reproduzamos a transformação [Verwandlung] do homem em seu ser-aí [Dasein  ] que toda angústia em nós realiza. Então captamos [festzunehmen] O NADA que nela se manifesta, assim como se revela. Com isto se impõe, ao mesmo tempo, a exigência de mantermos expressamente longe a determinação dO NADA que não se desenvolveu na abordagem do mesmo.

O nada se revela na angústia - mas não enquanto ente. Tampouco nos é dado como objeto. A angústia não é uma apreensão dO NADA. Entretanto, O NADA se torna manifesto por ela e nela, ainda que não da maneira como se O NADA se mostrasse separado, "ao lado" do ente, em sua totalidade [Ganze  ], o qual caiu na estranheza. Muito antes, e isto já o dissemos: na angústia deparamos com O NADA juntamente com o ente em sua totalidade. Que significa este "juntamente com"?

Na angústia o ente em sua totalidade [Ganze] se torna caduco [hinfällig]. Em que sentido acontece isto? Pois, certamente, o ente não é destruído pela angústia para assim deixar como sobra O NADA. Como é que ela poderia fazê-lo quando justamente a angústia se encontra na absoluta impotência em face do ente em sua totalidade? Bem antes, revela-se propriamente O NADA com o e no ente como algo que foge em sua totalidade.

Na angústia [Angst  ] não acontece nenhuma destruição de todo o ente em si mesmo, mas tampouco realizamos nós uma negação do ente em sua totalidade para, somente então, atingirmos O NADA. Mesmo não considerando o fato de que é alheio à angústia enquanto tal, a formulação expressa de uma enunciação negativa, chegaríamos, mesmo com uma tal negação, que deveria ter por resultado O NADA, sempre tarde. Já antes disto O NADA nos visita. Dizíamos que nos visitava juntamente com a fuga do ente em sua totalidade. [MHeidegger O QUE É METAFÍSICA?]


Com isto obtivemos a resposta à questão dO NADA. O nada não é nem um objeto nem um ente. O nada não acontece nem para si mesmo nem ao lado do ente ao qual, por assim dizer, aderiria. O nada é a possibilidade da revelação [Offenbarkeit  ] do ente enquanto tal para o ser-aí humano. O nada não é um conceito oposto ao ente, mas pertence originariamente à essência mesma (do ser). No ser do ente acontece o nadificar dO NADA [Nichten des Nichts]. [MHeidegger O QUE É METAFÍSICA?]
Mas agora devemos dar finalmente a palavra a uma objeção já por tempo demasiado reprimida. Se o ser-aí [Dasein] somente pode entrar em relação com o ente [Seiende  ] enquanto está suspenso nO NADA [Nichts], se, portanto, somente assim pode existir e se O NADA somente se revela originalmente na angústia [Angst], não devemos nós então pairar constantemente nesta angústia para, afinal, podermos existir? Não reconhecemos nós mesmos que esta angústia originária é rara? Mas, antes disso, está fora de dúvida que todos nós existimos e nos relacionamos com o ente - tanto aquele ente que somos como aquele que não somos - sem esta angústia. Não é ela uma invenção arbitrária e O NADA a ela atribuído um exagero?

Entretanto, o que quer dizer: esta angústia originária somente acontece em raros momentos? Não outra coisa que: O NADA nos é primeiramente e o mais das vezes dissimulado em sua originariedade. E por quê? Pelo fato de nos perdemos, de determinada maneira, absolutamente junto ao ente. Quanto mais nos voltamos para o ente em nossas ocupações, tanto menos nós o deixamos enquanto tal, e tanto mais nos afastamos dO NADA. E tanto mais seguramente nos jogamos na pública superfície do ser-aí.

E, contudo, é este constante, ainda que ambíguo desvio dO NADA, em certos limites, seu mais próprio sentido. Ele, O NADA em seu nadificar, nos remete justamente ao ente. O nada nadificado ininterruptamente sem que nós propriamente saibamos algo desta nadificação [Nichtung] pelo conhecimento no qual nos movemos cotidianamente. [MHeidegger O QUE É METAFÍSICA?]


Sobre O NADA a metafísica se expressa desde a Antiguidade numa enunciação, sem dúvida, multívoca: ex nihilo nihil   fit, dO NADA nada vem. Ainda que, na discussão do enunciado, O NADA, em si mesmo, nunca se torne problema, expressa ele, contudo, a partir do respectivo ponto de vista sobre O NADA, a concepção fundamental do ente que aqui é condutora. A metafísica antiga concebe O NADA no sentido do não-ente, quer dizer, da matéria informe, que a si mesma não pode dar forma de um ente com caráter de figura, que, desta maneira, oferece um aspecto (eidos  ). Ente é a figura que se forma a si mesma, que enquanto tal se apresenta como imagem. Origem, justificação e limites desta concepção de ser são tão pouco discutidos como o é o própriO NADA. A dogmática cristã, pelo contrário, nega a verdade do enunciado: ex nihilo nihil fit e dá, com isto, uma significação modificada aO NADA, que então passa a significar a absoluta ausência de ente fora de Deus: ex nihilo fit - ens creatum  . O nada torna-se agora o conceito oposto ao ente verdadeiro, ao summum ens, a Deus enquanto ens increatum. Também a explicação dO NADA indica a concepção fundamental do ente. A discussão metafísica do ente mantém-se, porém, ao mesmo nível que a questão dO NADA. As questões do ser e dO NADA enquanto tais não têm lugar. É por isso que nem mesmo preocupa a dificuldade de que, se Deus cria dO NADA, justamente precisa poder entrar em relação com O NADA. Se, porém, Deus é Deus, não pode ele conhecer O NADA, se é certo que o "absoluto" exclui de si tudo o que tem caráter de nada.

A superficial recordação histórica mostra O NADA como conceito oposto ao ente verdadeiro, quer dizer, como sua negação. Se, porém, O NADA de algum modo se torna problema, então esta contraposição não experimenta apenas uma determinação mais clara, mas então primeiramente se suscita a verdadeira questão metafísica a respeito do ser do ente. O nada não permanece o indeterminado oposto do ente, mas se desvela como pertencente ao ser do ente. [MHeidegger O QUE É METAFÍSICA?]


O tratado “Sobre a essência do Fundamento” surgiu no ano de 1928, simultaneamente com a preleção “O que é metafísica?” A preleção reflete sobre O NADA, o tratado nomeia a diferença ontológica.

O nada é o não do ente e, deste modo, o ser experimentado a partir do ente. A diferença ontológica é o não entre ente e ser. Assim como ser, porém, enquanto o não com relação ao ente, não é um nada no sentido do nihil negativum, tampouco é a diferença, enquanto o não entre ente e ser, somente o produto de uma distinção do entendimento (ens rationis).

Aquele não nadificante dO NADA e este não nadificante da diferença não são, certamente, da mesma espécie, mas o mesmo no sentido daquilo que, no acontecer fenomenológico do ser do ente, se compertence. Esse mesmo é o digno de ser pensado, que ambos os escritos, propositalmente mantidos separados, procuram aproximar de uma meditação, sem lhe estarem à altura. [GA9  :123; tr. Ernildo Stein  ]


Mas o que se passaria quando a própria recusa [Verweigerung  ] se tivesse de tornar a mais elevada e dura revelação do ser? Concebida a partir da metafísica (isto é, a partir da questão do ser, na figura: o que é o ente?), a essência encoberta do ser, a recusa, desvela-se, à partida, como o pura e simplesmente não-ente, como O NADA [Nichts]. Mas O NADA é, enquanto carácter de nada [Nichthafte] do ente, o mais agudo adversário daquilo que é meramente nulo. O nada nunca é nada, muito menos é algo no sentido de um objecto; é o ser mesmo a cuja verdade o homem é entregue quando se superou como sujeito, isto é, quando já não representa o ente como objecto. [GA5  :112-113; tr. Borges-Duarte  ]