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Pensar e Errar

Ernildo Stein (2015:106-108) – verstehen

Capítulo 2 – A errância - o erro

quinta-feira 8 de junho de 2023, por Cardoso de Castro

Temos, portanto, um verbo: Verstehen  , que pode ser traduzido tanto por entender como por compreender.

Poderíamos nos referir a dois tipos de guarda-chuva: o primeiro seria a ontologia fundamental, proposto por Heidegger, que estaria ligado intensamente à compreensão do ser. A unidade seria dada, assim, a partir da analítica existencial, a partir da análise do ser humano. Já o segundo elemento abrangente consistiria na proposta de partir de uma antropologia, da qual viria a unidade. Todos os campos da Filosofia seriam pensados a partir da antropologia filosófica.

Teríamos duas propostas ligadas à condição humana. Mesmo que não referida explicitamente, em ambas estaria escondida a metafísica. Na antropologia teríamos oculta a metafísica ingênua, sem a ação da diferença ontológica, que confunde o ser com o ente. Já a ontologia fundamental trabalha com a metafísica desconstruída, livre da entificação e do objetivismo. Cremos que é possível deixar o problema mais claro partindo da tradução do verbo Verstehen  . Teríamos, então, motivos para falar das suas orientações. A primeira dirigir-se-ia para a “metafísica dos enunciados”; a segunda conduzir-se-ia para a “metafísica da compreensão”. Nossa tarefa seria encontrar uma possível ligação entre ambas e mostrar a diferença dos dois modos de buscar a “unidade”. Temos, portanto, um verbo: Verstehen, que pode ser traduzido tanto por entender como por compreender.

Com a primeira tradução tomaríamos o termo Verstehen como entender palavras, frases, comportamentos. Efetivamente, se tivermos isso, teríamos como fundamento o ser humano como um ser que tem o logos  , aquele que tem a capacidade da palavra. E aquele que a tem é capaz de se entender e entender os outros (as razões dos outros) por meio da palavra. Assim, um enunciado é possível por intermédio do entender. O ser humano pode entender o que é verdadeiro e falso e decidir o que é bom e mau. Então, a partir do verbo entender, poderíamos desenvolver um conjunto de elementos ou conceitos fundamentais que constituem uma espécie de antropologia. O ser humano é um animal que se comunica com outros pelo entender; ele se comunica, entende os outros, portanto o entender seria uma espécie de essência do modo de ser do ser humano. O que diríamos ao final? Onde nós encontramos seres humanos? Ali onde nós ouvimos frases que fazem sentido.

[107] O ser humano, portanto, é todo aquele ser capaz de construir e entender enunciados assertóricos predicativos. Esse é o ser humano. A partir daí poderíamos desenvolver longamente a questão da lógica, da ética, da Filosofia da linguagem, das teorias da verdade. Temos, portanto, um guarda-chuva indo em direção a um tipo de ser humano enquanto ele tem essa qualidade fundamental, que é a qualidade de poder entender e se comunicar com os outros, entender a si mesmo e o seu mundo e entender a si mesmo como a fonte de todos os campos.

Tugendhat escreveu um livro sobre isso — Antropologia em lugar de metafísica — em que ele propõe a antropologia como o guarda-chuva. Em todo caso, não podemos recusar essa direção acerca do entender palavras, comportamentos, entender enunciados sobre coisas, sobre o mundo, entender enunciados sobre como agir, sobre ética. Podemos aceitar isso. A pergunta é: essa antropologia filosófica do entender tem suficiente radicalidade, isto é, abrange efetivamente todo modo de ser do ser humano?

Se, entretanto, traduzirmos a palavra Verstehen por compreender, vamos ter, em primeiro lugar, uma questão essencial: compreender o quê? Eu compreendo a cadeira, compreendo os objetos? Esse uso não funciona mais. Compreender abre um espaço diferente daquele do entender. Ele sempre está operando quando entendemos. O compreender tem uma função antecipadora, quer dizer, ele sempre é pressuposto onde se entende. Então, poderíamos pensar isso da seguinte maneira: há uma dupla estrutura que está implícita na relação entre significado e objeto. Esta estrutura se dá no conceito de mundo, no compreender e no nível do dizer que aponta para o horizonte de sentido. É uma estrutura que se expressa por meio do enquanto (ais). Quando dizemos “eu compreendo o que é o celular”, compreendemos aquele objeto enquanto celular, pois já faz parte do mundo de objetos, em que há uma dimensão de uso que posso fazer do objeto. Há uma dupla dimensão: os entes simplesmente existentes e os entes disponíveis, os quais podem ser usados como instrumentos, artefatos. Diz-se também: eu compreendo aquele problema, aquela pessoa, mas enquanto tal, porém, o que significa enquanto? Se não acharmos nada para colocar no lugar do enquanto, não vamos adiante. Dizemos algo e entendemos algo enquanto [108] tal, contudo não podemos, ao mesmo tempo, dizer que compreendemos e entendemos algo do mesmo modo. Temos de dizer que um modo está implicado no outro modo.

Então, entra em cena a questão do compreender e do ser. Compreendemos o ser apenas ligado ao ente, assim como compreendemos o ente apenas ligado ao ser. Com isso, entramos em um campo em que também compreendemos nosso modo de ser porque somos ente e como tal nos compreendemos enquanto somos. Assim, temos uma dupla estrutura que vai manifestar-se nos enunciados, nos quais ou ela ocorre de uma maneira afirmativa ou negativa ou ela se dá na medida em que o afirmativo e o negativo manifestam-se em um nível prévio, que, no entanto, está implicado quando analisamos o enunciado. Podemos fazer a análise de enunciados, podemos nos comunicar com enunciados, mas nisso está insinuado algo estranho. Surge uma aporia que não se resolve num movimento puramente linear (poderíamos falar em uma semântica linear).


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