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Barbuy: A Nação e o Romantismo

“Revista Brasileira de Filosofia”, vol. XII, fasc. 1, 1962.

sexta-feira 8 de outubro de 2021

BARBUY  , Heraldo. O Problema do ser e outros ensaios. São Paulo: Convívio, 1984, p. 259-291

1. A exposição que se vai seguir foi reconstituída de notas de aulas ministradas na Faculdade de Filosofia “Sedes Sapientiae”, da Universidade Católica de São Paulo, bem como de uma conferência pronunciada no Centro de Estudos Sociais e Políticos. Nesta última, procurei demonstrar, em síntese, que existem três espécies de nacionalismo: o Romântico, o Burguês e o Dialético ou comunista. Não podendo estender demasiadamente este ensaio, limito-me a expor aqui os principais aspectos do nacionalismo romântico [1]. Procurei situar-me na perspectiva romântica afim de melhor compreender a sua visão da realidade nacional. O nacionalismo romântico tem elementos que estão intimamente ligados a todo e qualquer sentimento de Nação, de pátria e de localidade; poderia objetivar-se em formas sociais diversas, manifestando-se segundo as peculiaridades de cada Nação e sendo sempre mais amplo que todas as suas objetivações possíveis. — Todavia, esta forma de nacionalismo foi atualmente obliterada pelas manifestações intelectuais e cosmopolitas do nacionalismo burguês e comunista. A presente exposição tem o caráter duma reconstituição especulativa. Tanto mais que o nacionalismo romântico constitui um tipo de pensamento que não deve ser aplicado a regimes políticos ou econômicos necessariamente determinados; na sua ampla visão poética do mundo, nunca se objetivou em nenhuma forma de Estado.

Para expor a história do nacionalismo romântico, expomos o nacionalismo alemão, porque foi no âmbito da cultura alemã que esse nacionalismo atingiu a sua expressão mais compacta e mais homogênea. Isto se dá porque o romantismo [259] e o historicismo, nos seus resultados, são processos culturais especificamente alemães. O nacionalismo alemão se tornou a chave do nacionalismo romântico, assim como o pensamento alemão se tornou a chave da filosofia contemporânea. A poesia, a filosofia, a música, a sociologia, a economia do romantismo se manifestaram particularmente na Alemanha, de tal sorte que o exame histórico do nacionalismo romântico é ao mesmo tempo o exame histórico do nacionalismo alemão. Desde Hamann, verdadeiro fundador do romantismo, até Martin Heidegger, nos seus comentários a Hölderlin  , os românticos explicitaram o nacionalismo, não só nas suas peculiaridades alemãs, mas também nos seus conteúdos universais. Não podia deixar de ser assim, numa cultura que formulou as premissas, os temas e os desenvolvimentos de toda a filosofia contemporânea, e fora da qual a filosofia só tem existido, na época atual, como repercussão e analogia  .

Devemos dizer que o romantismo não se confunde com o lirismo e o sentimentalismo. É a reconstituição orgânica duma visão mágico-metafísica do homem e da natureza. Foi em função de toda a sua Weltanschauung   que o romantismo promoveu novas artes e novas formas de arte; novas ciências e novas visões da ciência; a filosofia dos valores e o sentido do Valor; as novas perspectivas da história e a revitalização dos Mythos   originários; a música, a poesia, e as demais exteriorizações culturais que lhe são típicas. Essencialmente estético, definiu também a Nação, pela primeira vez, como categoria estética. Na linha estética, explicitou a filosofia e a consciência emotiva de Nação.


[1Trata-se evidentemente duma exposição incompleta.