Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Kockelmans (1984:98-99) – desvelamento e velamento

segunda-feira 14 de outubro de 2024

Vimos que o Ser é a abertura dos entes. Um ente chega ao seu próprio Ser quando é tomado da maneira apropriada como aquilo que ele genuinamente é; isso ocorre quando deixamos que se mostre na clareira do Ser. Se tomarmos um ente como um ente, então nele surge uma fissura, de modo que ele se distingue de si mesmo, de seu próprio Ser. A fissura, por sua vez, abre a diferença entre Ser e entes; produz [99] o “entre” por meio do qual os entes chegam à abertura do Ser. O pensamento, que toma os entes como entes, é, portanto, empregado em nome da abertura, na medida em que o “entre” torna possível que o Ser seja o Ser dos entes. Esse “entre” é aquilo que no próprio Ser reina como seu “fundamento” e sua “verdade”. Como “entre” e “verdade” se tornam precisamente presentes? Tornam-se presentes como o pertencimento de desvelamento e velamento, ou seja, como o acontecimento do desvelamento; e é nesse acontecimento que o Ser se desvela como mundo.

Heidegger tenta pensar o desvelamento de várias maneiras. É o livre (das Freie) do processo de clareação, que, no entanto, permanece no autovelamento. [1] É também a proximidade que aproxima, ao mesmo tempo em que preserva o afastamento. [2] É chamada de dimensão de todas as dimensões, o “entre” que se abre para cada mensuração. [3] É a região que, como extensão aberta (die Gegnet), permite que os entes sejam encontrados em sua abertura. [4] Como região e extensão aberta, o desvelamento é também o movimento originário, que pela primeira vez abre todas as formas de pensar e falar; é o caminho, Tao. [5] Esse movimento ao longo do caminho origina-se do repouso, que aqui deve ser pensado não como uma imobilidade rígida, mas sim como um repouso em si mesmo que reúne todo o movimento em si mesmo e o deixa fluir de si mesmo. [6] Como a quietude, o repouso acalma aquilo que está na intimidade de seu próprio repouso em si mesmo. [7]

De todos os nomes que Heidegger usa para o desvelamento, o nome “mundo” ocupa um lugar privilegiado. Essa palavra nomeia a estrutura de construção na qual o desvelamento se estabelece. Assim, o que domina o mundo é desvelamento e velamento do desvelamento; é acontecimento e evento. Quando dizemos que o desvelamento “é”, obviamente falamos de forma bastante livre. Pois o próprio Ser e sua própria essência, ou seja, o desvelamento e o mundo, obviamente “são”, não da maneira como um ente e uma coisa são; pois o Ser, o desvelamento e o mundo não são entes entre outros entes. Permanecem e dominam. Permanecer e manter o controle devem ser tomados aqui como aquele acontecimento que, como evento de apropriação, se vela em sua vinda à presença. Pois o Ser, o não desvelamento e o mundo se velam para que os entes possam ser. Tendo em vista o fato de que o velamento pertence permanentemente ao desvelamento, esse evento não pode ser entendido em um sentido teleológico, de modo que o velamento, em última instância, possa ser superado em um desvelamento completo. Tal acontecimento, no qual desvelamento e velamento permanecem inextricavelmente entrelaçadas, é chamado de envio (Geschick).

[KOCKELMANS  , Joseph. On the Truth of Being: Reflections on Heidegger’s Later Philosophy. Bloomington: Indiana University Press, 1984]


Ver online : Joseph Kockelmans


[1GA7:VA, p. 276

[2GA12:US, p. 211

[3GA7:VA, pp. 195-96

[4Gelassenheit, pp. 40-43

[5GA12:US, pp. 197-98

[6GA12:US, pp. 213-14

[7GA12:US, pp. 29 (206-207), 141-46 (43-48), 213-16 (106-108).