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Compreensão e Finitude [CF]

Ernildo Stein (2001:163-165) – fenômeno (phainomenon)

Capítulo 2

segunda-feira 13 de novembro de 2023, por Cardoso de Castro

“Nós atribuímos, diz Heidegger, à palavra ‘fenômeno’ o sentido positivo e original de phainomenon e distinguimos o fenômeno da aparência, que é uma modificação privativa do ‘fenômeno.’”

Heidegger analisa primeiro o conceito de fenômeno.

“A palavra grega phainomenon, à qual remete o termo ‘fenômeno’, deriva do verbo phainesthai, que significa: aquilo que se mostra, o manifesto. Phainesthai é o infinito médio de phaino: trazer ao dia, colocar na luz; Phaino pertence à raiz pha- como phos, a luz, a claridade, isto é, aquilo em que algo pode tornar-se manifesto, visível em si mesmo. Devemos reter como significação da palavra fenômeno’: aquilo que se mostra em si mesmo, o manifesto. Os phainomena, fenômenos’, são, portanto, o conjunto daquilo que está ou pode ser trazido à luz e que os gregos, por vezes, identificavam simplesmente com ta onta (os entes, o ente). O ente portanto pode mostrar-se, a partir de si mesmo, de diversas maneiras, conforme o modo de acesso a ele”.

Mas, o ente pode parecer aquilo que realmente não é. Assim, ele se mostra como aquilo que ele não é. Tal maneira de se mostrar se chama o “parecer”. Desse modo o segundo sentido grego de phainomenon aponta para o que parece, o “aparente”, a “aparência”. As duas significações de phainomenon (”fenômeno” como aquilo que se mostra e “fenômeno” como aparência) estão unidas pela própria [164] estrutura do conceito, mas a primeira fundamenta a segunda significação. “Nós atribuímos, diz Heidegger, à palavra ‘fenômeno’ o sentido positivo e original de phainomenon e distinguimos o fenômeno da aparência, que é uma modificação privativa do ‘fenômeno.’”

Depois dessa distinção inicial, Heidegger procura distinguir, do fenômeno enquanto aquilo que se mostra e do fenômeno enquanto aparência, o fenômeno-índice ou o puro fenômeno. O fenômeno-índice pode ter quatro sentidos. Primeiro ele é o anúncio daquilo que não se manifesta. Todos os sintomas, símbolos, indicações e apresentações possuem a estrutura fundamental formal do fenômeno-índice nesse primeiro sentido. Em segundo lugar é o anúncio enquanto ele próprio é um fenômeno — aquilo que, na sua manifestação, indica o que não se manifesta. Em terceiro lugar fenômeno-índice pode ser usado para designar o sentido autêntico do fenômeno, entendido como manifestação de si. Em quarto lugar fenômeno-índice pode ter o sentido de puro fenômeno. Isto acontece quando o anúncio fenomenal, que, na manifestação de si, indica o não-manifesto, é alguma coisa que surge ou emana do não-manifesto, de tal maneira que o não-manifesto é pensado enquanto aquilo que é essencialmente incapaz de manifestar-se. Assim, o fenômeno-índice torna-se sinônimo de produção ou coisa produzida, sem que estas constituam o verdadeiro ser do que produz. “Essa não-manifestação dissimuladora não é, contudo, uma simples aparência”. Por fim, o fenômeno-índice pode transformar-se em pura aparência. Isso acontece quando este, enquanto anúncio fenomenal, implica, a sua constituição, um fenômeno que pode transformar-se privativamente numa aparência.

Partindo do conceito de fenômeno como aquilo que se manifesta a partir de si mesmo, Heidegger procura distinguir claramente as palavras fenômeno, aparência, fenômeno-índice e puro fenômeno. Assim, o fenômeno, enquanto modo privilegiado de encontrar-se com algo, é mantido livre de ser confundido com formas derivadas que nele se fundam.

[165] Mas, o que Heidegger visa é a determinação do conceito fenomenológico de fenômeno. Se, no conceito de fenômeno enquanto aquilo que se mostra em si mesmo, fica indeterminado qual o ente que é tido como fenômeno e se não se decide se o que se mostra é um ente ou o caráter ontológico de um ente, então temos conquistado o sentido puramente formal de conceito de fenômeno. Esse conceito formal pode ser aplicado e, então, surge o conceito vulgar e o conceito fenomenológico de fenômeno. Heidegger traz dois exemplos elaborados no horizonte da problemática kantiana. “Quando se entende por aquilo que se manifesta o ente que, conforme Kant  , é acessível à intuição empírica, faz-se uma aplicação correta da noção formal de fenômeno. Segundo esse uso, a ideia de fenômeno corresponde à noção vulgar dessa palavra’’.

“No horizonte da problemática kantiana se poderia caracterizar o que se entende fenomenologicamente por fenômeno (reservas feitas de outras distinções), dizendo: o que, no fenômeno, em sentido vulgar, se manifesta sempre de modo prévio e implícito, ainda que não tematicamente, pode ser levado a manifestar-se tematicamente, e o que, assim, se manifesta em si mesmo (“as formas da intuições”) é fenômeno da fenomenologia.””

Para a compreensão geral do conceito fenomenológico de fenômeno é necessário, segundo Heidegger, a penetração do sentido formal do conceito de fenômeno e sua aplicação correta em sentido vulgar.


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