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Carneiro Leão (1977:18-19) – desejo de saber
segunda-feira 18 de novembro de 2024
Animal racional, o homem arde por necessidade de sua natureza, no desejo de saber. Numa sede insaciável de sempre mais conhecimentos. Para o homem finito não há saber que seja completo, definitivo, satis-fatório. Que lhe apague a atração do desconhecido, que se contente consigo mesmo. Há homens que se contentam e que, logo satisfeitos, se instalam tranquilamente numa distância respeitosa frente ao desconhecido. São as naturezas que herdaram pouco do fogo de Prometeu. Mas, em si mesmo, o saber humano como tal, justamente por ser finito, é sempre trabalhado por uma insatisfação sem fim: “no vigor de sua constituição ontológica todos os homens desejam ardentemente saber”, é a frase com que Aristóteles abre o Primeiro Livro da Metafísica. A ligação profunda entre saber e desejo, o nexo íntimo de razão e paixão não consiste numa mistura de faculdades inferiores e superiores da alma. Já em si mesmo o desejo de saber é o mais selvagem dos desejos e a razão, a mais violenta das paixões, muito embora a psicologia vulgar, concebendo a personalidade numa espécie de topografia de regiões altas e baixas, oponha a razão à paixão e cante os louvores do saber desapaixonado. Na verdade, porém, o saber humano é sempre carregado dinamicamente. Mas sua dinâmica não se reduz ao processo psíquico, [18] à sucessão de atos e representações do pensamento. É a própria estrutura do saber em si mesma que nunca é estacionária mas fundamentalmente revolucionária. É evidente que não se deve confundir a grandeza positiva da revolução do saber com uma outra grandeza. A grandeza negativa de outros usos da palavra revolução.
[CARNEIRO LEÃO, Emmanuel, Aprendendo a pensar. Volume I. Petrópolis: Vozes, 1977]
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