Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Brague (1988:156-158) – phronesis

quinta-feira 31 de outubro de 2024

Assim, podemos retornar ao texto da Ética a Nicômaco mais bem equipados para perceber seu pano de fundo. Com isso, quero dizer tudo o que, na prudência (phronesis), penetra em seu fundamento, que é a preocupação (phrontis; Sorge). Preocupação, lembremos, é acima de tudo o sentimento de que as coisas me dizem respeito, e de tal forma que elas só podem me dizer respeito, um “eu” incapaz de escapar de si mesmo. Como a phronesis se baseia nesse elemento? Para responder a essa pergunta, vamos começar com uma observação de Heidegger. H. G. Gadamer   relata que, durante uma sessão de seminário sobre a Ética a Nicômaco, tendo chegado precisamente à passagem sobre a impossibilidade de esquecer a phronesis, o filósofo teria interrompido as hesitações de seus alunos ao exclamar abruptamente: “Mas é a consciência (Gewissen)!” Gadamer   é rápido em apontar que isso não foi mais do que um exagero pedagógico, livre de precauções filológicas ou históricas — para ser franco, um anacronismo flagrante. Parece difícil não concordar, tanto mais que é precisamente a noção de consciência que, longe de ser seu equivalente, tenderá, ao contrário, na história da filosofia moral, a colocar a prudência em segundo plano, a ponto de torná-la quase incompreensível. Tentar redescobri-la aqui não significaria reintroduzir a raposa no galinheiro? Não estou alheio a essas dificuldades. No entanto, acho que a observação de Heidegger pode nos colocar na trilha de um fato de grande importância, desde que aceitemos olhar para o fenômeno novamente. A passagem da Ética a Nicômaco observa que a phronesis não pode escapar de nós, porque ela não é simplesmente acompanhada pelo logos, mas pelo próprio logos correto. Com isso, Aristóteles   anuncia a doutrina final da phronesis que ele dará no final do livro (VI, 13, 1144 b 27 f.), indo além, sem dizer isso, da caracterização que ele deu no corpo do livro (5, 1140b 5.20). A phronesis está a tal ponto “com o logos” que este último se torna um com ela. O logos da phronesis é inesquecível. A phronesis é a virtude na qual o logos se apresenta em uma forma que o torna inesquecível. Então, o que deve ser esse logos para que ele esteja além do alcance do lethe?

[BRAGUE  , Rémi. Aristote   et la question du monde. Essai sur le contexte cosmologique et anthropologique de l’ontologie. Paris: PUF, 1988]


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