Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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vontade de poder

quarta-feira 13 de dezembro de 2023

Existe já um certo hábito sedimentado nos trabalhos sobre Nietzsche   no Brasil de traduzir a expressão nietzschiana Wille   zur Macht   por "vontade de potência", seguindo o modo como os franceses normalmente traduzem essa expressão. No entanto, essa tradução não me parece adequada por algumas razões. Em primeiro lugar, o termo utilizado por Nietzsche simplesmente não é o termo potência. Em alemão há pelo menos duas palavras que podem ser usadas para designar potência: Potenz   e Leistung. Todavia, a palavra utilizada por Nietzsche é Macht, que significa literalmente poder. Busca-se normalmente justificar essa alternativa de tradução pela necessidade de escapar dos sentidos indesejáveis da noção de poder, sentidos que nada têm a ver com o conceito nietzschiano propriamente dito. No entanto, se esse fosse efetivamente o intuito de Nietzsche, o próprio filósofo deveria ter tentado evitar esse efeito também no original, porque o mesmo problema se apresenta em alemão. Em segundo lugar, a argumentação propriamente filosófica também não me parece muito convincente. Muitas vezes, apela-se para a proximidade entre o conceito de poder em Nietzsche e a noção de potência (dynamis  ) em Aristóteles. Vontade de poder teria, assim, algo em comum com possibilidade, e não com a instauração fática de relações de poder. Se nos aproximarmos mais cuidadosamente dos textos de Nietzsche, contudo, veremos que o que está em questão para ele não é nunca uma estrutura de possibilidade, mas justamente o poder que certas perspectivas exercem sobre outras perspectivas no interior das configurações vitais em geral. E é nesse ponto que encontramos então um derradeiro argumento. Nietzsche substitui, em muitos aforismos publicados e fragmentos póstumos, poder (Macht) por domínio ou dominação (Herrsckaft ou Beherrschung), o que significa o seguinte: quem opta por traduzir Macht por potência se vê diante de um problema em meio àquelas passagens que inequivocamente envolvem dimensões de domínio, ou seja, se vê forçado a uma incoerência com sua própria opção. Por tudo isso, traduzo aqui contra uma certa corrente Wille zur Macht por "VONTADE DE PODER". [Casanova  ]


A essência da VONTADE DE PODER apenas se deixa conceber a partir da vontade de querer. Esta, no entanto, apenas se deixa experienciar se a metafísica já tiver passado para a ultrapassagem. [GA7  ]
A especial oportunidade na qual é discutida a questão da essência da metafísica não deve induzir à opinião   de que tal questionar esteja condenado a tomar seu ponto de partida das ciências. A investigação moderna está engajada, com outros modos de representação e com outras espécies de produção do ente, no elemento característico daquela verdade conforme a qual todo ente se caracteriza pela vontade de vontade. Como forma antecipadora, começou a aparecer a "VONTADE DE PODER". "Vontade", compreendida como traço básico da entidade do ente, é, tão radicalmente, a identificação do ente com o que é atual, que a atualidade do atual é transformada em incondicional factibilidade da geral objetivação. A ciência moderna nem serve a um fim que lhe é primeiramente proposto, nem procura uma "verdade em si". Ela é, enquanto um modo de objetivação calculadora do ente, uma condição estabelecida pela própria vontade de vontade, através da qual esta garante o domínio de sua essência. Mas pelo fato de toda objetivação do ente se exaurir na produção e garantia do ente, conquistando, desta maneira, as possibilidades de seu progresso, permanece a objetivação apenas junto ao ente e já o julga o ser. Todo comportamento que se relaciona com o ente testemunha, desta maneira, já um certo saber do ser, mas atesta simultaneamente a incapacidade de, por suas próprias forças, permanecer na lei da verdade deste saber. Esta verdade é a verdade sobre o ente. A metafísica é a história desta verdade. Ela diz o que o ente é, enquanto ela conceitua a entidade do ente. Na entidade do ente pensa a metafísica o ser, sem contudo, poder considerar, pela sua maneira de pensar, a verdade do ser. A metafísica se move, em toda parte, no âmbito da verdade do ser que lhe permanece o fundamento desconhecido e infundado. Suposto, porém, que não apenas o ente emerge do ser, mas que [67] também, e ainda mais originariamente, o próprio ser reside em sua verdade e que a verdade do ser se desdobra (west) como o ser da verdade, então, é necessária a pergunta pelo que seja a metafísica em seus fundamentos. Este interrogar deve pensar metafísicamente e, ao mesmo tempo, deve pensar a partir dos fundamentos da metafísica, vale dizer, não mais metafísicamente. Num sentido essencial, um tal questionar permanece ambivalente. 188 MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?