Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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acontecimento da apropriação

quarta-feira 13 de dezembro de 2023

Ereignis  

A meditação do pensar inicial é muito mais tão originária que ela pergunta primeiramente como é que o si mesmo precisaria ser fundamentado, o si mesmo em cujo âmbito “nós”, eu e tu, chegamos sempre a cada vez a nós mesmos. Assim, é questionável se encontramos por meio da reflexão sobre “nós” a nós mesmos, se encontramos o nosso si mesmo, e se, por conseguinte, o projeto do ser-aí em geral tem algo em comum com a clarificação da “auto”-consciência. Pois bem, não está de modo algum definido que o “si mesmo” seria determinável algum dia pela via que passa pela representação do eu. Ao contrário, é preciso reconhecer que a ipseidade só emerge da fundação do ser-aí, mas que essa fundação se realiza como ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO do que pertence à conclamação. Com isto, emerge a abertura e a fundação do si mesmo a partir da e como a verdade do seer. Não a decomposição diversamente dirigida da essência do homem, não a indicação de outros modos de ser do homem – tudo considerado por si como antropologia aprimorada – é o que produz aqui a auto-meditação, mas é a questão acerca da verdade do ser que prepara o âmbito da ipseidade, na qual, atuando historicamente e agindo, o homem – nós –, assumindo a figura do povo, chega ao seu si mesmo. [tr. Casanova  ; GA65  : 30]

“Tempo” é em Ser e tempo   a indicação e a ressonância daquilo que acontece como verdade da essenciação do seer na unicidade do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. [tr. Casanova; GA65: 34]

A terra, que atravessa o caminho e, enquanto caminho, o re-pensar do seer, é o entre, que se apropria em meio ao acontecimento do ser-aí para o deus, em cujo ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO pela primeira vez o homem e o deus se tornam “cognoscíveis”, pertencentes à vigília e à urgência do seer. [tr. Casanova; GA65: 42]

Neste caso, aquilo que é aqui denominado de-cisão ganha o meio essencial mais íntimo do seer mesmo e passa a não ter mais nada em comum com aquilo que se chama a tomada de uma escolha e coisas do gênero, mas diz: a dissociação mesma, que cinde e, na cisão, deixa entrar em jogo pela primeira vez o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO justamente desse aberto no dissociado como a clareira para o que se encobre e ainda se mostra como in-decidido, o pertencimento do homem ao seer e a referencialidade do seer ao cerne do tempo do último deus. [tr. Casanova; GA65: 43]

Porque a essência do seer se essência no ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO da de-cisão. Todavia, de onde sabemos isso? Nós não o sabemos, mas o inquirimos e abrimos em tais questões para o seer os sítios e talvez um sítio exigido por ele, caso a essência do seer precise se mostrar como a recusa, para a qual o questionamento insuficiente permanece a única proximidade adequada. E, assim, só um criar que funda todo ser-aí com vistas a um longo prazo (e só esse criar, não o empreendimento cotidiano fixo da instituição do ente) precisa despertar a verdade do seer como questão e como indigência através da senda mais decisiva e em impulsos iniciais cheios de alternância, aparentemente desprovidos de conexão e desconhecidos para si, tornar pronto para a tranquilidade do seer; ao mesmo tempo, porém, também decididamente contra toda e qualquer tentativa de confundir e enfraquecer, no mero querer para trás, mesmo que esse querer esteja em relação com as tradições “mais valorosas”, a coação impiedosa na indigência da meditação. [tr. Casanova; GA65: 44]

Por mais certamente que a história do fim prossiga e, medida a partir dos dados presentes, por mais que ela se mostre mais “viva” e “mais rápida” e confusa do que nunca, a própria transição permanecerá o que há de mais questionável e antes de tudo o que há de mais desconhecido. O homem, em pequeno número e sem conhecer a si mesmo, se preparará em meio ao campo de jogo temporal   do ser-aí e se reunirá em uma proximidade com o seer, proximidade essa que precisa permanecer estranha para todos aqueles que se encontram “próximos da vida”. A história do seer conhece em longos espaços de tempo, que são para ela apenas instantes, acontecimentos apropriadores raros. Os acontecimentos apropriadores enquanto tais: o remetimento da verdade ao seer, a precipitação da verdade, a solidificação de sua inessência (da correção), o abandono do ser do ente, a entrada do seer em sua verdade, o atiçar do fogo da lareira (da verdade do seer) como o sítio solitário do passar ao largo do último deus, o reluzir da unicidade única do seer. Enquanto a destruição do mundo até aqui enquanto autodestruição alardeia em meio ao vazio o seu triunfo, a essência do seer se reúne em sua mais elevada vocação: enquanto ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO do âmbito de decisão sobre a divindade dos deuses, apropriar-se do fundamento e do campo de jogo temporal, isto é, do ser-aí, na unicidade de sua história. [tr. Casanova; GA65: 116]

O salto é um salto sapiente para o interior da instantaneidade dos sítios do acometimento, daquele primeiro elemento, que arranca por meio do salto o abrigo do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO na palavra que acena. [tr. Casanova; GA65: 120]

Na abertura da essenciação do seer torna-se manifesto que o ser-aí não realiza nada, a não ser iniciar o contraimpulso do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, isto é, a não ser inserir nesse contraimpulso e, assim, se tornar ele mesmo: o que guarda o projeto jogado, o fundador fundado do fundamento. [tr. Casanova; GA65: 122]

A situação de emergência essencial não deve se defender da emergência, a fim de afastá-la, mas precisa, em se defendendo, precisamente conservá-la e estendê-la para o interior da exportação resolutora de acordo com a ampliação do estremecimento. Assim, o seer é como a recusa atributiva o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO do ser-aí. Esse ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, porém, tem o ímpeto para o próprio como estremecimento da deização, que precisa do campo de jogo temporal para a sua própria decisão. [tr. Casanova; GA65: 123]

O homem pressente o seer, ele é aquele que pressente o seer, porque o seer apropria para si o homem em meio ao acontecimento, e isso de tal modo que o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO carece somente de um si-próprio, um si mesmo, cuja ipseidade o homem tem de sustentar na insistência, que deixa o homem, estando-em no ser-aí, tornar-se aquele ente, que é apenas e primeiramente encontrado na questão sobre o quem. [tr. Casanova; GA65: 128]

O elemento conflituoso precisa residir na essenciação do seer mesmo, e o fundamento é o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO como recusa, que é uma atribuição. Nesse caso, a negação e o não seriam até mesmo o salto mais originário no seer. [tr. Casanova; GA65: 129]

Não é possível calcular se terá sucesso esse revolvimento do homem até aqui, isto é, a fundação anterior da verdade mais originária no ente de uma nova história. Ao contrário, tudo depende da doação ou da subtração do próprio ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO; e isso mesmo se a essenciação do seer já tiver sido previamente pensada na meditação atual e se ela tiver se tornado consciente nos seus traços fundamentais. [tr. Casanova; GA65: 130]

O ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO da fundação do aí exige naturalmente uma ida ao encontro desse acontecimento por parte do homem, e isso significa com certeza algo essencial e talvez para o homem atual algo já impossível. Pois ele precisa para tanto sair do estado fundamental atual, que abarca em si nada menos do que a negação de toda história. [tr. Casanova; GA65: 130]

A medida excessiva do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO pertence a ele mesmo, não como propriedade, como se o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO pudesse ser sem a medida excessiva. [tr. Casanova; GA65: 131]

A medida excessiva também não é naturalmente o além de um supra-sensível, mas, enquanto ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, a coação do ente. [tr. Casanova; GA65: 131]

A contenda do seer contra o ente, contudo, é esse encobrir-se da retenção de um pertencimento originário. Assim, o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO tem nesse subtrair-se doador por toda parte a essência do encobrir-se, o que, para se essenciar, precisa da mais ampla clareira. [tr. Casanova; GA65: 131]

Em Ser e tempo, essa ligação é concebida pela primeira vez como “compreensão de ser”, sendo que compreender precisa ser concebido como projeto e a projeção como jogada, o que quer dizer pertencente ao ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO por parte do próprio seer. [tr. Casanova; GA65: 134]

A ligação do ser-aí com o seer pertence à essenciação do próprio seer, o que também pode ser dito assim: o seer precisa do ser-aí, não se essencia de maneira alguma sem esse ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. [tr. Casanova; GA65: 135]

O aí é o sítio acontecencial, apropriado em meio ao acontecimento e insistente do instante da virada para a clareira do ente no ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. A diferenciação não tem mais nada do que é visado e necessitado sem qualquer solo de maneira apenas lógico-categorial-transcendental  . A mera representação de ser e ente como o diferente se torna agora insípida e induz em erro, na medida em que ela re-tém na mera representação. O que é aberto nela de maneira pensante só pode ser pensado de forma modelar em geral em toda a junção fugidia do projeto do ser-aí. [tr. Casanova; GA65: 151]

A abertura do fosso abissal tem sua primeira e mais ampla mensuração na necessidade do deus em uma direção e no pertencimento (ao seer) do homem segundo a outra direção. Aqui se essenciam os precipícios do deus e a subida do homem como aquele que é fundado no ser-aí. A abertura do fosso abissal é o alijamento interior incalculável do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, da essenciação do seer como o meio utilizado que confere pertencimento, que permanece ligado ao passar ao largo do deus e, sobretudo, à história do homem. [tr. Casanova; GA65: 157]

O projeto do ser-aí só é possível como inserção extasiante no ser-aí. O projeto que insere de maneira extasiante, porém, emerge apenas da docilidade em relação à junção fugidia mais velada de nossa história em meio à tonalidade afetiva fundamental da retenção. O instante essencial, imensurável em sua amplitude e profundidade, irrompe, sobretudo quando a indigência do abandono do ser experimenta seu crepúsculo e a decisão é buscada. Com certeza: esse “fato” fundamental de nossa história não é apresentável por meio de nenhuma “decomposição analítica” da “situação” “espiritual” ou “política” do tempo, uma vez que tanto a perspectiva voltada para o “espiritual” quanto a perspectiva voltada para o “político” já se movimentam no primeiro plano e no que foi corrente até aqui, de tal modo que elas renunciam de antemão à possibilidade de experimentar a história propriamente dita – a luta do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO do homem pelo seer – e de questioná-la e pensá-la nas vias da disponibilização dessa história, isto é, elas renunciam à possibilidade de se tornar histórico a partir do fundamento da história. [tr. Casanova; GA65: 189]

O ser-aí, concebido como ser do homem, já se encontra na conceptualidade prévia. A questão relativa à sua verdade continua sendo como o homem, se tornando mais essente, se recoloca no ser-aí, fundando-o, assim, a fim de se expor, com isso, à verdade do seer. Mas esse colocar-se e sua constância se fundam no ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. Por isto, é preciso perguntar: Em que história o homem precisa se encontrar, para que ele se torne pertinente ao ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO? Ele não precisa ser empurrado de antemão para o interior do aí, cujo acontecimento se torna manifesto para ele como jogado? O caráter de jogado só é experimentado a partir da verdade do seer. Na primeira indicação prévia (Ser e tempo), ele ainda permanece passível de uma interpretação falsa no sentido de uma ocorrência casual do homem sob o outro ente. Em direção a que poder, terra e corpo são desdobrados a partir daqui. O ser do homem e a “vida”. Onde estaria o impulso para pensar em direção ao ser-aí senão na essência do próprio seer. [tr. Casanova; GA65: 194]

A ipseidade é o estremecimento conquistado a partir do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO que suporta tal acontecimento, o estremecimento da reciprocidade da contenda na abertura do fosso abissal. [tr. Casanova; GA65: 197]

O aí é o entre aberto, que encobre de maneira clareadora, em relação à terra e ao mundo, o meio de sua contenda, e, com isso, os sítios do mais íntimo pertencimento, e, assim, o fundamento do para-si, do si mesmo e da ipseidade. O si mesmo nunca é o “eu”. O junto a si do si mesmo se essencia como insistência da a-ssunção do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. Ipseidade é pertencimento à intimidade da contenda como recombate do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. [tr. Casanova; GA65: 198]

Os sítios instantâneos emergem da solidão da grande tranquilidade, na qual o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO se torna a verdade. [tr. Casanova; GA65: 200]

Os sítios instantâneos, unicidade e acometimento do mais claro arrebatamento extasiante no âmbito do aceno a partir do brando arrebatamento fascinante do que hesita e se renuncia, proximidade e distância na decisão, o onde e o quando da história do ser se clareando e se encobrindo a partir do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO da tonalidade afetiva fundamental da retenção. Essa retenção e a experiência fundamental do aí e, assim, do tempo-espaço. Então, a rearticulação da representação de tempo e espaço com as tonalidades afetivas parece não somente um erigir metafísico de formas vazias, mas ao mesmo tempo também uma nova “subjetivação”. [tr. Casanova; GA65: 239]

Precisa sempre haver, porém, a conservação do encobrir-se. Pois somente assim permanece a história fundada em sintonia com o caráter do ser-aí no ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO e, assim, de maneira pertinente ao seer. [tr. Casanova; GA65: 244]

O clamor é acometimento e permanência de fora no mistério do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. [tr. Casanova; GA65: 255]

Nós nos encontramos nessa luta em torno do último deus, isto é, em torno da fundação da verdade do seer como o tempo-espaço da tranquilidade de seu passar ao largo (não é pelo próprio deus que conseguimos lutar); e isso necessariamente no âmbito de poder do seer como o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO e, com isso, na amplitude extrema do mais intenso redemoinho da viragem. [tr. Casanova; GA65: 256]

O repensar da verdade do seer só tem sucesso se, no passar ao largo do deus, o apoderamento do homem para a sua necessidade se tornar manifesto e, assim, o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO no excesso da viragem ganhar o aberto entre o pertencimento humano e a necessidade divina, a fim de revelar seu encobrir-se como meio, a fim de se revelar como meio do encobrir-se, obrigando a reoscilação e, com isso, trazendo ao salto a liberdade para o fundamento do seer como fundação do aí. [tr. Casanova; GA65: 256]

O quão pouco sabemos do fato de que o deus espera pela fundação da verdade do seer e, com isso, pelo salto do homem no ser-aí. Ao invés disso, tudo se dá como se o homem é que precisasse e fosse esperar por deus. E talvez essa seja a forma mais fatídica da mais absoluta falta de deus e o atordoamento da impotência para o sofrimento do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO daquele aí enquanto estada temporária do seer, que oferece pela primeira vez ao encontrar-se do ente na verdade um sítio, atribuindo a ele o elemento justo de se achar na mais ampla distância em relação ao passar ao largo do deus, elemento justo, cuja atribuição só acontece como história; na recriação do ente em meio à essencialidade de sua determinação e em meio à libertação do abuso das maquinações, que, invertendo tudo, esgotam o ente no usufruto. [tr. Casanova; GA65: 256]

O seer mesmo anunciou a sua essência histórica. Mas permaneceu e permanece de qualquer modo uma dificuldade fundamental: o seer deve ser projetado em sua essência, e o próprio projeto é, porém, a “essência” do seer, o pro-jeto como ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. [tr. Casanova; GA65: 262]

Jogar-se para fora, ousar o aberto, não pertencer nem a algo em face de si nem a si e, contudo, pertencer aos dois ao mesmo tempo, mas não como objeto e sujeito; saber e pressentir-se como ré-plica no aberto que aquilo que se joga para fora e do que ele se evade possuem a mesma essência do que o em face de. A ré-plica é o fundamento do vir ao encontro, que aqui ainda não é de modo algum buscado. A ré-plica é o arrancar do entre, no qual acontece a contrariedade, como carente de abertura. O que pertence aqui, porém, ao “homem” e o que é deixado para trás? No lançar-se para fora, ele se funda naquilo que ele não consegue fazer, mas apenas consegue ousar enquanto possibilidade, ele se funda no ser-aí. Isso naturalmente apenas se ele não volta nunca mais a si enquanto alguém que apareceu na primeira jogada extática como o em face de, como physei ón  , como um zoon  . Isso é importante: lançar para fora e fundar a essência do homem no estranhamento do aberto. Agora pela primeira vez se inicia a história do ser e a história do homem. E o ente? Ele não chega mais à sua verdade em um retorno, mas? Como o resguardo do estrangeiro, e o estrangeiro traz a si mesmo ao encontro do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO e deixa se encontrar nele o deus. O jogar para fora nunca acontece de maneira exitosa a partir do mero impulso e do desenraizamento do homem. Esse lance é jogado na vibração do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. Isso significa: o ser toca o homem e o volta para a transformação, para a primeira conquista, para a longa perda de sua essência. Essa mensuração da errância essencial como história do homem independente de toda historiologia. E se os deuses afundam no não outorgado da recusa do seer. [tr. Casanova; GA65: 263]

A questão do seer enquanto questão fundamental não seria concebida de maneira alguma a partir de seu caráter mais digno de questão, se ela não fosse imediatamente impelida para a questão acerca da origem da “diferença ontológica”. A diferenciação entre “ser” e “ente”, o fato de o seer se destacar do ente, só pode ter sua origem, se é que o ente enquanto tal é fundado pelo seer, na essenciação do seer. A essência e o fundamento desse destaque é o obscuro, aquilo que reside cerrado em toda metafísica; e de maneira tanto mais estranha, quanto mais decididamente a metafísica se cristaliza na pensabilidade da entidade e, sobretudo, no sentido do pensar absoluto. A essência e o fundamento desse destaque é o seer como ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. Esse seer se volta como o entre clareador para o interior dessa clareira e é, por isso, sem jamais ser reconhecido e pressentido como o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, a partir do pensar representativo como ser em geral, algo diferenciável e diferenciado. Para a essenciação do seer que se dá no primeiro início, isso é considerado como physis  , que vem à tona como aletheia  , mas ao mesmo tempo acima do ente, que é apreensível por meio dela como um tal, que é esquecido e reinterpretado como o maximamente ente, como um modo de ser e como o modo de ser mais elevado do ente. Aqui reside ao mesmo tempo o fundamento pelo qual a diferença ontológica enquanto tal não ganha o espaço do saber, uma vez que, no fundo, uma diferenciação é sempre exigida apenas entre ente e ente (maximamente ente). Vê-se a consequência na confusão amplamente difundida no uso dos nomes “seer” e “ente”, que se encontram reciprocamente um para o outro de maneira arbitrária, de tal modo que, apesar de ter em vista o seer, só se re-presenta de qualquer modo um ente e se o apresenta como o que há de mais universal de todo re-presentar. O ser (enquanto ens qua ens – ens in comune) é apenas a mais fina diluição do ente e mesmo ainda um tal e, como ele determina todo ente a se mostrar enquanto ente, o mais essente do ente. Mesmo que agora, depois da denominação decidida dessa diferenciação em Ser e tempo, as pessoas se empenhem por uma terminologia mais cuidadosa, nada é alcançado e não atesta de maneira alguma que um saber e um questionar acerca do seer teriam se vivificado. Ao contrário, o risco é agora mais elevado de que o ser mesmo seja tomado por si e elaborado como algo presente à vista. [tr. Casanova; GA65: 266]

O fato de que o ser é e de que, por isso, ele não se torna nenhum ente se expressa da maneira mais aguda possível no seguinte: o seer é a possibilidade, o nunca presente à vista e o que sempre outorga e renuncia na recusa por meio do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. [tr. Casanova; GA65: 267]

O seer se essencia como o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO dos deuses e do homem para a sua contra-posição. Na clareira do encobrimento do entre, que emerge do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO e com ele, acontecimento esse que se contrapõe à clareira, desponta a contenda entre mundo e terra. E somente no campo de jogo temporal dessa contenda chega-se à preservação e à perda do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, entrando no aberto daquela clareira aquilo que é denominado o ente. [tr. Casanova; GA65: 268]

O seer e o ente não têm de modo algum como ser imediatamente distintos, porque eles em geral não se encontram imediatamente ligados um ao outro. O seer está, apesar de o ente enquanto tal só vibrar unicamente no ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, distante de maneira abissal de todo ente. As tentativas de, já ao modo da denominação, representar os dois juntos provêm da metafísica. Sim, a metafísica tem por toda parte a sua característica no fato de que a diferenciação entre ser e ente, por menos clara e expressa que ela possa ser levada a termo, é considerada como uma diferenciação imediata. O ser é tomado como a generalização do ente; de maneira consonante com a representação, ele é tão palpável quanto o ente, só que justamente “mais abstrato”. O ser é, por assim dizer apenas diluidamente, o ente uma vez mais e de qualquer modo não, porque permanece reservado ao ente ser o real e efetivo. Por outro lado, com base no predomínio do pensar (representação de algo no koinon   e no katholou  ), é adequado ao ser enquanto entidade, porém, um primado, que, então, vem à tona na respectiva determinação da ligação entre os diversos. [tr. Casanova; GA65: 268]

O ser é condição do ente, que permanece preso, com isso, de antemão já como coisa (o subsistente que se presenta). O ser con-diciona o ente ou bem como sua causa (summum ens – demiourgos) ou como fundamento da objetualidade da coisa na re-presentação (condição de possibilidade da experiência ou de saída em geral como o “anterior” por força de sua constância e presentidade mais elevadas de acordo com a sua universalidade). Aqui, pensado em termos platônico-aristotélicos, o condicionar enquanto caráter do ser corresponde o mais diretamente possível ainda à sua essência inicial mais próxima (presentidade e constância), mas ela também não se deixa explicar. Por isso, ele permanece sempre de viés e destrói a originariedade e cautela do pensar grego, quando se reinterpreta esse elemento consonante com a causa ou mesmo o condicionar “transcendental” na relação visada de maneira grega entre ser e ente. Mas mesmo os modos postedores de con-dicionar o ente e transformá-lo em um ente tal por meio do ser são prelineados e exigidos naturalmente pela interpretação grega, na medida em que a entidade (idea  ) é o propriamente produzido (poioumenon) e, por isso, o que con-stitui e faz o ente; na medida em que, por outro lado e ao mesmo tempo, a idea é o nooumenon  , o re-presentado enquanto tal, o que é anteriormente visto em todo representar. A metafísica nunca vai além desses modos de diferenciação entre ser e ente e da apreensão dessa ligação; sim, sua essência, na mistura desses modos dê pensar, é criar para si saídas e oscilar de um lado para o outro entre posições extremas, entre a incondicionalidade da entidade e a incondicionalidade do ente enquanto tal; a partir daí é possível atribuir aos títulos plurissignificativos “idealismo” e “realismo” um significado metafísico inequívoco. Uma consequência da apreensão metafísica do ser e do ente é a distribuição dos dois em áreas (regiões) e níveis, o que contém ao mesmo tempo o pressuposto para o desdobramento da ideia do sistema na metafísica. De maneira incomparável, em contrapartida, e nunca tangível em conceitos e modos de pensar metafísicos, temos o projeto do seer como ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO, projeto esse que experimenta a si mesmo como jogado e se mantém distante daquela aparência de ser um produto. Aqui se desentranha o seer naquela essenciação, com base na qual a abissalidade faz com que os contra-postos (deuses e homem) e os querelantes (mundo e terra) alcancem em sua história originária a sua essência entre o seer e o ente e admitam a denominação conjunta do seer e do ente apenas como o que há de mais questionável e de mais cindido. [tr. Casanova; GA65: 268]

O entre implosivo reúne aquilo que ele volta para o aberto de seu pertencimento contestável e marcado pela recusa, em direção ao a-bismo, a partir do qual tudo (o deus, o homem, o mundo, a terra) se essencia de volta em si e, assim, deixa ao seer a única decidibilidade do ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO. O seer de tal essenciação é ele mesmo nessa essência único. Pois ele se essencia como aquele choque, que talvez já tenha se anunciado como a mais extrema possibilidade de decisão da história ocidental, a possibilidade de que o seer mesmo venha a emergir de tal essência como a urgência do deus, que precisa da guarda do homem. Essa possibilidade é ela mesma a origem “do” seer. E o que aparece aqui comprovado com o nome do que há de mais universal e supra-histórico, segundo a opinião   até aqui sobre o seer, é por completo e antes de tudo o histórico e pura e simplesmente único. [tr. Casanova; GA65: 270]

Apropriado em meio ao acontecimento, porém, o ser-aí é como a abdicação. A ab-dicação deixa viger a recusa (isto é, o ACONTECIMENTO DA APROPRIAÇÃO) de maneira soberana no aberto de sua decidibilidade. [tr. Casanova; GA65: 271]