Ribeiro de Moura
Tratava-se para nós [1] de compreender as relações entre a consciência e a natureza, entre o interior e o exterior. Ou, ainda, tratava-se de unir a perspectiva idealista, segundo a qual nada é senão como objeto para a consciência, e a perspectiva realista, segundo a qual as consciências estão inseridas no tecido do mundo objetivo e dos acontecimentos em si. Ou então, enfim, tratava-se de saber como o mundo e o homem são acessíveis a duas espécies de investigações, umas explicativas, outras reflexivas. Em um outro trabalho, nós já formulamos estes problemas clássicos em uma outra linguagem que os reduz ao essencial: em última análise, a questão é compreender qual é, em nós e no mundo, e relação entre o sentido e o não-sentido. Aquilo que existe de sentido no mundo é produzido pela reunião ou pelo encontro de fatos independentes, ou então, ao contrário, seria a expressão de uma razão absoluta? Diz-se que os acontecimentos têm um sentido quando eles nos aparecem como a realização ou a expressão de uma visada única. Existe sentido para nós quando uma de nossas intenções é satisfeita, ou inversamente quando uma multiplicidade de fatos ou de signos se presta para nós a uma retomada que os compreende, em todo caso, quando um ou vários termos existem como… representantes ou expressão de outra coisa que eles mesmos. O próprio do idealismo é admitir que toda significação é centrífuga, é um ato de significação ou de Sinn-gebung [2], e que não existe signo natural. Em última análise, compreender é sempre construir, constituir, operar atualmente a síntese do objeto. A análise do corpo próprio e da percepção nos relevou uma relação ao objeto, uma significação mais profunda do que aquela. A coisa é apenas uma significação, ela é a significação "coisa". Que seja. Mas quando eu compreendo uma coisa, por exemplo um quadro, não opero atualmente sua síntese, eu vou ao encontro dela [575] com meus campos sensoriais, meu campo perceptivo, e finalmente com uma típica de todo ser possível, uma montagem universal a respeito do mundo. No fundo do próprio sujeito, descobríamos portanto a presença do mundo, de forma que o sujeito não devia mais ser compreendido como atividade sintética, mas como ek-stase, e que toda operação ativa de significação ou de Sinn-gebung aparecia como derivada e secundária em relação àquela pregnância da significação nos signos que poderia definir o mundo. Sob a intencionalidade de ato ou tética, e como sua condição de possibilidade, encontrávamos uma intencionalidade operante, já trabalhando antes de qualquer tese ou qualquer juízo, um "Logos do mundo estético" [3], uma "arte escondida nas profundezas da alma humana", e que, como toda arte, só se conhece em seus resultados. A distinção que tínhamos feito alhures [4] entre estrutura e significação doravante se esclarece: o que faz a diferença entre a Gestalt do círculo e a significação círculo é que a segunda é reconhecida por um entendimento que a engendra como lugar dos pontos equidistantes de um centro, a primeira por um sujeito familiar ao seu mundo e capaz de apreendê-la como uma modulação deste mundo, como fisionomia circular. Não temos outra maneira de saber o que é um quadro ou uma coisa senão olhá-los, e a significação deles só se revela se nós os olhamos de um certo ponto de vista, de uma certa distância e em um certo sentido; em uma palavra, se colocamos nossa conivência com o mundo a serviço do espetáculo. A expressão "o sentido de um córrego" não quer dizer nada se não suponho um sujeito que olhe de um certo lugar para um outro. No mundo em si, todas as direções assim como todos os movimentos são relativos, o que significa dizer que ali eles não existem. Não haveria movimento efetivo e eu não teria a noção do movimento se, na percepção, eu não deixasse a terra enquanto "solo" [5] de todos os repousos e de todos os movimentos aquém do movimento [576] e do repouso, porque eu a habito, e da mesma maneira não haveria direção sem um ser que habite o mundo e que, por seu olhar, trace ali a primeira direção-referência. Semelhantemente, só se entende o sentido de um tecido para um sujeito que pode abordar o objeto de um lado ou do outro, e é por meu aparecimento no mundo que o tecido tem um sentido. Da mesma maneira ainda, o sentido de uma frase é seu propósito ou sua intenção, o que supõe ainda um ponto de partida e um ponto de chegada, uma visada, um ponto de vista. Da mesma maneira, enfim, o sentido da visão é uma certa preparação à lógica e ao mundo das cores. Sob todas as acepções da palavra sentido, nós reconhecemos a mesma noção fundamental de um ser orientado ou polarizado em direção àquilo que ele não é, e assim sempre somos levados à concepção do sujeito como ek-stase e a uma relação de transcendência ativa entre o sujeito e o mundo. O mundo é inseparável do sujeito, mas de um sujeito que não é senão projeto do mundo, e o sujeito é inseparável do mundo, mas de um mundo que ele mesmo projeta. O sujeito é ser-no-mundo, e o mundo permanece "subjetivo" [6], já que sua textura e suas articulações são desenhadas pelo movimento de transcendência do sujeito. Portanto, com o mundo enquanto berço das significações, sentido de todos os sentidos e solo de todos os pensamentos, nós descobríamos o meio de ultrapassar a alternativa entre realismo e idealismo, acaso e razão absoluta, não-sentido e sentido. O mundo tal como tentamos mostrá-lo, enquanto unidade primordial de todas as nossas experiências no horizonte de nossa vida e termo único de todos os nossos projetos, não é mais o desdobramento visível de um Pensamento constituinte, nem uma reunião fortuita de partes, nem, bem entendido, a operação de um pensamento diretriz sobre uma matéria indiferente, mas a pátria de toda racionalidade.
original
Il s’agissait pour nous de comprendre les rapports de la conscience et de la nature, de l’intérieur et de l’extérieur. Ou bien encore, il s’agissait de relier la perspective idéaliste, selon laquelle rien n’est que comme objet pour la conscience, et la perspective réaliste, selon laquelle les consciences sont insérées dans le tissu du monde objectif et des événements en soi. Ou bien enfin, il s’agissait de savoir comment le monde et l’homme sont accessibles à deux sortes de recherches, les unes explicatives, les autres réflexives. Nous avons déjà, dans un autre travail, formulé ces problèmes classiques dans un autre langage qui les ramène à l’essentiel : la question est, en dernière analyse, de comprendre quel est, en nous et dans le monde, le rapport du sens et du non-sens. Ce qu’il y a de sens au monde est-il porté et produit par l’assemblage ou la rencontre de faits indépendants, ou bien, au contraire, n’est-il que l’expression d’une raison absolue ? On dit que les événements ont un sens lorsqu’ils nous apparaissent comme la réalisation ou l’expression d’une visée unique. Il y a sens pour nous lorsqu’une de nos intentions est comblée, ou inversement lorsqu’une multiplicité de faits ou de signes se prête de notre part à une reprise qui les comprend, en tout cas, lorsqu’un ou plusieurs termes existent comme… représentants ou expression d’autre chose qu’eux-mêmes. Le propre de l’idéalisme est d’admettre que toute signification est centrifuge, est un acte de signification ou de Sinn-gebung, et qu’il n’y a pas de signe naturel. Comprendre, c’est toujours en dernière analyse construire, constituer, opérer actuellement la synthèse de l’objet. L’analyse du corps propre et de la perception nous a révélé un rapport à l’objet, une signification plus profonde que celle-là. La chose n’est qu’une signification, c’est la signification « chose ». Soit. Mais quand je comprends une chose, par exemple un tableau, je n’en opère pas actuellement la synthèse, je viens au-devant d’elle avec mes champs sensoriels, mon champ perceptif, et finalement avec une typique de tout l’être possible, un montage universel à l’égard du monde. Au creux du sujet lui-même, nous découvrions donc la présence du monde, de sorte que le sujet ne devait plus être compris comme activité synthétique, mais comme ek-stase, et que toute opération active de signification ou de Sinn-gebung apparaissait comme dérivée et secondaire par rapport à cette prégnance de la signification dans les signes qui pourrait définir le monde. Nous retrouvions sous l’intentionnalité d’acte ou thétique, et comme sa condition de possibilité, une intentionnalité opérante, déjà à l’œuvre avant toute thèse ou tout jugement, un « Logos du monde esthétique », un « art caché dans les profondeurs de l’âme humaine », et qui, comme tout art, ne se connaît que dans ses résultats. La distinction que nous avions faite ailleurs entre structure et signification s’éclairait désormais : ce qui fait la différence entre la Gestalt du cercle et la signification cercle, c’est que la seconde est reconnue par un entendement qui l’engendre comme lieu des points équidistants d’un centre, la première par un sujet familier avec son monde, et capable de la saisir comme une modulation de ce monde, comme physionomie circulaire. Nous n’avons pas d’autre manière de savoir ce que c’est qu’un tableau ou une chose que de les regarder et leur signification ne se révèle que si nous les regardons d’un certain point de vue, d’une certaine distance et dans un certain sens, en un mot si nous mettons au service du spectacle notre connivence avec le monde. Le sens d’un cours d’eau, ce mot ne veut rien dire si je ne suppose pas un sujet qui regarde d’un certain lieu vers un autre. Dans le monde en soi, toutes les directions comme tous les mouvements sont relatifs, ce qui revient à dire qu’il n’y en a pas. Il n’y aurait pas de mouvement effectif et je n’aurais pas la notion du mouvement si, dans la perception, je ne laissais la terre, comme « sol » de tous les repos et de tous les mouvements en deçà du mouvement et du repos, parce que je l’habite, et de même il n’y aurait pas de direction sans un être qui habite le monde et qui, par son regard, y trace la première direction-repère. Pareillement le sens d’une étoffe ne s’entend que pour un sujet qui peut aborder l’objet d’un côté ou de l’autre, et c’est par mon surgissement dans le monde que l’étoffe a un sens. De même encore, le sens d’une phrase, c’est son propos ou son intention, ce qui suppose encore un point de départ et un point d’arrivée, une visée, un point de vue. De même, enfin, le sens de la vue c’est une certaine préparation à la logique et au monde des couleurs. Sous toutes les acceptions du mot sens, nous retrouvons la même notion fondamentale d’un être orienté ou polarisé vers ce qu’il n’est pas, et nous sommes ainsi toujours amenés à une conception du sujet comme ek-stase et à un rapport de transcendance active entre le sujet et le monde. Le monde est inséparable du sujet, mais d’un sujet qui n’est rien que projet du monde, et le sujet est inséparable du monde, mais d’un monde qu’il projette lui-même. Le sujet est être-au-monde et le monde reste « subjectif » puisque sa texture et ses articulations sont dessinées par le mouvement de transcendance du sujet. Nous découvrions donc avec le monde comme berceau des significations, sens de tous les sens, et sol de toutes les pensées, le moyen de dépasser l’alternative du réalisme et de l’idéalisme, du hasard et de la raison absolue, du non-sens et du sens. Le monde tel que nous avons essayé de le montrer, comme unité primordiale de toutes nos expériences à l’horizon de notre vie et terme unique de tous nos projets, ce n’est plus le déploiement visible d’une Pensée constituante, ni un assemblage fortuit de parties, ni, bien entendu, l’opération d’une Pensée directrice sur une matière indifférente, mais la patrie de toute rationalité.