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LDMH: a ordem do Dasein
sexta-feira 12 de janeiro de 2018
De certa maneira, nada foi mais arriscado que chamar de Dasein o que Heidegger buscou dizer no início dos anos 1920 em substituindo a palavra Leben (vida) em sua acepção filosófica (e não biológica), que Heidegger tinha herdado de seus predecessores (notadamente Dilthey ) e de que ele não tarda a experimentar a insuficiência. O risco vem do fato que o que Heidegger tenta dizer com a palavra Dasein se opõe precisamente à acepção habitual e metafísica do termo, a saber: a presença, seja no sentido grego disto que entra em presença à medida da physis, no sentido escolástico da existentia (por oposição à essentia), ou no sentido moderno da realidade efetiva. Cada uma destas formas da presença designa tantas modulações metafísicas disto que Heidegger nomeia em Ser e Tempo : die Vorhandenheit, o ser aí-diante (no sentido amplo do termo, que inclui aquele de Zuhandenheit, a utilizabilidade). Ser e Tempo é a primeira obra da história da filosofia que tematiza a diferença entre o que é da ordem do Dasein (daseinmässig) e o que não surge do ser do Dasein, a ponto de fazer desta diferença (que encontra ela mesma seu assento nesta outra diferença que é o cisma (Unterschied) da diferença ontológica) a ancoragem essencial da meditação. Depois da "exposição da questão do sentido do ser", é portanto por uma "análise fundamental preparatória do Dasein" que começa Ser e Tempo e é com o Dasein ainda que termina o livro que ficou inacabado.
Tudo parece assim claro: em centrando seu propósito sobre uma analítica do Dasein, Ser e Tempo é a primeira obra que faz enfim verdadeiramente direito à questão da existência do homem, enquanto toda a metafísica desde Platão não teria jamais posto a questão do homem senão à medida de uma ontologia categorial do ente aí-diante. Que a metafísica não ponha a questão do homem senão a partir de conceitos forjados para apreender a presença do ente aí-diante, o reino das categorias — esboçadas por Platão (Sofista 262d s.), definidas por Aristóteles , repensadas por Kant ou Hegel — o atesta suficientemente. Mas daí a deduzir, ao inverso, que Heidegger funda a questão do sentido do ser sobre a existência do homem, há um salto… que não dá Heidegger, mas que dará, a partir dele, o existencialismo. Poderíamos dizer em plagiando Kant , que, se para Heidegger, a questão do sentido do ser começa COM a existência, ela não resulta no entanto inteiramente DA existência. Mas o contrassenso existencialista repousa em realidade sobre um equívoco a respeito do termo Dasein pura e simplesmente assimilado à realidade humana. É desta maneira também que Husserl lê Ser e Tempo , decepcionado por seu melhor aluno que ele crê a caminho de construir uma nova antropologia. (p. 301-302)
Ver online : DASEIN