Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Antonio Machado (2003:87-88) – os poetas [Mairena]

domingo 13 de outubro de 2024

Um dia desses — Mairena está falando aos seus alunos — os papéis dos poetas e dos filósofos se inverterão. Os poetas cantarão seu espanto diante das grandes audácias metafísicas, especialmente a maior de todas, aquela que pensa no ser fora do tempo, na essência separada da existência, como se estivéssemos dizendo: peixe vivo e seco, água do rio como ilusão de peixe. E eles enfeitarão suas liras com guirlandas para cantar esses antigos milagres do pensamento.

Os filósofos, por outro lado, lamentarão progressivamente seus violinos para pensar, como os poetas, no fugit irreparabile tempus [1]. E nessa vertente romântica terminarão com uma metafísica existencialista, baseada no tempo; algo, na verdade, mais poético do que filosófico. Pois caberá ao filósofo falar-nos de angústia, a angústia essencialmente poética de estar diante do nada, e caberá ao poeta aparecer-nos embriagado de luz, embriagado com os velhos superlativos eleáticos. E poeta e filósofo se encontrarão frente a frente — nunca hostis — cada um assumindo o que o outro negligenciou.

Assim falou Mairena, antecipando vagamente os pensamentos de um poeta como Paul Valéry e de um filósofo como Martin Heidegger.


Ver online : Antonio Machado


[1«Le temps fuit inéluctablement», vers de Virgile dans les Géorgiques, livre III, v. 284.