Página inicial > Fenomenologia > Ortega y Gasset (MT:C5) – V — A vida como fabricação de si mesma. — Técnica (…)

Meditação da Técnica

Ortega y Gasset (MT:C5) – V — A vida como fabricação de si mesma. — Técnica e desejos

V LA VIDA COMO FABRICACIÓN DE SÍ MISMA. TÉCNICA Y DESEOS

quinta-feira 4 de novembro de 2021

ORTEGA Y GASSET  , José. Meditação da Técnica. Tradução e Prólogo de Luís Washington Vita  . Rio de Janeiro: Livro Íbero-Americano, 1963, p.

português

Sob esta perspectiva, a vida humana, a existência do homem aparece consistindo formalmente, essencialmente num problema. Para os demais entes do universo existir não é problema — porque existência quer dizer efetividade, realização de uma essência; por exemplo, que "o ser touro" se verifique, aconteça. Ora, o touro, se existe, existe já sendo touro. Ao contrário, para o homem existir não é já, sem mais nem menos, existir como o homem que é, senão meramente possibilidade disso e esforço para consegui-lo. Quem dos senhores é, efetivamente, o que sente que teria que ser, que deveria ser, que anela ser? Diferentemente, pois, de todo o resto, o homem, ao existir, tem que fazer-se sua existência, tem que resolver o problema prático de realizar o programa em que, verdadeiramente, consiste. Daí nossa vida ser pura tarefa e inexorável ocupação. A vida de cada um de nós é alguma coisa que não nos é dada feita, presenteada, mas alguma coisa que é preciso fazer. A vida dá muito que fazer; mas, de resto, não é senão essa tarefa que dá a cada um, e uma tarefa, repito, não é uma coisa, senão algo ativo, num sentido que transcende todos os demais. Porque no caso dos demais seres se supõe que alguém ou alguma coisa que já é, atua; mas aqui se trata de que precisamente para ser é preciso atuar, que não se é senão essa atuação. O homem, queira ou não, tem que fazer-se a si mesmo, autofabricar-se. Esta última expressão não é de todo inoportuna . Ela sublinha que o homem, na própria raiz de sua essência, encontra-se, antes que em qualquer outra, na situação do técnico. Para o homem viver é, evidentemente e antes de qualquer coisa, esforçar-se em que tenha o que ainda não tem; isto é, ele, ele mesmo, aproveitando para isso o que tem; em suma, é produção. Com isto quero dizer que a vida não é fundamentalmente como tantos séculos acreditaram: contemplação, pensamento, teoria. Não; é produção, fabricação, e somente porque estas o exigem, portanto, depois, e não antes, é pensamento, teoria, ciência. Viver. . ., isto é, achar os meios para realizar o programa que se é. O mundo, a circunstância, se apresenta evidentemente como primeira matéria e como possível máquina. Já que para existir tem que estar no mundo, e este não realiza por si e sem mais o ser do homem, já que lhe põe dificuldades, o homem se resolve a buscar nele a máquina oculta que encerra para servir ao homem. A história do pensamento humano se reduz à série de observações que o homem fez para expor à luz, para descobrir essa possibilidade de máquina que o mundo leva latente em sua matéria. Daí o invento técnico ser chamado também descobrimento. E não é, como veremos, uma causalidade que a técnica por antonomásia, a plena maturidade da técnica, se iniciasse na altura de 1600; justamente quando em seu pensamento teórico do mundo chegou o homem a entendê-lo como uma máquina. A técnica moderna enlaça-se com Galilei, Descartes  , Huygens; em suma, com os criadores da interpretação mecânica do universo. Antes se acreditava que o mundo corporal era um ente amecânico cujo ser último estava constituído por poderes espirituais mais ou menos voluntários e incoercíveis. O mundo, como puro mecanismo, é, ao contrário, a máquina das máquinas.

É, pois, um erro fundamental acreditar que o homem não é senão um animal causalmente dotado com talento técnico ou, em outras palavras, que se a um animal lhe agregássemos magicamente o dom técnico, teríamos sem mais o homem. A verdade é o contrário, porque o homem tem uma tarefa bem diversa que a do animal, uma tarefa extranatural, não pode dedicar suas energias como aquele para satisfazer suas necessidades elementares, já que, evidentemente, tem que apagá-las nessa ordem para poder prover-se com elas na improvável faina de realizar seu ser no mundo.

Eis aqui por que o homem começa quando começa a técnica. A largura, menor ou maior, que esta lhe abre na natureza é o alvéolo onde pode alojar seu excêntrico ser. Por isso insistia ontem em que o sentido e a causa da técnica estão fora dela; isto é: no emprego que dá o homem a suas energias disponíveis, libertadas por aquela. A missão inicial da técnica é essa; dar franquia ao homem para poder dedicar-se a ser ele mesmo.

Os antigos dividiam a vida em duas zonas: uma, que chamavam otium, o ócio, que não é a negação do fazer, mas ocupar-se em ser o humano do homem, que eles interpretavam como mando, organização, trato social, ciências, artes. A outra zona, cheia de esforço para satisfazer as necessidades elementares, tudo o que fazia possível aquele otium, chamavam-no nec-otium, assinalando perfeitamente o caráter negativo que tem para o homem.

Ao invés de viver ao acaso e dissipar seu esforço, necessita este atuar de acordo com plano para obter segurança em seu choque com as exigências naturais e dominá-las com um máximo de rendimento. É isto seu fazer técnico diante do fazer como Deus queira do animal, do pássaro do bom Deus, por exemplo.

Todas as atividades humanas que especialmente receberam ou merecem o nome de técnicas não são senão especificações, concreções desse caráter geral de autofabricação próprio de nosso viver.

Se nossa existência não fosse já desde um princípio a forçosidade de construir com o material da natureza a pretensão extranatural que é o homem, nenhuma dessas técnicas existiria. O fato absoluto, o puro fenômeno do universo que é a técnica, somente pode dar-se nessa estranha, patética, dramática combinação metafísica de que dois entes heterogêneos — o homem e o mundo — se vejam obrigados a unificar-se, de modo que um deles, o homem, consiga inserir seu ser extramundano no outro, que é precisamente o mundo. Esse problema, quase de engenheiro, é a existência humana.

E, contudo, ou por isso mesmo, a técnica não é em rigor o primeiro. Ela se engenha e executa a tarefa, que é a vida; consegue, claro está, numa ou noutra limitada medida, fazer que o programa humano se realize. Ela, porém, por si não define o programa; quero dizer que à técnica lhe é prefixada a finalidade que ela deve conseguir. O programa vital é pré-técnico. O técnico ou a capacidade técnica do homem tem como missão inventar os procedimentos mais simples e seguros para conseguir as necessidades do homem. Mas estas, como vimos, são também uma invenção; são o que em cada época, povo ou pessoa o homem pretende ser; há, pois, uma primeira invenção pré-técnica, a invenção por excelência, que é o desejo original.

Não se creia que é desejar faina tão fácil. Observem os senhores a específica angústia que experimenta o novo rico. Tem nas mãos a possibilidade de obter a efetivação de seus desejos. Em seu íntimo sente que não deseja nada, que por si mesmo é incapaz de orientar seu apetite e decidi-lo entre as inumeráveis coisas que o contorno lhe oferece. Por isso busca um intermediário para que lhe oriente, e o encontra nos desejos predominantes dos demais. Eis aqui a razão pela qual o primeiro que o novo rico compra para si é um automóvel, uma pianola e um fonógrafo. Encarregou aos outros que desejem por ele. Como há o tópico do pensamento, o qual consiste na ideia que não é pensada originariamente pelo que a pensa, mas tão-somente por ele repetida, cegamente, maquinalmente reiterada, há também um desejo tópico, que é antes a ficção e o mero gesto de desejar.

Isto acontece, pois, mesmo na órbita do desejar que se refere ao que já há aí, às coisas que já temos em nosso horizonte antes de desejá-las. Imagine-se até que ponto será difícil o desejo propriamente criador, o que postula o inexistente, o que antecipa o que ainda é irreal. Em suma, os desejos referentes a coisas se movem sempre dentro do perfil do homem que desejamos ser. É este, portanto, o desejo fundamental, fonte de todos os demais. E quando alguém é incapaz de desejar-se a si mesmo, porque não tem claro um "si mesmo" que realizar, é evidente que não tem senão pseudo  -desejos, espectros de apetites sem sinceridade nem vigor.

Talvez a doença básica de nosso tempo seja uma crise dos desejos e por isso toda a fabulosa potencialidade de nossa técnica parece como se não nos servisse de nada. Hoje a coisa começa a fazer-se grave fato: "A Europa   padece de uma extenuação em sua faculdade de desejar" (Espanha invertebrada) . E essa obnubilação do programa vital trará consigo uma detenção ou retrocesso da técnica que não saberá bem a quem, a que servir. Porque esta é a incrível situação a que chegamos e que confirma a interpretação aqui sustentada: a herdade, isto é, o repertório com que hoje conta o homem para viver, não somente é incomparavelmente superior ao que nunca gozou (as forças criadas na técnica equivalem a 2 500 milhões de escravos, isto é, dois servidores para cada civilizado), já que temos a clara consciência de que são superabundantes, e, contudo, a mágoa é enorme, e é que o homem atual não sabe o que ser, falta-lhe imaginação para inventar o argumento de sua própria vida.

Por quê? Ah!, isso não pertence a este ensaio. Somente nos perguntaremos: Que é o homem, ou que espécie de homens são os especialistas do programa vital? O poeta, o filósofo, o fundador de religião, o político, o descobridor de valores? Não o decidamos; baste com advertir que o técnico os supõe e que isto explica uma diferença de posição que sempre houve e contra a qual é inútil protestar.

Talvez tenha que ver com isto o estranhíssimo fato de que a técnica é quase sempre anônima, ou pelo menos os criadores dela não gozem da fama nominativa que acompanhou sempre àqueles outros homens. Um dos inventos mais formidáveis dos últimos sessenta anos foi o motor de explosão. Pois bem, quantos dos senhores, que não sejam por seu ofício técnicos, lembram neste momento a lista de nomes egrégios que levaram seus inventores?

Daí também a enorme improbabilidade de que se constitua uma "tecnocracia". Por definição, o técnico não pode mandar, dirigir em última instância. Seu papel é magnífico, venerável, mas irremediavelmente de segundo plano.

Resumamos:

A reforma da natureza ou técnica, como toda mudança ou mutação, é um movimento com seus dois termos, a quo e ad quem. O termo a quo é a natureza conforme está aí. Para modificá-la é preciso fixar o outro termo, no qual se conformará. Este termo ad quem é o programa vital do homem. Como chamaríamos a obtenção plena deste? Evidentemente, bem-estar do homem, felicidade. Eis aqui que com isso fechamos o circuito de todas as considerações feitas nas anteriores lições.

original

Bajo esta perspectiva, la vida humana, la existencia del hombre, aparece consistiendo formalmente, esencialmente, en un problema. Para los demás entes del universo, existir no es problema —porque existencia quiere decir efectividad, realización de una esencia—; por ejemplo, que «el ser toro» se verifique, acontezca. Ahora bien, el toro, si existe, existe ya siendo toro. En cambio, para el hombre existir no es ya, sin más ni más, existir como el hombre que es, sino meramente posibilidad de ello y esfuerzo hacia lograrlo. ¿Quién de ustedes es, efectivamente, el que siente que tendría que ser que debería ser, que anhela ser? A diferencia, pues, de todo lo demás, el hombre, al existir, tiene que hacerse su existencia, tiene que resolver el problema práctico de realizar el programa en que, por lo pronto, consiste. De ahí que nuestra vida sea pura tarea e inexorable quehacer. La vida de cada uno de nosotros es algo que no nos es dado hecho, regalado, sino algo que hay que hacer. La vida da mucho quehacer; pero además no es sino ese quehacer que da a cada cual, y un quehacer, repito, no es una cosa, sino algo activo, en un sentido que trasciende todos los demás. Porque en el caso de los demás seres se supone que alguien o algo que ya es, actúa; pero aquí se trata de que precisamente para ser hay que actuar, que no se es sino esa actuación. El hombre, quiera o no, tiene que hacerse a sí mismo, autofabricarse. Esta última expresión no es del todo inoportuna. Ella subraya que el hombre, en la raíz misma de su esencia, se encuentra, antes que en ninguna otra, en la situación del técnico. Para el hombre, vivir es, desde luego, y antes que otra cosa, esforzarse en que haya lo que aún no hay; a saber, él, él mismo, aprovechando para ello lo que hay; en suma, es producción. Con esto quiero decir que la vida no es fundamentalmente como tantos siglos han creído: contemplación, pensamiento, teoría. No; es producción, fabricación, y sólo porque éstas lo exigen; por lo tanto, después, y no antes, es pensamiento, teoría y ciencia. Vivir…, es decir, hallar los medios para realizar el programa que se es. El mundo, la circunstancia, se presenta desde luego como primera materia y como posible máquina. Ya que para existir tiene que estar en el mundo, y éste no realiza por sí y sin más el ser del hombre, sino que le pone dificultades, el hombre se resuelve a buscar en él la máquina oculta que encierra para servir al hombre. La historia del pensamiento humano se reduce a la serie de observaciones que el hombre ha hecho para sacar a la luz, para descubrir esa posibilidad de máquina que el mundo lleva latente en su materia. De aquí que al invento técnico se le llame también descubrimiento. Y no es, como veremos, una casualidad que la técnica por antonomasia, la plena madurez de la técnica, se iniciase hacia 1600; justamente cuando en su pensamiento teórico del mundo llegó el hombre a entenderlo como una máquina. La técnica moderna enlaza con Galileo, Descartes, Huygens; en suma, con los creadores de la interpretación mecánica del universo. Antes se creía que el mundo corporal era un ente amecánico, cuyo ser último estaba constituido por poderes espirituales, más o menos voluntariosos e incoercibles. El mundo, como puro mecanismo, es, en cambio, la máquina de las máquinas.

Es, pues, un error fundamental creer que el hombre no es sino un animal casualmente dotado con talento técnico o, dicho en otro giro, que si a un animal le agregásemos mágicamente al don técnico, tendríamos sin más el hombre. La verdad es lo contrario, porque el hombre tiene una tarea muy distinta que la del animal, una tarea extranatural, no puede dedicar sus energías como aquél a satisfacer sus necesidades elementales, sino que, desde luego, tiene que ahorrarlas en ese orden para poder vacar con ellas a la improbable faena de realizar su ser en el mundo.

He aquí por qué el hombre empieza cuando empieza la técnica. La holgura, menor o mayor, que ésta le abre en la naturaleza es el alvéolo donde puede alojar su excéntrico ser. Por eso insistía ayer en que el sentido y la causa de la técnica están fuera de ella; a saber: en el empleo que da el hombre a sus energías vacantes, liberadas por aquélla. La misión inicial de la técnica es ésa; dar franquía al hombre para poder vacar a ser sí mismo.

Los antiguos dividían la vida en dos zonas: a una, que llamaban otium, el ocio, que no es la negación del hacer, sino ocuparse en ser lo humano del hombre, que ellos interpretaban como mando, organización, trato social, ciencias, artes. La otra zona, llena de esfuerzo para satisfacer las necesidades elementales, todo lo que hacía posible aquel otium, la llamaban nec-otium, señalando muy bien el carácter negativo que tiene para el hombre.

En vez de vivir al azar y derrochar su esfuerzo, necesita éste actuar conforme a plan para obtener seguridad en su choque con las exigencias naturales y dominarlas con un máximo de rendimiento. Esto es su hacer técnico frente al hacer a la buena de Dios del animal, del pájaro del buen Dios, por ejemplo.

Todas las actividades humanas que especialmente han recibido o merecen el nombre de técnicas, no son más que especificaciones, concreciones de ese carácter general de autofabricación propio a nuestro vivir.

Si nuestra existencia no fuese ya desde un principio   la forzosidad de construir con el material de la naturaleza la pretensión extranatural que es el hombre, ninguna de esas técnicas existiría. El hecho absoluto, el puro fenómeno del universo que es la técnica, sólo puede darse en esa extraña, patética, dramática combinación metafísica de que dos entes heterogéneos —el hombre y el mundo— se vean obligados a unificarse, de modo que uno de ellos, el hombre, logre insertar su ser extramundano en el otro, que es precisamente el mundo. Ese problema, casi de ingeniero, es la existencia humana.

Y, sin embargo, o por lo mismo, la técnica no es en rigor lo primero. Ella va a ingeniarse y a ejecutar la tarea, que es la vida; va a lograr, claro está, en una u otra limitada medida, hacer que el programa humano se realice. Pero ella por sí no define el programa; quiero decir que a la técnica le es prefijada la finalidad que ella debe conseguir. El programa vital es pre-técnico. El técnico o la capacidad técnica del hombre tiene a su cargo inventar los procedimientos más simples y seguros para lograr las necesidades del hombre. Pero éstas, como hemos visto, son también una invención; son lo que en cada época, pueblo o persona   el hombre pretende ser; hay, pues, una primera invención pre-técnica, la invención por excelencia, que es el deseo original.

No se crea que es desear faena tan fácil. Observen ustedes la específica angustia que experimenta el nuevo rico. Tiene en la mano la posibilidad de obtener el logro de sus deseos, pero se encuentra con que no sabe tener deseos. En su secreto fondo advierte que no desea nada, que por sí mismo es incapaz de orientar su apetito y decidirlo entre las innumerables cosas que el contorno le ofrece. Por eso busca un intermediario que le oriente, y lo halla en los deseos predominantes de los demás. He aquí la razón por la cual lo primero que el nuevo rico se compra es un automóvil, una pianola y un fonógrafo. Ha encargado a los demás que deseen por él. Como hay el tópico del pensamiento, el cual consiste en la idea   que no es pensada originariamente por el que la piensa, sino tan sólo por él repetida, ciegamente, maquinalmente reiterada, hay también un deseo tópico, que es más bien la ficción y el mero gesto de desear.

Esto acontece, pues, aun en la órbita del desear que se refiere a lo que ya hay ahí, a las cosas que ya tenemos en nuestro horizonte antes de desearlas. Imagínese hasta qué punto será difícil el deseo propiamente creador, el que postula lo inexistente, el que anticipa lo que aún es irreal. En definitiva, los deseos referentes a cosas se mueven siempre dentro del perfil del hombre que deseamos ser. Éste es, por lo tanto, el deseo radical, fuente de todos los demás. Y cuando alguien es incapaz de desearse a sí mismo, porque no tiene claro un sí mismo que realizar, claro es que no tiene sino pseudo-deseos, espectros de apetitos sin sinceridad ni vigor.

Acaso la enfermedad básica de nuestro tiempo sea una crisis de los deseos, y por eso toda la fabulosa potencialidad de nuestra técnica parece como si no nos sirviera de nada. Hoy la cosa comienza a hacerse patente, pero ya en 1921 se me ocurría enunciar el grave hecho: «Europa padece una extenuación en su facultad de desear». (España invertebrada). Y esa obnubilación del programa vital traerá consigo una detención o retroceso de la técnica que no sabrá bien a quién, a qué servir. Porque ésta es la increíble situación a que hemos llegado y que confirma la interpretación aquí sustentada: la finca, es decir, el repertorio con que hoy cuenta el hombre para vivir, no sólo es incomparablemente superior al que nunca ha gozado (las fuerzas creadas en la técnica equivalen a 2500 millones de esclavos, es decir, dos servidores para cada civilizado), sino que tenemos la clara conciencia de que son superabundantes, y, sin embargo, la desazón es enorme, y es que el hombre actual no sabe qué ser, le falta imaginación para inventar el argumento de su propia vida.

¿Por qué? ¡Ah!, eso no pertenece a este ensayo. Sólo nos preguntaremos: ¿Qué en el hombre, o qué clase de hombres son los especialistas del programa vital? ¿El poeta, el filósofo, el fundador de religión, el político, el descubridor de valores? No lo decidamos; baste con advertir que el técnico los supone y que esto explica una diferencia de rango que siempre ha habido y contra la cual es en vano protestar.

Tal vez tenga que ver con esto el extrañísimo hecho de que la técnica es casi siempre anónima, o por lo menos que los creadores de ella no gocen de la fama nominativa que ha acompañado siempre a aquellos otros hombres. Uno de los inventos más formidables de los últimos sesenta años ha sido el motor de explosión. Pues bien, ¿cuántos de ustedes, que no sean por su oficio técnicos, recuerdan en este momento la lista de nombres egregios que llevaron sus inventores?

De aquí también la enorme improbabilidad de que se constituya una «tecnocracia». Por definición, el técnico no puede mandar, dirigir en última instancia. Su papel es magnífico, venerable, pero irremediablemente de segundo plano.

Resumamos:

La reforma de la naturaleza o técnica, como todo cambio o mutación, es un movimiento con sus dos términos, a quo y ad quem. El término a quo es la naturaleza, según está ahí. Para modificarla hay que fijar el otro término, hacia el cual se la va a conformar. Este término ad quem es el programa vital del hombre. ¿Cómo llamaríamos al logro pleno   de éste? Evidentemente, bienestar del hombre, felicidad. He aquí que con ello cerramos el rizo de todas las consideraciones hechas en las anteriores lecciones.


Ver online : ORTEGA Y GASSET