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GA45:§35 – indigência

segunda-feira 19 de fevereiro de 2024, por Cardoso de Castro

Casanova

Qual é a indigência que vigora na necessidade de iniciar aquele início do pensamento ocidental? O que compreendemos aqui em geral pela palavra “indigência”? Indigência – a palavra soa como miséria e lamentação, aponta para um prescindir e um carecer e visa, de qualquer modo, na totalidade, a uma falha, uma falta, um ficar de fora e um “não”. Nem tudo aquilo que possui o caráter de não é algo negativo no sentido do depreciativo. Tranquilidade, por exemplo. Nós pensamos a tranquilidade como a ausência e o ficar de fora de barulho e perturbação. Assim, porém, apenas interpretamos algo originário como negativo com o auxílio da negação, a saber, de barulho e perturbação, sem levar em conta aí a essência do negativo e do não. Nem tudo aquilo que tem caráter de não precisa ser falho, para não falar de maneira alguma de lastimoso e rabujento. Nós estamos habituados a interpretar a indigência e o cuidado somente a partir da esfera cotidiana do aflitivo, rabujento e chato, o que significa, contudo, que estamos habituados a transformar nossas preocupações e aflições em critério de medida das coisas. Por mais inextinguível que seja esse hábito e, por isso, por mais que ele pareça ser o único justificado, precisamos reconquistar sempre novamente, ou, até mesmo, desenvolver pela primeira vez para a nossa linguagem, o poder velado de nomeação do essencial.

Se falamos de indigência aqui como aquilo que impõe aquele elemento necessário de uma figura extrema, então não temos em vista miséria e falha. Não obstante, pensamos em um não, em algo marcado pelo caráter de não. Mas o quão pouco sabemos sobre o que possui o caráter de não e sobre a negação, por exemplo, sobre a recusa, o retardamento e o fracasso. Tudo isso não é nada iníquo, mas maximamente – se não ainda mais elevado do que o máximo – o contrário. O fato de a negação e o não provirem do excesso do supérfluo e poderem ser uma doação suprema, assim como o fato de ultrapassarem infinitamente, isto é, essencialmente, como esse não e esse negativo, todo sim corrente, isso não entra jamais no campo de visão de nosso entendimento calculador. E é bom que seja assim. Pois o entendimento “explicaria” tal fato segundo os princípios da “lógica”. De acordo com esses princípios, há afirmação e negação, ainda que o sim possua o primado, porque posiciona algo e, com isso, reconhece algo que se encontra defronte. O presente à vista e o que se presenta são considerados como o ente. Assim, é difícil para nós, onde quer que o aparentemente “negativo” venha ao nosso encontro, ver a partir daí mais do que apenas o “positivo”, concebendo, para além dessa diferença, algo originário. Aqui, no momento em que meditamos sobre a indigência daquela necessidade do início, só a mais profunda compreensão da essência da indigência pode se mostrar como boa o suficiente.

A indigência a que se visa é o não-se-saber-fora-nem-dentro; isso, porém, não acontece de maneira alguma por conta de uma ocasião qualquer, por conta dessa ou daquela ocasião, como um embaraço. Mas pelo quê, então? O não-se-saber-fora e o não-se-saber-dentro: a partir daquilo e para o interior daquilo que se abre pela primeira vez por meio de um tal saber como esse “espaço” não desbravado e não fundado. Esse “espaço” (tempo-espaço) – se é que podemos falar aqui assim – é aquele “entre” no qual ainda não está determinado o que é essente e o que é não essente e no qual, de qualquer modo, a completa confusão intrínseca à inteireza não individuada do ente e do não ente também já não arrasta todas as coisas e as leva por aí consigo. Essa indigência, como um tal não-se-saber-fora-nem-dentro, nesse entre que assim se abre, é um modo do “seer”. Na medida em que o homem alcança esse modo ou em que ele se vê talvez jogado aí, ele experimenta – mas não leva ainda em conta – pela primeira vez aquilo que denominamos em meio ao ente.

Essa indigência implode o ente, que ainda se encontra velado como tal, para tornar ocupável e fundamentável o espaço do em meio a si mesmo como o posto possível do homem em geral. Essa indigência – ainda bem pouco anunciada por meio do discurso acerca do não-se-saber-fora-nem-dentro – lança um para fora do outro, aquilo que ora se determina como o ente em sua entidade em contraposição ao não ente – supondo que a indigência impõe ao homem a necessidade que lhe é correspondente.

A indigência a que se visa aí também não se mostra, portanto, como nenhuma indigência indeterminada. Ao contrário, ela se revela como uma indigência bastante determinada em sua imposição, na medida em que já cria para o pensamento o seu espaço essencial, sim, na medida em que não é outra coisa senão isso. Pois pensar significa aqui deixar o ente despontar na decidibilidade de seu seer e se postar diante de si, acolhê-lo enquanto tal e, com isso, denominá-lo pela primeira vez em sua entidade.

Essa indigência – o não-se-saber-fora-nem-dentro no interior do em-meio-a ele mesmo infundado do ente e do não ente ainda indecididos – essa indigência não é nenhuma falha e nenhum carecimento, mas o excesso de uma doação, que é naturalmente mais difícil de suportar do que qualquer expiação. Essa indigência – dizemos – é um modo do seer, e não, por exemplo, do homem, de maneira que essa indigência emergiria nele “psiquicamente” como “vivência” e teria nele o seu lugar, mas o inverso: é o homem que emerge ele mesmo pela primeira vez dessa indigência, que é mais essencial do que ele mesmo, que só é determinado (marcado em sua afinação) por ela.

Essa indigência pertence à verdade do seer mesmo. Ela possui a sua mais elevada doação no fato de ser o fundamento da necessidade para as possibilidades extremas, em cujos caminhos o homem retorna à verdade do seer, criando para além de si e através do ente.

Rojcewicz

What sort of need held sway in the necessity to put in motion the beginning of Western thinking? And what do we understand here by “need”? “Need” is redolent of misery and complaint, it connotes deprivation and requirement, and on the whole it means lack, absence, “away,” “not.” Not every negation is negative in a depreciatory sense. Silence, for example, means the absence, the “away,” and the “not” of noise and disturbance. But here we are just interpreting something original as negative with the aid of the negative, namely, noise and disturbance, without considering the essence of “not” and “no.” Not everything negative needs to be deficient and certainly not miserable and lamentable. We have the habit of interpreting need and care only on the basis of our everyday surrounding world of what is disturbing, lamentable, and burdensome; i.e., we make our griefs and afflictions the measure of things. This habit of ours is so ineradicable that it apparently has an exclusive claim to justification, yet we must ever anew attempt to win back, or, perhaps, first develop, for our language a hidden power of naming the essential.

If we speak of need as that which makes needful the highest form of necessity, we are not referring to misery and lack. Nevertheless, we are thinking of a not, a negative. But we know little enough of the negative and the “no,” for example in forms of refusal, deferment, and failure. Yet all that is not nothingness but is at most (if not something higher still) its opposite. It never enters the field of view of our calculating reason that a no and a not may arise out of a surplus or abundance, may be the highest gift, and as this not and no may infinitely, i.e., essentially, surpass every ordinary yes. And that is all to the good. For reason would “explain” it according to the principles of logic, whereby both affirmation and denial exist, but the yes has the priority since it posits and thus acknowledges something present at hand. What is present and at hand counts as a being. Therefore it is difficult for us, wherever we encounter something apparently “negative,” not only to see in it the “positive” but also to conceive something more original, transcending that distinction. Here, where we are reflecting on the need of the necessity of the beginning, only the most profound understanding of the essence of need will suffice.

The need we have in mind arises from the distress of not knowing the way out or the way in; but that is by no means to be understood as a perplexity in some particular circumstances or other. What then is it? Not knowing the way out or the way in: that is to say, out of and into that which such knowing first opens up as an untrodden and ungrounded “space.” This space (time-space)—if we may so speak of it here—is that “between” where it has not yet been determined what being is or what non-being is, though where by the same token a total confusion and undifferentiation of beings and non-beings does not sweep everything away either, letting one thing wander into another. This distress, as such a not knowing the way out of or into this self-opening “between,” is a mode of “Being,” in which man arrives or perhaps is thrown and for the first time experiences—but does not explicitly consider—that which we are calling the “in the midst” of beings.

This distress explodes beings, still veiled as such, in order to make the space of the “in the midst” of beings able to be occupied and founded as a possible standpoint of man. This distress—here barely intimated by speaking of it as a not knowing the way out or the way in—is the casting asunder of what will be determined forthwith as beings in their beingness over and against non-beings, assuming that the distress makes needful in man a necessity corresponding to it.

The distress we are speaking of is therefore by no means indeterminate but is very determined in its needfulness, in that it provides to thinking its essential space, and indeed does nothing else than that. For thinking means here to let beings emerge in the decisiveness of their Being and to let them stand out before oneself, to perceive them as such and thereby to name them in their beingness for the first time.

This distress—the not knowing the way out of or the way into the “in the midst,” itself ungrounded, of still undifferentiated beings and non-beings—is not a lack and not a deprivation but is the surplus of a gift which, however, is more difficult to bear than any loss. This distress—we are saying—is a character of Being and not of man, as if this distress could arise “psychically” in man as a “lived experience” and have its proper place in him. On the contrary, man himself first arises out of this distress, which is more essential than he himself, for he is first determined by it.

This distress pertains to the truth of Being itself. It possesses its highest gift in being the ground of the necessity toward the highest possibilities, on the path of which man in his creations surpasses himself and returns through beings to the truth of Being.

Original

Welche Not waltete in der Notwendigkeit, jenen Anfang des abendländischen Denkens anzufangen? Was verstehen wir hier überhaupt unter dem Wort »Not«? Not — das klingt nach Elend und Jammer, deutet auf ein Entbehren und Bedürfen und meint im ganzen doch einen Mangel, ein Fehlen, ein Weg   und ein »Nicht«. Nicht jedes Nichthafte ist etwas Negatives im Sinne des Abschätzigen. Stille z. B., meinen wir, sei die Abwesenheit und das Weg   und Nicht von Lärm und Störung. Aber so deuten wir nur ein Ursprüngliches als Negatives mit Hilfe des Negativen, nämlich Lärm und Störung, ohne dabei das Wesen des Nicht und Nein zu bedenken. Nicht jedes Nichthafte braucht mangelhaft und vollends gar jammervoll und verdrießlich zu sein. Wir sind gewohnt, Not und Sorge nur aus dem alltäglichen Umkreis des Betrüblichen, des Verdrießlichen und Lästigen zu deuten und d. h. doch unsere Kümmernisse und Kümmerlichkeiten zum Maßstab der Dinge zu machen. So unausrottbar und deshalb scheinbar allein berechtigt diese Gewöhnung ist, wir müssen dennoch immer neu unserer Sprache die verborgene Nennkraft für das Wesentliche zurückgewinnen oder erst gar entfalten.

Wenn wir hier von der Not als dem sprechen, was jenes Notwendige höchster Gestalt emötigt, dann meinen wir nicht Elend und Mangel. Aber dennoch denken wir an ein Nicht, ein Nichthaftes. Aber wie wenig wissen wir schon vom Nichthaften und vom Nein, etwa von der Verweigerung und Verzögerung [152] und Versagung. All dies ist nichts Nichtiges, sondern höchstens — wenn nicht noch Höheres — sein Gegenteil. Daß ein Nein und Nicht aus dem Übermaß des Überflusses kommen und höchste Schenkung sein können und als dieses Nicht und Nein jedes geläufige Ja unendlich, d. h. wesentlich, übersteigen, dies kommt nie in den Gesichtskreis unseres rechnenden Verstandes. Und das ist gut so. Denn der Verstand würde solches nach den Grundsätzen der Logik »erklären«. Darnach gibt es Bejahung und Verneinung, wobei das Ja den Vorzug hat, weil es etwas setzt und somit Vorliegendes anerkennt. Das Vorhandene und Anwesende gilt als das Seiende. So fällt es uns schwer, überall dort, wo uns das scheinbar »Negative« begegnet, nicht etwa nur das »Positive« herauszusehen, sondern über diesen Unterschied hinaus ein Ursprünglicheres zu begreifen. Hier, wo wir uns auf die Not jener Notwendigkeit des Anfangs besinnen, ist nur das tiefste Verstehen des Wesens der Not gut genug.

Die Not, die hier gemeint wird, ist das Nicht-aus-und-ein-Wissen; dies aber keineswegs in irgendeiner, dieser und jener Gelegenheit als einer Verlegenheit, sondern? Das Nicht-aus-Wissen und das Nicht-ein-Wissen: aus dem heraus und in das hinein, was sich durch solches Wissen erst als dieser unbetretene und ungegründete »Raum« eröffnet. Dieser »Raum« (Zeit-Raum) — wenn wir hier so sprechen dürfen — ist jenes Zwischen, in dem noch nicht bestimmt ist, was seiend ist und was unseiend, und wo doch auch schon nicht mehr die völlige Verwirrung der Ungeschiedenheit des Seienden und Unseienden alles in alles fort- und umherreißt. Diese Not, als solches Nicht-aus-und-ein-Wissen in diesem so sich eröffnenden Zwischen ist eine Art des »Seyns«, in die gelangend oder vielleicht geworfen der Mensch erstmals das erfährt — aber noch nicht bedenkt —, was wir das Inmitten des Seienden nennen.

Diese Not sprengt das noch als solches verhüllte Seiende, um den Raum des Inmitten seiner als möglichen Standort des Menschen überhaupt besetz- und begründbar zu machen. Diese Not — nur kaum angezeigt durch die Rede vom Nicht-aus-und-ein-Wissen — [153] ist das Auseinanderwerfen dessen, was sich alsbald als das Seiende in seiner Seiendheit gegen das Unseiende bestimmt — gesetzt, daß die Not die ihr gemäße Notwendigkeit im Menschen emötigt.

Die Not, die da gemeint wird, ist daher auch keine unbestimmte, sondern sehr bestimmt in ihrer Nötigung, indem sie bereits dem Denken seinen Wesensraum schafft, ja nichts anderes ist als dieses. Denn Denken heißt hier, das Seiende in der Entschiedenheit seines Seyns auf stehen und vor sich stehen lassen, es als solches vernehmen und damit in seiner Seiendheit erstmals nennen.

Diese Not — das Nicht-aus-und-ein-Wissen innerhalb des selbst ungegründeten Inmitten des noch unentschiedenen Seienden und Unseienden — diese Not ist kein Mangel und kein Entbehren, sondern das Übermaß einer Schenkung, die freilich schwerer zu tragen ist als jede Einbuße. Diese Not — sagen wir — ist eine Art des Seyns und nicht etwa des Menschen, so daß in ihm »seelisch« diese Not als »Erlebnis« entspränge und ihren Platz hätte, sondern umgekehrt: Der Mensch entspringt selbst erst aus dieser Not, die wesentlicher ist als er selbst, der nur und erst von ihr be-stimmt wird.

Diese Not gehört zur Wahrheit des Seyns selbst. Sie besitzt ihre höchste Schenkung darin, der Grund der Notwendigkeit zu den höchsten Möglichkeiten zu sein, auf deren Wegen der Mensch schaffend über sich hinaus durch das Seiende hindurch in die Wahrheit des Seyns zurückkommt.


Ver online : Grundfragen der Philosophie [GA45]