Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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GA19:244-246 – filósofo é ou político, ou sofista ou totalmente louco

terça-feira 1º de março de 2022

Se perguntarmos agora mais exatamente o que é que a opinião popular, que está sempre disposta em relação aos filósofos de uma maneira específica, diz saber sobre eles, então resulta daí três coisas. Para uns, eles se mostram como πολιτικοί (políticos); para outros, como σοφισταί (sofistas); e, por fim, para outros uma vez mais como παντάπασι μανικῶς (O Sofista 216c8-d2), como “totalmente loucos”. Essas três determinações, o político, o sofista e o louco, não são casuais; e a indeterminação na qual se movimenta a opinião acerca do filósofo também não é nenhuma indeterminação arbitrária. Ao contrário, o que se precisa ter em vista nessa caracterização tripla é o seguinte: trata-se aqui de homens, cujas doutrinas e cuja atividade docente têm por meta os homens, na medida em que eles vivem na πόλις (cidade). Pois mesmo o sofista é, de acordo com a sua atividade propriamente dita, um ρήτωρ, um orador e um mestre da oratória, do discurso, discurso esse que desempenha o papel normativo na esfera pública da πόλις (cidade), diante do júri nas assembléias populares e nos festejos. Trata-se, portanto, de homens que estão dirigidos para a πολιτικά (política). Assim, apesar de toda a indeterminação da essência do filósofo, já se encontra de qualquer modo previamente dada uma esfera de seus modos possíveis de comportamento: σοφιστής (sofista), πολιτικός (político) e παντάπασιν ἔχων μανικῶς (os totalmente loucos). A partir daí (217a3) e do que se segue, as pessoas concluíram que Platão teria o intuito de escrever uma trilogia. Juntamente com O sofista – e também em termos de conteúdo, em certa medida, ele se mostra como copertinente –, nós temos um outro diálogo com o título πολιτικός [O político]. Diz-se que Platão não teria mais conseguido redigir até o fim um terceiro diálogo sobre o filósofo. A questão é que essa é uma imagem de Platão como um mestre de escola popular, que escreve dramas e que se propôs antecipadamente escrever uma trilogia. Se se considera mais detidamente, é preciso que se diga: as coisas não se apresentavam assim tão simples para Platão. Ao contrário, é jnstamente o diálogo sobre o sofista que clarifica o que o filósofo é; e, em verdade, não de uma maneira primitiva, na qual se contaria a alguém o que o filósofo é, mas de [271] maneira efetivamente socrática. Nas últimas partes do diálogo, podemos encontrar uma passagem expressa (253c8ss.) na qual a personagem que conduz o diálogo nos diz que eles teriam agora de fato encontrado de repente o filósofo, até mesmo antes de terem chegado à definição propriamente dita e científica do sofista. Isso é notável. Não apenas em termos de conteúdo, mas também em termos metodológicos puramente substanciais, na medida em que se torna visível a partir daí que mesmo Platão sabia que só podia interpretar o sofista como a imagem oposta do filósofo se ele já conhecesse e soubesse quem é o filósofo, como as coisas se acham em relação a ele. Portanto, deixemos essa trilogia de lado e busquemos alcançar a partir de O sofista a resposta autêntica para a questão que é levantada aqui: o que é o filósofo?