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Nietzsche (CI:VI,8) – invenção da finalidade
sábado 28 de novembro de 2020
Qual pode ser a nossa doutrina? — Que ninguém dá ao ser humano suas características, nem Deus, nem a sociedade, nem seus pais e ancestrais, nem ele próprio (— o contra-senso dessa última ideia rejeitada foi ensinado, como “liberdade inteligível”, por Kant , e talvez já por Platão ). Ninguém é responsável pelo fato de existir, por ser assim ou assado, por se achar nessas circunstâncias, nesse ambiente. A fatalidade do seu ser não pode ser destrinchada da fatalidade de tudo o que foi e será. Ele não é consequência de uma intenção, uma vontade, uma finalidade próprias, com ele não se faz a tentativa de alcançar um “ideal de ser humano” ou um “ideal de felicidade” ou um “ideal de moralidade” — é absurdo querer empurrar o seu ser para uma finalidade qualquer. Nós é que inventamos o conceito de “finalidade”: na realidade não se encontra finalidade… Cada um é necessário, é um pedaço de destino, pertence ao todo, está no todo — não há nada que possa julgar, medir, comparar, condenar nosso ser, pois isto significaria julgar, medir, comparar, condenar o todo… Mas não existe nada fora do todo! — O fato de que ninguém mais é feito responsável, de que o modo do ser não pode ser remontado a uma causa prima, de que o mundo não é uma unidade nem como sensorium nem como “espírito”, apenas isto é a grande libertação — somente com isso é novamente estabelecida a inocência do vir-a-ser… O conceito de “Deus” foi, até agora, a maior objeção à existência… Nós negamos Deus, nós negamos a responsabilidade em Deus: apenas assim redimimos o mundo. —
[NIETZSCHE , Friedrich. Crepúsculo dos Ídolos. Tr. Paulo César Lima de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2006 (epub), VI, §8]
Ver online : Crepúsculo dos Ídolos (epub)