Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Haar (1990:96) – o elementar do homem

quarta-feira 6 de dezembro de 2023

Alves

Nietzsche   tinha diagnosticado um desgosto e profetizado uma mutação: «Nós estamos fatigados do homem». Tratava-se para ele de dar ao homem um acréscimo de força afirmativa, face a um longo enfraquecimento, vindo do retorno niilista da vontade contra si mesma. O trajecto heideggeriano situa-se aqui exactamente no inverso do de Nietzsche. O homem tornou-se demasiado penetrado da certeza de si, demasiado ilusoriamente mestre e possuidor do universo. No presente estamos fatigados do homem prometeico ou triunfante do século xix. Também não se trata de nos elevar para além de nós próprios, para o sobre-humano, mas de voltar aquém, às nossas condições primeiras e aos nossos recursos elementares. Regresso contra a corrente, regresso às origens, regresso ao que a tradição descobriu e depois redescobriu: tal é o movimento constante de Heidegger. Reencontrar o elementar do homem é reencontrar o que o torna possível aquém da própria biologia, o a partir do quê ele é. Ser no seu elemento é ser si-mesmo. O elemento do homem, o seu solo abissal, é o ser, estranho meio que não o contém, mas que o transporta e o exporta. Regressar ao elementar é regressar à situação fundamental do homem com o ser, com o seu ser. Esta situação — em que o homem é lançado no tempo, no mundo, e sobre uma terra da qual desposa necessariamente a facticidade, numa época incontornável para ele da história — não é uma situação de maestria, de domínio, de centralidade, mas de dependência, de submissão, de descentramento. Será ainda preciso acentuar esta dependência, submetendo-nos mais a esta submissão, renunciar a toda a vontade de controlar para nos tornarmos mais autenticamente aqueles que nós somos? E uma das questões maiores que [94] coloca a renúncia heideggeriana   dos atributos, das propriedades e dos poderes humanos. Até que ponto pode o homem despojar-se da sua essência tradicional, de uma essência tão longa e tão nobremente edificada, consolidada, ilustrada? Poderá ele abster-se da subjectividade, da interioridade, da reflexividade, mesmo da individualidade como parece ser esse o caso do «mortal» no último Heidegger?

Original

Nietzsche avait diagnostiqué un dégoût et prophétisé une mutation : «Nous sommes fatigués de l’homme» [1]. Il s’agissait pour lui, face à un long affaiblissement, venu du retournement nihiliste de la volonté contre elle-même, de rendre à l’homme un surcroît de force affirmative. Mais seul un autre que l’homme, le Surhomme, sera capable de ce surcroît. La démarche heideggerienne se situe ici exactement à l’inverse de celle de Nietzsche. L’homme a accru démesurément l’idée de sa puissance. Il est devenu trop pénétré de certitude de soi, trop illusoirement maître et possesseur de l’univers. Nous sommes fatigués à présent de l’homme prométhéen ou triomphant du XIXe siècle. Aussi ne s’agit-il pas de nous hausser au-delà de nous-mêmes, vers le surhumain, mais de revenir en deçà, vers nos conditions premières et nos ressources élémentaires. Retour en amont, retour aux sources, retour à ce que la tradition   a découvert, puis recouvert : tel est le mouvement constant de Heidegger. Retrouver l’élémentaire de l’homme, c’est retrouver ce qui le rend possible en deçà même du biologique, ce à partir de quoi il est. Être dans son élément, c’est être soi-même. L’élément de l’homme, son sol abyssal, c’est l’être, étrange milieu   qui ne le porte pas, mais l’emporte et l’exporte. Revenir à l’élémentaire, c’est revenir à la situation   fondamentale de l’homme par rapport à l’être, par rapport à son être. Cette situation, où l’homme est jeté dans le temps, dans un monde et sur une terre dont il épouse nécessairement la facticité, dans une époque, incontournable pour lui, de l’Histoire, n’est pas une situation de maîtrise, de domination, de centralité, mais de dépendance, de soumission, de décentrement. Faut-il encore accentuer cette dépendance, nous soumettre davantage à cette soumission, renoncer à toute volonté de contrôle pour devenir plus authentiquement ceux que nous sommes ? C’est l’une des questions majeures que pose le dessaisissement heideggerien des attributs, des propriétés et des pouvoirs humains. Jusqu’à quel point l’homme peut-il dépouillé de son essence traditionnelle, d’une essence si longuement et si noblement édifiée, consolidée, illustrée ? Peut-il se passer de subjectivité, d’intériorité, de réflexivité, voire d’individualité, comme cela semble être le cas du «mortel» chez le dernier Heidegger ?


Ver online : Michel Haar


[1Généalogie de la morale, I, § 12.