Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Figal (O:181-182) – Dasein deixa mundo ocorrer como totalidade

domingo 7 de janeiro de 2024

Casanova

[…] O fato de não se compreender mais por mundo a “totalidade” das coisas [1], mas de se refletir sobre a possibilidade de uma tal compreensão, vem à tona para Heidegger com a ideia de uma totalidade do ente que é formada a cada vez historicamente no ser-aí. Para ele, a “transcendência” do ser-aí em relação ao ente faz-se valer por meio do fato de o ser-aí ser formador de mundo, ou seja, de o ser-aí deixar o mundo acontecer como totalidade, na medida em que oferece para si “uma visão originária (imagem), que não é apreendida expressamente, mas que, contudo, funciona como modelo para todos os entes manifestos, dentre os quais se encontra o próprio ser-aí respectivo” [2].

Foi antes de tudo na preleção do semestre de inverno de 1931/32 que Heidegger explicitou o que ele entendia por isto no particular [3]. Fala-se aí de um “vincular-se projetivo” [182] do ser-aí e do fato de o ser-aí entregar a si mesmo com o projeto de um mundo uma “vinculação”, “que permanece desde o princípio imperativa, de modo que todo comportamento subsequente em particular só pode se tornar e ser um comportamento livre por meio de uma tal vinculação” [4]. Projetos de mundo deste tipo acontecem na ciência, na história e na arte. A ciência natural, compreendida desta forma, não seria apenas pesquisa empírica, mas a delimitação prévia daquilo “que (…) deve ser compreendido futuramente por natureza e por evento natural” [5]. A história, que merece este nome, projetaria “a compreensão antecipativa do acontecimento daquilo que denominamos história” [6]. Na arte seriam produzidas as “possibilidades veladas do ser para a obra”, de modo que poderia ser conquistada toda uma nova visão daquilo “que realmente é” [7]. Em todo caso, a totalidade do mundo é descoberta de maneira nova, na medida em que aquilo que é, incluindo neste caso o “próprio ser-aí respectivo”, é interpretado sob um ponto de vista uno. Projeto de mundo e formação de mundo são interpretações do ente a partir da “totalidade absoluta” do conceito de mundo.

Theodore George

[…] That the issue of world no longer turns on the “all” of things but rather on the possibility of such an understanding is realized for Heidegger in the idea   of a totality of what is that is always formed historically in Dasein  . Daseins “transcendence” in regard to what is lies in the fact that Dasein is “world-formative,” that is, Dasein lets world occur as totality because it “provides an originary look [148] (picture) [Bild  ], which does not   grasp specifics, but nevertheless functions as the pre-picture [Vor-bild] for all revealed beings, among which the respective Dasein himself belongs.”

Heidegger elucidated how this is to be understood in detail foremost in his 1931-32 winter semester lecture course. Here, the talk is of a “projective binding” of Dasein, and of the fact that Dasein, with the projection of a world, gives a “bond,” “which remains binding from the outset in advance, so that all following conduct, down to the details, first becomes and is able to be a free one through it.” World-projections of this kind occur in science, history, and art. Understood in this way, natural science is not only empirical research, but, rather, the preliminary delimitation of “what… in the future is supposed to be understood by nature and natural process.” History worthy of the name projects “the anticipatory understanding of the occurrence of what we call history.” In art, the “concealed possibilities of what is” are brought into “a work,” so that a completely new look can be given to “what actually is” [Wirklich  -seindes], In each case, the totality of the world is always discovered anew because what is, including “the respective Dasein himself,” is clarified under a unified viewpoint. World-projection and world-formation are clarifications of what is from the standpoint of the “absolute totality” of the concept of world.


Ver online : Günter Figal


[1Heidegger já se volta contra este conceito de mundo em Ser e tempo. Cf. Heidegger, Ser e tempo. GA 2, p. 87.

[2Heidegger, Da essência do fundamento, GA 9, p. 158.

[3Quanto a uma apresentação mais detalhada desta problemática, cf. Günter Figal, Martin Heidegger zur Einführung (Introdução a Martin Heidegger), quarta edição, Hamburgo, 2003, p. 94-110.

[4Martin Heidegger, Vom Wesen der Wahrheit. Zu Platons Höhlengleichnis und Theätet (Da essência da verdade. Sobre o mito da caverna e o Teeteto de Platão), org. por Hermann Mörchen, Frankfurt junto ao Main, 1988, p. 59.

[5Heidegger, Vom Wesen der Wahrheit (Da essência da verdade), GA 34, p. 61.

[6Ibid.. p. 62.

[7Ibid., p. 64.