Qual é a estrutura sistemática de ST? As teses centrais são seis.
1) No início da obra Heidegger situa a questão da ontologia fundamental, do sentido do ser.
2) A clarificação desta questão somente pode resultar do recurso ao único ente que compreende ser — o homem (Dasein ), o estar-aí.
3) O estar-aí é ser-no-mundo.
4) Ser-no-mundo é cuidado, cura (Sorge ).
5) Cuidado é temporal (zeitlich ).
6) A temporalidade do cuidado é temporalidade ecstática que se distingue do tempo linear, objetivado.
A estrutura fundamental de ST pode também ser descrita a partir de uma sequência de regras de predicadores ou de definições que correspondem às seis teses centrais do livro:
1) No domínio da questão do sentido do ser Heidegger estabelece a distinção de “ser” e “ente” (diferença ontológica), exige programaticamente uma destruição da ontologia do ente puramente subsistente e elabora metodologicamente uma fenomenologia hermenêutica cujos enunciados pretendem validade transcendental .
2) No recurso às condições de possibilidade da questão do sentido do ser Heidegger interroga pelas condições de possibilidade do discurso sobre a situação do homem constituída linguisticamente. Pois somente o homem pode como tal perguntar pelo sentido de algo. Com estes passos da elaboração da questão de ST se ocupam os §§ 1-11.
3) A análise da situação fundamental do homem é denominada por Heidegger como fenomenologia do ser-no-mundo (§§ 12-13). Assim ele passa então para a análise, tanto do ponto de vista linguístico como do ponto de vista filosófico-existencial, das partes componentes desta [14] expressão sincategorimética: “mundo” (§§ 14-24), “ser-com e ser-si-mesmo” (§§ 25-27); “ser-em”, antropologicamente como “sentimento de situação” (§ 29), “medo” (§ 30), “compreender” (§ 31), “interpretação” (§ 32), “enunciação” (§ 33), “discurso” e “linguagem” (§ 34), “tagarelice” (§ 35), “curiosidade” (§ 36), “ambiguidade” (§ 37), “decaída”, “estar-jogado” (§ 38).
4) A situação total que Heidegger designa “ser-no-mundo” pode ser designada como situação do “cuidado”. A relação de cuidado consigo mesmo e com o mundo caracteriza todas as realizações da vida relacionando-se, assim, com a vida como um todo (§§ 39-44).
5) O “cuidado”, por sua vez, manifesta uma forma especificamente temporal. Ela se manifesta na morte (§§ 46-53).
6) Com base na “temporalidade do cuidado” podem ser distinguidos dois modos de compreender inteiramente diferentes do ser-no-mundo. Heidegger os denomina “autenticidade” e “inautenticidade” (§§ 54s). As análises dos §§ 54 a 83 repetem as análises anteriores sob a perspectiva da “temporalidade”. É nestas análises que irão sendo mostradas as estruturas reificadas que o estar-aí apresenta em sua autocompreensão e são então retro-referidas a situações de compreensão reificada da própria temporalidade do homem. Mas esta reificação que remete à “inautenticidade” e se distingue assim da não-reificação que é o estado existencial de “autenticidade” não é uma falta produzida historicamente, nem representa uma falha que possa ser preenchida. A condição de “autenticidade” e “inautenticidade” é existencial e assim constitui a estrutura do estar-aí [1].
Heidegger, com esta obra inacabada, atingira com as teses desenvolvidas nos 83 parágrafos tanto aqueles que foram seus mestres, como aqueles com quem polemizava no interior de ST. Mas sua crítica à metafísica como um todo, a planejada [15] destruição das ontologias tradicionais, usando como fio condutor a crítica de seu conceito de tempo, instalara uma profunda confrontação entre paradigmas filosóficos. E isto é a via que permite ampliar e radicalizar a leitura de sua obra.
[STEIN, E. Seis estudos sobre “Ser e tempo ”. 4. ed ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.]