Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Boutot (IFH:34) – Mit-sein - ser-com

sábado 27 de maio de 2017

O ser-aí não encontra no mundo que o envolve apenas utensílios de que dispõe, mas também outros ser-aí. O mundo do ser-aí é sempre um mundo comum, é um mundo no seio do qual os outros estão sempre já anunciados. Mesmo só, mesmo quando não há nenhum ser-aí nas suas proximidades imediatas, o ser-aí está sempre com-outro. Para dizer a verdade, a solidão só tem sentido para um ser que está fundamentalmente em relação com os outros. Os outros só podem faltar em e para um ser-com (Mit-sein  ). Na sua banalidade quotidiana, o ser-aí mantém, entretanto, uma relação particular com os outros. Ele está, podemos dizer, monopolizado pelos outros e determina-se sem cessar na relação com eles. De uma maneira geral, o ser-aí, no ser-um-com-o-outro (das Miteinander  -sein) quotidiano, mantém-se sob a influência do outro e é desapossado do seu ser si mesmo. «Não é ele mesmo que é», diz Heidegger, «os outros subtraem-lhe o ser» (O Ser e o Tempo, p. 126.). O ser-aí cai sob o que Heidegger chama a ditadura de «a gente» (das Man  ). O ser-aí não se determina mais por ele próprio, mas a partir daquilo que a gente diz. Ele diverte-se como a gente se diverte, ele julga como a gente julga, ele lê o que a gente lê, etc. O «a gente» não é nada nem ninguém, e alivia o ser-aí do seu ser. O ente que, na existência quotidiana, está no mundo não é o ser-aí existindo autenticamente em vista dele próprio, mas o ser-aí disperso na gente, aquilo a que Heidegger chama o «a gente-mesma» (das Man-selbst  ), modalidade não autêntica do si mesmo. A dispersão do ser-aí na gente é aquilo a que Heidegger chama a «queda» ou o «abatimento» (Verfallen  ) do ser-aí. A «queda» do ser-aí não tem uma significação negativa, mas faz parte da constituição ontológica do ser-aí. O ser-aí, enquanto caído ou vencido, evita o seu próprio poder ser, e refugia-se no falatório, na curiosidade, ou no equívoco. (1993, p. 34)


Ver online : Alain Boutot