Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Haar (1990:20-22) – finitude do Dasein

terça-feira 5 de dezembro de 2023

Ana Cristina Alves

«Mais original que o homem é a finitude do Dasein nele». A última secção de Kant   e o problema da metafísica reconcilia impacientemente no homem uma diferença que SZ   tinha compreendido de forma prudente como uma distinção externa, na verdade uma oposição entre o homem da tradição e o ser-no-mundo. O Dasein aparece de agora em diante como a essência íntima do homem, cujo ser verdadeiro é restabelecido. De 1929 até 1935, o regresso ao homem passa por uma fase transitória onde os dois termos Dasein e homem são conjugados em expressões tais como: «o Dasein no homem», «o Dasein do homem historiai», o «Da-sein» (com um hífen) como «ser do homem»: «chamamos o ser do homem Dasein». Esta recuperação demasiado rápida da essência verdadeira do homem participa da mesma «ingenuidade» do projecto contemporâneo da «ontologia fundamental» ou da «metafísica do Dasein». A palavra metafísica significa de maneira ainda não pejorativa toda a interrogação relativa ao ser do ente. O projecto da ontologia fundamental visa, com efeito, «fundar» a metafísica restituindo-lhe a essência esquecida do homem. O esquecimento do ser encontra-se reconduzido ao esquecimento da finitude do homem: finitude quer dizer temporalidade, compreensão do ser, disposição afectiva, ser-lançado, «decadência». Trata-se de mostrar que a metafísica tradicional, ao desenvolver uma doutrina do ser do ente como presença permanente, apenas perdeu de vista e traiu a finitude do Dasein. Uma vez acrescentada novamente esta peça que falta, a metafísica será de novo estabelecida sobre uma base sólida. Esta base sólida é o homem! A tradição insuficientemente desconstruída vinga-se impondo este novo antropocentrismo. É apoiando-se neste homem grego, anterior a Platão  , neste homem exposto ao deinon, ao inquietante poder da physis, que Heidegger reencontrará uma via para um descentramento, desta vez decisivo. Cumpre-se a Viragem: «E o próprio ser que lança o homem na via de um desprendimento que, forçando o homem a movimentar-se para lá de si mesmo como aquele que está sempre em marcha (der Ausruckender), o liga ao ser para o pôr em acção. É o ser que lança e não a physis como natureza. Não há uma necessidade cega que persiga o homem para o arrancar ao seu acampamento, ao seu repouso numa natureza própria, mas a luz historiai que lhe ordena o por a verdade em acção. O homem enquanto Ausruckender, o nunca instalado, nunca terá repouso. Será desapropriado, desfigurado, penetrado como a «brecha» em que o ser irrompe, «estranho na sua própria essência». — Mas não sem essência.

[Excerto de HAAR  , Michel. Heidegger e a essência do homem. Lisboa: Instituto Piaget, 1997, p. 16-18]

Original

«Plus originelle que l’homme est la finitude du Dasein en lui» [GA3  ]. La dernière section de Kant   et le problème de la métaphysique rapatrie impatiemment en l’homme une différence que Sein und Zeit   avait comprise plus prudemment comme une distinction externe, voire une opposition entre l’homme de la tradition et l’être-au-monde. Le Dasein apparaît désormais comme l’essence intime de l’homme, dont l’être véritable est rétabli. De 1929 jusqu’à 1935, le retour à l’homme passe par une phase transitoire où les deux termes Dasein et homme sont conjugués dans des expressions telles que : «le Dasein dans l’homme» [Ibid. p. 290], «le Dasein de l’homme historial» [GA40  ], le «Da-sein (avec un tiret) comme «être de l’homme» : «nous appelons l’être de l’homme Dasein» [GA29-30  :95]. Cette récupération trop rapide de l’essence vraie de l’homme participe de la même «naïveté» que le projet contemporain d’«ontologie fondamentale» ou de «métaphysique du Dasein». Le mot métaphysique signifie de façon encore non péjorative toute interrogation relative à l’être de l’étant. Le projet d’ontologie fondamentale vise en effet à «fonder» la métaphysique en lui restituant l’essence oubliée de l’homme. L’oubli de l’être se trouve ramené à l’oubli de la finitude de l’homme, finitude c’est-à-dire temporalité, compréhension de l’être, disposition affective, être-jeté, «déchéance». Il s’agit de montrer que la métaphysique traditionnelle, en développant une doctrine de l’être de l’étant comme présence permanente, a seulement perdu de vue et trahi la finitude du Dasein. Une fois cette pièce manquante rajoutée, la métaphysique sera à nouveau établie sur une base solide. Cette base solide, c’est l’homme ! La tradition insuffisamment déconstruite se venge en imposant ce nouvel anthropocentrisme. C’est en prenant appui sur Y homme grec d’avant Platon  , sur. l’homme en proie au deïnon, à l’inquiétante puissance de la physis, que Heidegger retrouvera une voie vers un décentrement cette fois décisif. Le Tournant est accompli : «C’est l’être lui-même qui jette l’homme sur la voie d’un arrachement qui forçant l’homme à se mettre en marche au-delà de lui-même comme celui qui lève le camp (der Ausrückender), le lie à l’être pour mettre celui-ci en œuvre»… [GA40  ] C’est l’être qui jette, et non pas la phusis comme nature. Ce n’est pas une nécessité aveugle qui met à l’homme l’épée dans les reins pour l’arracher à son campement, à son repos dans une nature propre, mais la lumière historiale qui lui commande de mettre la vérité en œuvre. L’homme en tant que der Ausrückender, le jamais installé, ne se reposera plus. Il sera déproprié, défait de lui-même, enfoncé comme la «brèche» où l’être fait irruption, «étranger dans sa propre essence» [GA40  ]. — Mais non pas sans essence.


Ver online : Michel Haar