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Gaboriau (1962:272-273) – busca do "ponto de partida"

quinta-feira 17 de outubro de 2024, por Cardoso de Castro

Na vida do conhecimento, tudo começa com a experiência, tudo o que leva à técnica e à ciência; mas, precisamente porque tudo vem da experiência, a experiência não é o ponto de partida específico da metafísica.

Na medida em que a metafísica tem de fornecer um fundamento para as outras, ela tem de se controlar rigorosamente. Portanto, a filosofia do bem é a busca pelo que é primeiro, a άρχη ou o πρῶτον. Ela pode ter sido chamada de “protologia” (V. Gioberti, Della protologia, 1857); assim como pode ser chamada de “arqueologia” (diferente de uma “arqueologia”, ciência do antigo).

“Mas o άρχη é ou um πρῶτον atemporal, cuja prioridade é ontológica ou lógica, ou seja, um princípio; ou um πρῶτον temporal cuja prioridade é cronológica, ou seja, um começo.” [1] A filosofia será considerada ou como “ciência das primeiríssimas origens” (ἐπιστήμη τῶν πρώτων αρχών, que é traduzida de forma demasiadamente abstrata como “ciência dos primeiros princípios”); ou como “ciência do início”, preocupada com a άρχη φιλοσοίας no sentido platônico do termo, onde o espanto é a fonte da reflexão (Teeteto 155 d).

Mas entre essa “ciência da iniciação do processo”, ciência do caminho, busca de método ou itinerário,… e a “ciência dos Primeiros Princípios” ou da Origem Principal (ou dos Princípios), há identidade, como entre o início e a conclusão do mesmo processo.

A palavra “princípio” deu origem a confusão. Em um caso, o princípio é o ponto de enraizamento original da filosofia; é a certeza inicial, identificada com a questão em aberto e a inquietude do filósofo “preocupado de criar raízes na verdade, para encontrar seu apoio como o alpinista”. Essa é a filosofia em formação, como tarefa e como pesquisa. No outro caso, o princípio é o fundamento final, o fundamento e a solução, a certeza suprema: a filosofia concluída, o cume conquistado do qual podemos retornar (e, no caminho de volta, “deduzir” explicando, ao passo que, na saída, estávamos nos dedicando a “induzir” explicando). Em suma, a diferença entre ‘princípio’ a ‘princípio’ é aquela entre uma verdade original e uma verdade originária, entre uma certeza inicial e uma certeza final. (Esta última é ‘principal’, como a fonte encontrada ao subir o rio, como o oceano na origem da fonte).

Mas esse princípio de ir rio acima, que é imposto ao “método” (ao itinerário), está obviamente longe do princípio autêntico, que é imposto na “realidade”, para explicar o resto. O primeiro não explica nada, é apenas uma questão de colocar o pé no estribo; o outro completa tudo. Ora, como é a mesma ciência que começa e termina, a mesma expressão pode designá-la de um lado ou de outro: ciência do começo e ciência do fim. De fato: “Não estamos no mesmo nível da verdade, e surge o problema da entrada e da passagem. Justamente porque há um passo a ser dado e a ser bem dado, há o problema do início. A questão filosófica do início constitui então o início da questão, do questionamento filosófico” [2]. Essa é uma questão radical, no verdadeiro sentido da palavra, e que merece um exame aprofundado.


Ver online : Florent Gaboriau


GABORIAU, Florent. L’Entrée en métaphysique: orientations. Bruxelas: Casterman, 1962


[1Pierre Thevenaz, Problèmes actuels de la Phénoménologie, Desclée de Brouwer, 1951, p. 11.

[2Pierre Thevenaz, Problèmes actuels de la Phénoménologie, Desclée de Brouwer, 1951, p. 12