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Ernildo Stein (2012:35-38) – Lebenswelt e significância (Bedeutsamkeit)
segunda-feira 5 de fevereiro de 2024
Para preparar a nossa conclusão, podemos aduzir que na época de Husserl e Heidegger surgiram os demiurgos da significância, porque estava morto, esgotado, todo o processo metafísico que sustentava o [36] significado das coisas, isto é, não se acreditava mais que a natureza tivesse etiquetas em seus objetos onde encontravam-se os nomes desses objetos, como no diálogo Crátilo de Platão. Não se acreditava mais que o indivíduo tivesse inato o mundo dos sentidos, o mundo dos significados.
No fundo, quando Husserl introduz o conceito de mundo da vida e quando Heidegger introduz o conceito de ser-no-mundo, sobretudo com esse locativo no, eles estavam realmente querendo tematizar algo antes nunca tematizado. Isto é, de onde surgem os significados, as significações, os significantes? Qual é a matriz da significabilidade?
Ora, essa perseguição era quase obsessiva naquela época. Era a busca de uma matriz a partir da qual originava-se toda a nossa capacidade de designar, de referir, de reconhecer o que foi referido, enfim, de todos os processos ligados à ação de significar. A busca dessa matriz era o que se encontrava encoberto tanto na ideia de mundo da vida quanto na ideia de ser-no-mundo.
Talvez isso possa nos dirigir a uma conclusão, se não a melhor, ao menos a mais interessante: nem Husserl , nem Heidegger queriam se perder numa análise de estruturas do mundo da cultura, articulada em instituições, sociedades. Ao contrário, eles estavam atrás da gênese dos processos que constitui o sentido. Esta gênese dos processos que constitui o sentido dar-se-ia a partir de uma matriz da significância. Quer dizer, de onde emergem originariamente o significado e o significante?
Então, o que eles estavam fazendo não era uma espécie de estruturalismo do sentido que se combina binariamente. Eles não estavam procurando a estrutura do sentido, mas sim, o sentido da estrutura. Isto é, por que o ser humano ou onde — aqui nem a palavra por que nem a palavra onde dizem tudo — como o ser humano gera o sentido que depois irá coagular-se em estruturas econômicas, políticas, jurídicas, sociais, matrimoniais, etc.? Eles estavam perguntando pela gênese do sentido e isso era e ainda é absolutamente novo na Filosofia. Assim, não [37] mais se espera que o sentido venha de fora, da natureza, de Deus, mas busca-se, simplesmente, localizar o foco onde essa questão surge como fundamentadora.
Finalizando, a concepção de Husserl e a de Heidegger sobre o papel da Filosofia não era uma concepção em que importava construir estruturas e analisá-las, mas era de interrogar-se pela gênese do sentido, da significância, sem recorrer ao psiquismo, à vida em sua espontaneidade. Devia-se, ao contrário, recorrer ao espaço que não se explicita, mas que é chamado mundo da vida, ou ser no mundo, ou outras expressões que não tragam consigo uma recaída no naturalismo.
Essa questão do mundo da vida não é tanto o antepredicativo, o pré-lógico — o que algumas vezes foi chamado de logicamente nu — simplesmente, mas é muito mais a busca da chamada matriz da significatividade. Se olharmos isso desse modo, então, as coisas ficam muito mais claras, mais compreensíveis para nós. Fica difícil olhar desse modo, porém, pois a matriz da significância está na existência concreta, no fato de sermos. Por isso, nenhum de nós se encontra desligado dessa matriz da significância. É por causa dessa matriz que cada um de nós é capaz de significar, de dar significados.
Nessa direção, certamente, é colocada a questão do parágrafo 18 de Ser e tempo que se intitula Finalidade e significância, no qual Heidegger apresenta a questão de que não haveria significado se não houvesse Bedeutsamkeit, se não houvesse o mundo a partir do qual isso tudo brota desde a ação humana. Essa é apenas a exposição dessa matriz da significância de onde vem a possibilidade de ser humano, de significar. Isso se não quisermos ficar com uma concepção do ser humano extrafilosófica, puramente material.
Desse modo, avançamos um pouco contra a correnteza, mas mesmo assim, sem fazer justiça total a Husserl e sem deixar de cometer injustiças contra Heidegger. De qualquer maneira isso é importante para que a maioria de nós, que se encontra nas Ciências Humanas, se [38] dê conta de que trabalhamos fundamentalmente com significados. E o lugar para o qual isso nos remete como fundamento é o Lebenswelt e não qualquer outro fundamento material, natural ou divino.
[STEIN, Ernildo. As ilusões da transparência: Dificuldades com o conceito de mundo da vida. Ijuí: Editora Unijuí, 2012]
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