Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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sinal

quarta-feira 13 de dezembro de 2023

Zeichen  . VIDE Beziehung  

Partiremos mais uma vez do manual, só que agora com o propósito de apreender mais precisamente o fenômeno da própria referência. Para este fim, tentaremos uma análise ontológica do instrumento em que se podem constatar vários sentidos de “referência”. Tal “instrumento” nós o encontramos nos sinais. Com esta palavra designam-se muitas coisas: não apenas diversas espécies de SINAL, mas o próprio ser SINAL de… pode ser formalizado e transformado numa espécie de relação universal. Deste modo, a própria estrutura de SINAL apresenta um fio ontológico capaz de orientar uma “caracterização” de todo e qualquer ente. STMSC: §17

Toda referência é uma relação, mas nem toda relação é uma referência. Toda “ação de mostrar” é uma referência, mas nem toda referência mostra. Com isso também se diz: toda “ação de mostrar” é uma relação, mas nem toda relação mostra. Assim aparece o caráter formal   e geral da relação. Para se investigar os fenômenos de referência, SINAL e significado, de nada adianta CH: fundamental para se comprovar a possibilidade da pretensão da logística caracterizá-los como a relação. Deve-se, em última instância, mostrar que a própria “relação”, devido a seu caráter formal geral, tem sua origem ontológica numa referência. STMSC: §17

Se a presente análise se limita a interpretar a diferença entre SINAL e o fenômeno de referência, então, dentro dessa limitação, não se poderá investigar adequadamente a multiplicidade de todos os sinais possíveis. Dentre os sinais, existem anúncios, prenúncios, vestígios, marcas, distintivos cuja ação de mostrar difere em cada caso, mesmo abstraindo-se daquilo que cada vez serve como SINAL. Dentre esses “sinais”, devem-se distinguir-se rastro, resto, monumento, documento, testemunho, símbolo, expressão, manifestação, significado. Tendo em vista seu caráter formal de relação, esses fenômenos se deixam facilmente formalizar; hoje, temos a tendência de submeter todos os entes a uma “interpretação” sob o fio condutor de “relação”. Trata-se de uma interpretação que sempre “dá certo” porque, no fundo, não diz nada como, por exemplo, o esquema de forma e conteúdo, usado com tanta facilidade. STMSC: §17

Escolhemos como exemplo de SINAL aquele que, numa análise posterior, desempenhará a função de exemplo numa outra perspectiva. Recentemente, instalou-se nos veículos uma seta vermelha e móvel, cujo posicionamento mostra, cada vez, por exemplo, num cruzamento, qual o caminho que o carro vai seguir. O posicionamento da seta é acionado pelo motorista. Esse SINAL é um instrumento que está à mão, não apenas na ocupação (dirigir) do motorista. Também os que não estão no veículo e justamente eles fazem uso desse instrumento, esquivando-se para o lado indicado ou ficando parados. Esse SINAL está à mão dentro do mundo na totalidade do conjunto instrumental dos meios de transporte e regras de trânsito. Enquanto instrumento, esse instrumento-SINAL constitui-se por referência. Possui o caráter de “ser-para” (Um-zu  ), possui sua serventia definida, ele é para mostrar. Essa ação de mostrar do SINAL pode ser apreendida como “referência”. Deve-se, no entanto, observar: essa “referência” enquanto SINAL não é a estrutura ontológica do SINAL enquanto instrumento. STMSC: §17

Enquanto ação de mostrar, a “referência” funda-se, ao contrário, na estrutura ontológica do instrumento, isto é, na serventia. A serventia ainda não faz de um ente um SINAL. Também o instrumento “martelo” se constitui por uma serventia, embora com isso o martelo não seja um SINAL. A “referência” mostrar é a concreção ôntica do para quê (Wozu) de uma serventia, que determina um instrumento específico. A referência “serventia para” é, em contrapartida, uma determinação ontológica categorial do instrumento como instrumento. Que o para quê (Wozu) se concretize na ação de mostrar, isto é apenas contingente para a constituição do instrumento como tal. A diferença entre referência enquanto serventia e referência enquanto SINAL torna-se visível, a grosso modo, no exemplo do SINAL. Ambas se identificam tão pouco que é somente em sua unidade que possibilitam a concreção de uma determinada espécie de instrumento. Quanto mais segura for, em princípio, a diferença entre a ação de mostrar e a referência constitutiva do instrumento, tanto mais inquestionável será a remissão própria e mesmo privilegiada que o SINAL tem com o modo de ser da totalidade instrumental, à mão dentro do mundo, e com a sua determinação mundana. No modo de lidar da ocupação, o instrumento-SINAL tem um emprego preferencial. Do ponto de vista ontológico, porém, a simples constatação desse fato não é suficiente. Deve-se esclarecer ainda o fundamento e o sentido dessa preferência. STMSC: §17

O que diz a ação de mostrar de um SINAL? A resposta só é possível, determinando-se o modo de lidar adequado com o instrumento-SINAL. Para isso, deve ser também possível apreender, de modo genuíno, a sua manualidade. Qual a maneira adequada de tratar com sinais? Seguindo a orientação do exemplo mencionado (seta), deve-se dizer: o comportamento correspondente (ser) aos sinais encontrados é o “desvio” ou o “ficar parado” diante do veículo que se aproxima com uma seta acionada. O desviar-se, enquanto tomada de uma direção, pertence essencialmente ao ser-no-mundo da presença [Dasein  ]. Ela sempre está, de algum modo, a caminho e numa direção; ficar e parar são apenas casos limites desse “estar a caminho” direcionado. O SINAL se dirige a um ser-no-mundo especificamente espacial. Propriamente, não “apreendemos” o SINAL quando somente o olhamos e constatamos ser ele uma coisa que mostra. Mesmo quando seguimos com os olhos a direção mostrada pela seta e vemos algo simplesmente dado no sentido em que aponta a seta, também não nos encontramos, em sentido próprio, com o SINAL. Ele se volta para a circunvisão do modo de lidar da ocupação e isso de tal maneira que a circunvisão, seguindo-lhe a indicação, dá uma “visão panorâmica” explícita de cada envergadura do mundo circundante. A visão panorâmica da circunvisão não apreende o que está à mão; ao contrário, ela recebe uma orientação no mundo circundante. Uma outra possibilidade da experiência do instrumento consiste na seta se apresentar como um instrumento pertencente ao veículo; com isso, não é preciso que se tenha descoberto o caráter instrumental específico da seta, podendo permanecer inteiramente indeterminado o que e como ele mostra e, apesar disso, o que assim vem ao encontro não é uma simples coisa. Ao contrário da constatação imediata de uma multiplicidade indeterminada de instrumentos, a experiência de uma coisa exige a sua determinação própria. STMSC: §17

A singularidade do caráter instrumental do SINAL evidencia-se em sua “instauração de SINAL”. Cria-se o SINAL numa previsão cuidadosa própria da circunvisão e a partir dela. É uma previsão cuidadosa que necessita da possibilidade manual de, a cada passo, fazer anunciar o mundo circundante para a circunvisão, mediante o que está à mão. O caráter acima descrito de não sobressair e nem deter-se em si mesmo pertence ao ser do que está mais imediatamente à mão dentro do mundo. Por isso o modo de lidar da circunvisão no mundo circundante necessita de um instrumento à mão que assuma, em seu próprio caráter instrumental, a “obra” de causar surpresa de um manual. Por isso a produção desses instrumentos (dos sinais) deve visar à sua surpresa. Com isso, todavia, eles não se tornam seres simples e arbitrariamente dados. Ao contrário, os sinais são “instalados” de determinado modo, na intenção de um fácil acesso. STMSC: §17

A instauração de sinais não precisa ser necessariamente produção de um instrumento que antes não se achava absolutamente à mão. Os sinais também surgem ao se tomar como SINAL algo que já está à mão. Nesse modo, a instauração de sinais revela um sentido ainda mais originário. A ação de mostrar não dá origem apenas a uma disponibilidade orientada na circunvisão de um conjunto instrumental à mão e do mundo circundante em geral, mas ela pode até mesmo principiar um movimento de descoberta. Aquilo que é tomado como SINAL só se torna acessível através de sua manualidade. Se, por exemplo, no cultivo do campo, o vento sudeste “vale” como SINAL de chuva, então essa “validade” ou “valor atribuído” a esse ente não é um acréscimo a algo já simplesmente dado em si mesmo como a corrente de ar ou uma determinada direção geográfica. Enquanto algo que somente ocorre, mesmo que possa ser meteorologicamente acessível, o vento sudeste nunca é simplesmente dado antes de qualquer coisa para então adquirir a função de um prenúncio. É a circunvisão própria ao cultivo do campo que, levando-o em conta, descobre justamente aí o vento sudeste em seu ser. STMSC: §17

Poder-se-ia, contudo objetar que o que é tomado como SINAL deve ter-se tornado acessível previamente em si mesmo e ter sido apreendido antes da instauração do SINAL. Certamente ele deve, de alguma maneira, ter sido constatado previamente. Fica, no entanto, a questão de como se descobre o ente nesse encontro prévio, se é como uma coisa que ocorre pura e simplesmente e não tanto como um instrumento não compreendido, ou se é como um manual que até então se mantinha entranhado para a circunvisão por não se saber “o que fazer” com ele. Também aqui, novamente, não se deve interpretar os caracteres instrumentais ainda não descobertos do manual pela circunvisão como mera coisalidade, destinada a uma apreensão do que é simplesmente dado. STMSC: §17

No modo de lidar cotidiano, a manualidade do SINAL e a sua surpresa, que pode ser produzida segundo várias intenções e modos, documentam não apenas a não-surpresa constitutiva do que mais imediatamente está à mão. Também indicam que é o próprio SINAL que retira a sua surpresa da não-surpresa do todo instrumental, à mão na cotidianidade de modo “evidente” como, por exemplo, o costume de se dar um “nó no lenço” como marca de lembrança. O que ele mostra é que há sempre algo com que se ocupar na circunvisão da cotidianidade. Esse SINAL pode mostrar muitas coisas e das mais diversas espécies. A envergadura do que se pode mostrar nesse SINAL corresponde à limitação do uso e da compreensão. Na maior parte das vezes, enquanto SINAL, ele não apenas está à mão somente para o seu “inventor” como, mesmo para ele, pode tornar-se inacessível, de tal maneira que um segundo SINAL se faz necessário para o emprego possível do primeiro pela circunvisão. Embora não podendo ser usado como SINAL, o nó não perde o seu caráter de SINAL, adquirindo uma importunidade inquietante. STMSC: §17

Poder-se-ia ficar tentado a ilustrar o papel primordial do SINAL na ocupação cotidiana para a própria compreensão do mundo com o uso abundante de “sinais”, característico da presença [Dasein] primitiva, ou seja, com o fetiche e a magia. Decerto, a criação de sinais à base desse tipo de uso de sinais não se faz segundo uma intenção teórica nem através de uma especulação teórica. O uso de sinais permanece inteiramente no âmbito de um ser-no-mundo “imediato”. Num exame mais minucioso, porém, torna-se claro que a interpretação de fetiche e magia feita pela ideia de SINAL não é, de modo algum, suficiente para apreender o modo de “estar à mão” dos entes que vêm ao encontro no mundo primitivo. No que concerne ao fenômeno do SINAL, poder-se-ia fazer a seguinte interpretação: para o homem primitivo, o SINAL e o asSINALado coincidem. O próprio SINAL pode representar o asSINALado não somente no sentido de substituí-lo, mas, sobretudo, no sentido de que o próprio SINAL é sempre o asSINALado. Essa estranha coincidência de SINAL e asSINALado não reside, contudo, em a coisa SINAL já ter feito a experiência de uma certa “objetivação”, sendo experimentada como pura coisa e, desse modo, transferida com o asSINALado para o mesmo âmbito ontológico do simplesmente dado. A “coincidência” não é identificação do que antes estava isolado mas um SINAL que ainda-não-está-livre do designado. Esse uso de SINAL desaparece inteiramente em ser para o asSINALado, a ponto de ainda não se poder separar um SINAL como tal. A coincidência não se funda numa primeira objetivação mas na total falta de objetivação. Isso significa, no entanto, que os sinais não foram descobertos como instrumento e que, por fim, o “manual” intramundano ainda não possui de forma alguma o modo de ser do instrumento. Presumivelmente, esse diapasão ontológico (manualidade e instrumento), bem como a ontologia da coisalidade, não podem contribuir em nada para uma interpretação do mundo primitivo. Se, no entanto, uma compreensão de ser é constitutiva da presença [Dasein] primitiva e do mundo primitivo em geral, então torna-se ainda mais urgente a elaboração da ideia “formal” de mundanidade, ou seja, de um fenômeno que é de tal maneira passível de modificações que todos os enunciados ontológicos, seja no contexto fenomenal prefixado do que ainda não é isso ou do que já não é mais isso, recebam um sentido fenomenal positivo a partir do que não é. STMSC: §17

Esta interpretação do SINAL tinha apenas a finalidade de oferecer um apoio fenomenal para se caracterizar a referência. A relação entre SINAL e referência é tríplice: 1. Na estrutura do instrumento em geral, a ação de mostrar, enquanto possível concreção do para quê (Wozu) de uma serventia, funda-se no ser para (Um-zu) (referência). 2. A ação de mostrar do SINAL, enquanto caráter instrumental do que se acha à mão, pertence a uma totalidade instrumental, a um conjunto referencial. 3. O SINAL não está apenas à mão junto com outro instrumento, mas, em sua manualidade, o mundo circundante torna-se, cada vez, explicitamente acessível à circunvisão. O SINAL está onticamente à mão e, enquanto é esse instrumento determinado, desempenha, ao mesmo tempo, a função de alguma coisa que indica a estrutura ontológica de manualidade, totalidade de referencial e mundanidade. Aí se enraíza o privilégio desse manual em meio ao mundo circundante, ocupado pela circunvisão. Se, portanto, a própria referência deve ser, do ponto de vista ontológico, fundamento do SINAL, ela mesma não pode ser concebida como SINAL. Como a própria referência constitui manualidade, ela não é a determinação ôntica de um manual. Em que sentido a referência é a “pressuposição” ontológica do manual e em que medida, na qualidade de fundamento ontológico, é também constitutivo da mundanidade em geral? STMSC: §17

Indicou-se a constituição instrumental do manual como referência. Como o mundo pode liberar em seu ser os entes dotados desse modo de ser? Por que esse ente é o que vem ao encontro em primeiro lugar? Consideramos a serventia, o dano, a possibilidade de emprego, etc. como referências determinadas. O para quê (Wozu) de uma serventia e o em quê (Wofür) de uma possibilidade de emprego delineiam a concreção possível da referência. A “ação de mostrar” do SINAL, o “martelar” do martelo não são, contudo, propriedades dos entes. Não são propriedades em sentido algum, caso esse termo deva designar a estrutura ontológica de uma determinação possível de coisas. Em todo caso, o manual é apropriado ou não apropriado e, nessas apropriações, suas “propriedades” acham-se, por assim dizer, articuladas, do mesmo modo que o ser simplesmente dado, na qualidade de modo possível de ser de um manual na manualidade. Como constituição do instrumento, a serventia (referência) também não é o ser apropriado de um ente, mas a condição ontológica da possibilidade para que possa ser determinado por apropriações. O que diria, pois, nesse caso, referência? O ser do manual tem a estrutura da referência. Isso significa: ele possui em si mesmo o caráter de estar referido a. O ente se descobre enquanto referido a uma coisa como o ente que ele mesmo é. O ente tem com o ser que ele é algo junto. O caráter ontológico do manual é a conjuntura. Na conjuntura se diz: algo se deixa e faz junto a. É essa remissão de “com… junto…” que se pretende indicar com o termo referência. STMSC: §18