Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

Página inicial > Fenomenologia > Platão (Fédon:65a-66a) – o obstáculo corporal

Platão (Fédon:65a-66a) – o obstáculo corporal

segunda-feira 11 de maio de 2020

Carlos Alberto Nunes

E como referência à aquisição do conhecimento? O corpo constitui ou não constitui obstáculo, quando chamado para participar da pesquisa? O que digo é o seguinte: a vista e o ouvido asseguram aos homens alguma verdade? Ou será certo o que os poetas não se cansam de afirmar, que nada vemos nem ouvimos com exatidão? Ora, se esses dois sentidos corpóreos não são nem exatos nem de confiança, que diremos dos demais, em tudo inferiores aos primeiros? Não pensas desse modo?

Perfeitamente, respondeu.

Então, perguntou, quando é que a alma atinge a verdade? É fora de dúvida que, desde o momento em que tenta investigar algo na companhia do corpo, vê se lograda por ele.

Tens razão.

E não é no pensamento – se tiver de ser de algum modo – que algo da realidade se lhe patenteia?

Perfeitamente.

Ora, a alma pensa melhor quando não tem nada disso a perturbá-la, nem a vista nem o ouvido, nem dor nem prazer de espécie alguma, e concentrada ao máximo em si mesma, dispensa a companhia do corpo, evitando tanto quanto possível qualquer comércio com ele, e esforça-se por apreender a verdade.

Certo.

E não é nesse estado que a alma do filósofo despreza o corpo e dele foge, trabalhando por concentrar-se em si própria?

Evidentemente.

E com relação ao seguinte, Símias: afirmaremos ou não que o justo em si mesmo seja alguma coisa?

Afirmaremos, sem dúvida, por Zeus.

E também o belo em si e o bem?

Também.

E algum dia já percebeste com os olhos qualquer deles?

Nunca, respondeu.

Ou por intermédio de outro sentido corpóreo? Refiro-me a tudo: grandeza, saúde, força e o mais que for, numa palavra: à essência de tudo o que existe, conforme a natureza de cada coisa. É por intermédio do corpo que percebemos o que neles há de verdadeiro, ou tudo se passará da seguinte maneira: quem de nós ficar em melhores condições de pensar em si mesmo o mais exatamente possível o que se propõe examinar, não é esse que estará mais perto do conhecimento de cada coisa? Ou não?

Perfeitamente.

E não alcançará semelhante objetivo da maneira mais pura quem se aproximar de cada coisa só com o pensamento, sem arrastar para a reflexão a vista ou qualquer outro sentido, nem associá-los a seu raciocínio, porém valendo-se do pensamento puro, esforçar-se por apreender a realidade de cada coisa em sua maior pureza  , apartado, quanto possível, da vista e do ouvido, e, por assim dizer, de todo o corpo, por ser o corpo fator de perturbação para a alma e impedi-la de alcançar a verdade e o pensamento, sempre que a ele se associa? Não será, Símias, esse indivíduo, se houver alguém em tais condições, que alcançara o conhecimento do Ser?

Tens toda a razão, Sócrates, respondeu Símias. (Excerto de Fédon 65a-68b)

Chambry

X. — Et quand il s’agit de l’acquisition de la science, le corps est-il, oui ou non, un obstacle, si on l’associe à cette recherche ? Je m’explique par un exemple : la vue et l’ouïe offrent-elles aux hommes quelque certitude, ou est-il vrai, comme les poètes nous le chantent sans cesse, que nous n’entendons et ne voyons rien exactement ? Or si ces deux sens corporels ne sont pas exacts ni sûrs, les autres auront peine à l’être ; car ils sont tous inférieurs à ceux-là. N’est-ce pas ton avis ?

— Si, entièrement, dit Simmias.

— Quand donc, reprit Socrate, l’âme atteint-elle la vérité ? Quand elle entreprend de faire quelque recherche de concert avec le corps, nous voyons qu’il l’induit en erreur.

— C’est vrai.

— N’est-ce pas en raisonnant qu’elle prend, si jamais elle la prend, quelque connaissance des réalités ?

— Si.

— Mais l’âme ne raisonne jamais mieux que quand rien ne la trouble, ni l’ouïe, ni la vue, ni la douleur, ni quelque plaisir, mais qu’au contraire elle s’isole le plus complètement en elle-même, en envoyant promener le corps et qu’elle rompt, autant qu’elle peut, tout commerce et tout contact avec lui pour essayer de saisir le réel.

— C’est juste.

— Ainsi donc, ici encore, l’âme du philosophe méprise profondément le corps, le fuit et cherche à s’isoler en elle-même ?

— Il me semble.

— Et maintenant, Simmias, que dirons-nous de ceci ? Admettons-nous qu’il y a quelque chose de juste en soi, ou qu’il n’y a rien ?

— Oui, par Zeus, nous l’admettons.

— Et aussi quelque chose de beau et de bon ?

— Sans doute.

— Or as-tu déjà vu aucune chose de ce genre avec tes yeux ?

— Pas du tout, dit-il.

— Alors, les as-tu saisies par quelque autre sens de ton corps ? Et je parle ici de toutes les choses de ce genre, comme la grandeur, la santé, la force, en un mot de l’essence de toutes les autres choses, c’est-à-dire de ce qu’elles sont en elles-mêmes. Est-ce au moyen du corps que l’on observe ce qu’il y a de plus vrai en elles ? ou plutôt n’est-il pas vrai que celui d’entre nous qui se sera le mieux et le plus minutieusement préparé à penser la chose qu’il étudie en elle-même, c’est celui-là qui s’approchera le plus de la connaissance des êtres ?

— Certainement.

— Et le moyen le plus pur de le faire, ne serait-ce pas d’aborder chaque chose, autant que possible, avec la pensée seule, sans admettre dans sa réflexion ni la vue ni quelque autre sens, sans en traîner aucun avec le raisonnement, d’user au contraire de la pensée toute seule et toute pure pour se mettre en chasse de chaque chose en elle-même et en sa pureté, après s’être autant que possible débarrassé de ses yeux et de ses oreilles et, si je puis dire, de son corps tout entier, parce qu’il trouble l’âme et ne lui permet pas d’arriver à la vérité et à l’intelligence, quand elle l’associe à ses opérations ? S’il est quelqu’un qui puisse atteindre l’être, n’est-ce pas, Simmias, celui qui en usera de la sorte ?

— C’est merveilleusement exact, Socrate, ce que tu dis là, répondit Simmias. (Excerto de Phédon 61c-69e->http://platon.hyperlogos.info/Chambry-Phedon-61c-69e])


Ver online : Fédon