Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Haar (1990:95-96) – o homem não tem seus poderes dele mesmo

quarta-feira 6 de dezembro de 2023

Alves

Desde a analítica do Dasein   até às últimas meditações sobre os «mortais», Heidegger atribui ao pensamento uma tarefa singularmente ambiciosa e desconcertante: mudar a essência do homem e, por isso, compreendê-lo diferentemente de toda a tradição até ele. «Para quem entende a história do homem como história da essência do homem, a questão “o que é o homem?” não pode significar a necessidade de fazer sair o homem pelo questionamento para fora da sua morada metafísica tradicional, de o dirigir, ao questionar, para «uma outra essência, e por aí ultrapassar a própria questão». Mas porquê um tal projecto? Por que deve o homem ser determinado diferentemente de um composto de alma e corpo, ou como «este vivente dotado de palavra», zoon logon echon  , que durante séculos chamaram «animal racional», e que a Técnica transformou recentemente na sua última metamorfose: «o vivente que calcula», ou «que trabalha», «a besta de trabalho»? Estas representações não são falsas, diz Heidegger, mas perderam de vista o traço essencial do homem. Esquematicamente, todo o processo heideggeriano do «humanismo» metafísico [93] reconduz-se a duas acusações principais: o substancialismo e o antropocentrismo. O homem não é primeiramente uma substância corporal animada, ou unidade de duas substâncias, mas ek-sistência, quer dizer, abertura, transcendência, relação ex-tática com o ser. Tal é o seu traço essencial. O homem não possui em si mesmo as suas propriedades e os seus poderes; ele não se dá o ser nem a relação com o ser. Não é o centro dos entes; ele mantém-se «no meio do ente» sem ser o meio destes, está longe de possuir o segredo da sua própria essência, talvez nunca a alcançando.

Original

Depuis l’analytique du Dasein jusqu’aux dernières méditations sur les «mortels», Heidegger assigne à la pensée une tâche singulièrement ambitieuse et déconcertante : changer l’essence de l’homme [1], et pour cela, le comprendre autrement que toute la tradition   jusqu’à lui. «Pour qui a saisi l’histoire de l’homme comme histoire de l’essence de l’homme, pour celui-là la question “qu’est-ce que l’homme ?”, ne peut que signifier la nécessité de faire sortir l’homme par le questionnement hors de son lieu de séjour métaphysique traditionnel, de le diriger, en questionnant, vers une autre essence, et par là dépasser cette question elle-même» [2]. Mais pourquoi un tel projet ? Pourquoi l’homme doit-il être déterminé autrement que comme un composé d’âme et de corps, ou comme ce «vivant doué de la parole», zoon   logon echon, que des siècles ont appelé l’«animal raisonnable», et que la Technique a récemment transformé en son dernier avatar, «le vivant qui calcule», ou «qui travaille», «la bête de labeur» [3] ? Ces représentations ne sont pas fausses, dit Heidegger, mais elles ont perdu de vue le trait essentiel de l’homme. Schématiquement, tout le procès heideggerien de l’«humanisme» métaphysique se ramène à deux chefs d’accusation : le substantialisme et l’anthropocentrisme. L’homme n’est pas d’abord une substance corporelle animée ou l’unité de deux substances, mais ek-sistence, c’est-à-dire ouverture, transcendance, relation ek-statique à l’être. Tel est son trait essentiel. L’homme ne tient pas ses propriétés et ses pouvoirs de lui-même ; il ne se donne pas l’être ni la relation à l’être. Il n’est pas le centre des étants ; il se tient «au milieu   de l’étant» sans en être le milieu, loin de posséder [96] le secret de sa propre essence, il n’y accède peut-être jamais.


Ver online : Michel Haar


[1Le retour au fondement de la métaphysique devrait permettre une «mutation (Wandel) de l’essence de l’homme» (Questions I, p. 26).

[2Beiträge zur Philosophie, GA65, p. 491.

[3Essais et conférences, trad. p. 81-82.