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A essência da filosofia

Dilthey (EF) – essência da filosofia

domingo 17 de outubro de 2021

Excerto de DILTHEY  , Wilhelm. A essência da filosofia. Tr. Marco Antônio Casanova  . Petrópolis: Vozes, 2018 (epub)

O nome filosofia revelou-se como distribuído em estados de fato do tipo mais diverso possível. Uma mobilidade extraordinária mostrou-se na essência da filosofia: uma colocação sempre nova de tarefas, um adaptar-se aos estados da cultura. A filosofia toma problemas como valiosos e os rejeita, então, uma vez mais: em um nível do conhecimento, seu questionamento se mostra como solúvel, nível esse que ela deixa em seguida cair como insolúvel. Sempre vimos atuar nela, porém, a mesma tendência para a universalidade, para a fundamentação, a mesma direção do espírito para o todo do mundo dado. E constantemente luta nela o impulso metafísico para penetrar no cerne desse todo, com a exigência positivista da validade universal de seu saber. Esses são os dois lados, que são próprios à sua essência e que a distinguem também das regiões mais proximamente aparentadas da cultura. Diferentemente das ciências particulares, ela busca a solução do enigma do mundo e da vida mesma. E, diferentemente da arte e da religião, ela quer oferecer essa solução de uma maneira universalmente válida. Pois esse é, então, o resultado principal oriundo do estado de fato histórico discutido: um nexo histórico consequente, em si coeso leva do conhecimento metafísico do mundo dos gregos, que procuraram resolver de uma maneira universalmente válida o grande enigma do mundo e da vida, até os positivistas mais radicais ou os céticos do presente; tudo o que acontece na filosofia é determinado de algum modo por esse ponto de partida, por meio de seu problema fundamental; todas as possibilidades são percorridas em relação a como o espírito humano pode se comportar em relação ao enigma do mundo e da vida.

Filosofia como uma função no nexo final da sociedade.

Nesse nexo histórico, a realização de toda e qualquer posição filosófica é a concretização de uma possibilidade sob as condições dadas: cada uma delas expressou um traço essencial da filosofia, e ela apontou ao mesmo tempo, por meio de sua delimitação, para o nexo teleológico, no qual ela é condicionada – como parte de um todo, no qual apenas toda a verdade é. Esse estado de fato histórico composto explica-se a partir do fato de a filosofia ser uma função no nexo final da sociedade, que é determinada pela realização própria à filosofia. O modo como ela preenche essa função em suas posições particulares é condicionado por sua relação com o todo e, ao mesmo tempo, pela situação cultural segundo tempo, lugar, relações vitais e personalidade. Por isto, ela não tolera nenhuma demarcação rígida por meio de um objeto determinado ou por meio de um método determinado.

Essa função coloca em conexão os particulares, nos quais ela é efetiva.

Esse estado de coisas, que forma a essência da filosofia, une todos os pensadores filosóficos. Aqui, um traço essencial encontra sua explicação, um traço que veio ao nosso encontro nas aparições da filosofia. O nome filosofia, vimos, designa algo que uniformemente retorna e que está por toda parte presente, quando esse nome entra em cena. Ao mesmo tempo, porém, ele designa um nexo interno daqueles que participam da filosofia. Se a filosofia é uma função, que leva a termo na sociedade uma determinada realização, então ela coloca em uma relação interna aqueles nos quais vive essa finalidade. Os principais representantes das escolas filosóficas estão, assim, ligados com os seus alunos. Nas academias, que surgiram desde a fundamentação das ciências particulares, encontramos essas ciências particulares em um trabalho conjunto, complementando-se mutuamente, trabalho esse sustentado pela ideia da unidade do saber, e a consciência desse nexo corporifica-se em naturezas filosóficas como Platão, Aristóteles e Leibniz  . Finalmente, no curso do século XVIII, também se desenvolveram as universidades, transformando-se em organizações do trabalho científico conjunto, no qual os mestres entre si e com os alunos se acham ligados. Mesmo entre eles, então, coube à filosofia a função de manter viva a consciência da fundamentação, do nexo e da meta do saber. Todas essas organizações abarcam o nexo final interno, no qual, a partir de Tales e Pitágoras, um pensador entrega ao outro problemas e lega verdades: possibilidades da solução são pensadas inteiramente nessa sequência; visões de mundo são continuamente formadas. Os grandes pensadores atuam como forças sobre todo e qualquer tempo subsequente.


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