Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

Página inicial > Fenomenologia > Braver (2014:53-54) – Befindlichkeit - disposição - encontrar-se

Braver (2014:53-54) – Befindlichkeit - disposição - encontrar-se

domingo 17 de dezembro de 2017

destaque

Uma das razões pelas quais Heidegger gosta da palavra "Befindlichkeit  " [encontrar-se, disposição] é o fato de esta enfatizar a nossa passividade. Encontramo-nos num estado de espírito [Stimmung  ] que não é da nossa autoria nem da nossa escolha, e não podemos mudar o nosso estado de espírito simplesmente decidindo fazê-lo. Por vezes, podemos afetá-lo indiretamente, colocando-nos num contexto que nos recorda as razões pelas quais deveríamos estar felizes em vez de tristes, por exemplo. Mas isso é colocar um estado de espírito contra outro, tentando fazer com que um "contraposto ao estado de espírito" vá combater e substituir aquele em que nos encontramos, em vez de simplesmente o controlar de sobre ele (SZ  :136). Embora por vezes possamos descobrir a causa dos nossos estados de espírito, muitas vezes eles acontecem-nos sem razão aparente e podem persistir apesar de acontecimentos contrários. Não podemos explicar o nosso estado de espírito inteiramente em termos do que nos acontece, porque o estado de espírito em que nos encontramos desempenha um papel importante na determinação da forma como reagimos a essas coisas. Se me sinto bem, posso encarar com naturalidade problemas bastante sérios ("Oh, bem, isso acontece"), ao passo que quando estou em baixo, mesmo um pequeno contratempo pode fazer-me cair em depressão e levar-me a abandonar o que estava a tentar fazer ("Agora nunca vou conseguir acabar isto! Oh, esqueçam tudo!").

Heidegger pensa que isto revela limites significativos à nossa autonomia, à nossa capacidade de controlar o tipo de pessoa que somos, apesar da grande confiança da filosofia tradicional na nossa capacidade de nos controlarmos a nós próprios e às nossas ações. Esta passividade vai até ao simples fato de existirmos: "o estado de espírito coloca o Dasein   perante o ’isso-que-é’ do seu ’aí’, que, como tal, o encara com a inexorabilidade de um enigma" (SZ:136). Encontramo-nos numa clareira que não criamos e que não podemos controlar. Não escolhemos nascer; fomos, na expressão de Heidegger, "jogados" para o fato de estarmos vivos, bem como para a nossa facticidade, isto é, os fatos particulares das nossas vidas — quando, onde e com quem nascemos, [54] que tipo de personalidade temos, etc. (174/135). Este fato é inescapavelmente misterioso. Qualquer resposta que déssemos — Deus criou-nos, por exemplo — seria ela própria inexplicável — porque é que Deus fez isto? Porque é que existe um Deus e porque é que Ele escolheu este objetivo e a mim para ele? Há limites inescapáveis para o tipo de respostas que podemos dar às questões filosóficas tradicionais sobre o porquê de estarmos aqui e aos objetivos filosóficos tradicionais como a autonomia, e estes fatos são revelados pelos estados de espírito, não pela razão. Heidegger aponta frequentemente para descobertas que só podem ser feitas por outras facetas do nosso ser que não a razão.

original

One of the reasons Heidegger likes the phrase "Befindlichkeit" is that it emphasizes our passivity. We find ourselves in a mood not   of our making or of our choice, and we can’t change our mood simply by deciding to do so. Sometimes we can affect it indirectly, by putting ourselves into a context that reminds us of the reasons why we should be happy instead of sad, for example. But this is pitting one mood against another, trying to get a "counter-mood" going to battle and replace the one we’re in rather than simply controlling it from above (SZ:175/136). Although we can sometimes figure out the cause of our moods, they often just happen to us for no discernible reason and can persist despite countervailing events. We cannot explain our mood entirely in terms of what happens to us because the mood we’re in plays a large role in determining how we react to these things. If I’m feeling good, I can take pretty serious problems in my stride ("Oh well, that kind of thing happens"), whereas when I’m down even a minor setback can plummet me into depression and make me abandon what I was trying to do ("Now I’ll never be able to finish this! Oh, forget the whole thing!").

Heidegger thinks that this reveals significant limits to our autonomy, to our ability to control the kind of person   we are, despite traditional philosophy’s great confidence in our ability to control our selves and our actions. This passivity goes all the way to the mere fact that we exist at all: "the mood brings Dasein before the ’that-it-is’ of its ’there’, which, as such, stares it in the face with the inexorability of an enigma" (175/136). We find ourselves in a clearing we didn’t create and which we cannot control. We didn’t choose to be born; we were, in Heidegger’s term, "thrown" into being alive at all as well as into our facticity, that is, the particular facts of our lives – when and where and to whom we were born, [54] what kind of personality we have, etc. (174/135). This fact is inescapably mysterious. Any answer we give – God created us, for example – would itself be inexplicable – why did God do this? Why is there a God at all and why did He pick that purpose and me for it? There are inescapable limits to the kinds of answers we can get to traditional philosophical questions about why we’re here and to traditional philosophical goals like autonomy, and these facts are revealed by moods, not reason. Heidegger often points out discoveries that can only be made by other facets of our being than reason. (p. 53-54)

[BRAVER  , Lee. Heidegger. Thinking of Being. London: Polity Press, 2014]


Ver online : Lee Braver