Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Zarader (2000:90-91) – o pensamento

quarta-feira 30 de outubro de 2024

Perante a concepção dominante, em que consiste então a «experiência» impensável? No caminho traçado pelo curso de 1952 [GA8  ], é balizada por duas palavras, que permitem esclarecer o radical Denken: a memória (Gedächtnis) e o reconhecimento do sentido de agradecimento (Dank). Mas tratasse aqui apenas, do quadro mais geral. Queria dentro deste quadro, restabelecer as principais determinações do pensamento segundo Heidegger, para mostrar a sua articulação.

1. O pensamento não é nem um comportamento do homem, nem uma faculdade do sujeito, que lhe permitiría virar-se para… Aquilo que desde a origem condiciona, é o Outro, aquilo que Heidegger designa de pensável, e que define como aquilo que «dá» de pensar [1].

2. Pelo facto de supor este Outro, o pensamento é estruturado, como linguagem, sob forma de acolhimento. Visto que Outro constitui o pólo activo do pensamento, uma vez que se destina a nós — e desta forma, chama-nos —, cumprir o pensamento será receber esse Outro, olhar por ele. E, se o pensável permanece tão difícil de pensar («ainda não pensamos»…), é que só nos chama escondendo-se. O pensamento é então o acolhimento de um Outro que se retira e que, através dessa retirada e, por essa retirada mesmo, reivindica-a [2].

3. Se aquilo que nos leva a pensar não é um presente nem um sendo, se só nos faz sinal através da plenitude da sua ausência, é então constantemente espiado pelo perigo do esquecimento. É precisamente pelo pensável retirar-se, que é indispensável lembrar-se dele. Pensar, será então guardar a memória. Memória que também [90] é redefinida por Heidegger, à luz daquilo que ainda era a velha palavra Gedanc, onde se estende o eco da Gemüt·, a alma recolhida sobre si. Na memória vista desta forma, não se trata de ter uma recordação determinada, mas de existir inteiramente no mundo da fidelidade [3].

4. Fidelidade para com o quê? Para aquilo que nos chama, para essa voz silenciosa do ser que fala da língua.

Razão pela qual o pensamento, que se tornou pensamento fiel (An-denken), será indissociavelmente memória do dom e cuidado com as palavras onde esse dom é apanhado. Pensar, é estar à escuta da língua para nos lembraremos do ser.

5. Visto que essa dação é que permite ao próprio pensamento na sua essência, receber o dom, é então a memoria de uma graça, ou seja reconhecimento. Reconhecimento abissal, que não permanecería nos limites de uma qualquer «proporcionalidade», visto que consiste em comemorar não um dom qualquer, mas sim a sua própria possibilidade. Pensar é dar graças a todo o momento [4].

[ZARADER  , Marlène. A Dívida Impensada. Heidegger e a Herança Hebraica. Lisboa: Instituto Piaget, 2000]


Ver online : Marlène Zarader


[1WhD, pp. 2-3, 85 (Qu’appelle-t-on…, 22-24, 136).

[2Ibid., pp. 4-6 (25-28).

[3Ibid., pp. 6-8, 92 (29-30, 145-146).

[4Ibid., pp. 93-95 (147-150).