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Lógica Formal e Lógica Transcendental

Husserl (LFLT:327-329) – A constituição operada pela consciência

§ 97. La méthode de mise a nu de la constitution opérée par la conscience dans sa signification philosophique universelle

terça-feira 12 de outubro de 2021

Excerto de Lógica Formal   e Lógica Transcendental  . trad. S. Bachelard, Presses Universitaires de France, 1984, pp. 327-329

tradução

A referência universal de tudo o que é concebível para um eu à vida da sua consciência é, sem dúvida, bem conhecida já desde Descartes   como um fato filosófico fundamental e dela se fala muito, em particular na época moderna. Mas não serve de nada filosofar por alto sobre este tema e esconder esta referência à consciência com redes de pensamento — por muito subtilmente imaginadas que sejam — em vez de penetrar os seus conteúdos concretos prodigiosos e de os tornar fecundos de maneira realmente filosófica. Aquele que filosofa deve, desde o começo, trazer à luz o que, com boas razões, sublinhamos tão fortemente e tão frequentemente: que tudo o que para o filósofo deve ser e deve ser isto ou aquilo, logo tudo o que, para ele, deve poder ter sentido e validade, tem que estar presente à sua consciência sob a forma de uma efetuação intencional própria, correspondente à singularidade deste existente, e isto por uma doação de sentido própria (como eu também dizia nas minhas Ideen…). Não se pode ficar na generalidade vazia da expressão: consciência, ou nas palavras vazias: experiência, juízo, e outras deste gênero, e abandonar rigorosamente o resto, como se não dissesse respeito à filosofia, à psicologia — àquela psicologia que partilha da cegueira perante a intencionalidade enquanto carácter essencialmente próprio da vida da consciência ou, em todo o caso, pela intencionalidade enquanto função teleológica, isto é, efetuação constitutiva. A consciência deixa-se desvendar metodicamente, de maneira que se pode «ver» diretamente na sua atividade doadora de sentido e criando sentido com modalidades de ser. Podem-se seguir as transformações seguintes: como é que o sentido objetivo (o cogitatum das cogitationes que se consideram) toma a forma de um novo sentido quando estas cogitationes trazem modificações ao conjunto das cogitationes que desempenham um papel de motivação a seu respeito? Como é que o que está já presente se formou anteriormente a partir de um sentido de base que provém de uma efetuação anterior? Se com exemplos tomados ao acaso tivermos desenvolvido fragmentos de tais explicações intencionais, reconhecemos imediatamente que não podemos esgotar a imensa tarefa que consiste em pôr a nu na sua universalidade esta vida efetuante e tornar assim compreensíveis, na unidade ôntica universal da vida cultural (e isto, finalmente, a partir das suas origens constitutivas), todas as formações de sentido da vida cultural natural, da vida cultural científica, de toda a vida cultural superior (intervindo todas estas formações nesta vida cultural enquanto «existente»).

Decerto, para tal tarefa, deveria primeiro instituir-se o método, tendo em conta que, curiosamente, a descoberta, por Brentano  , da intencionalidade nunca conduziu a que se visse nela um conjunto de efetuações que, na unidade intencional constituída que consideramos e nos seus modos de dado, estão implicadas como uma história sedimentada, história que se pode, em cada caso, pôr a descoberto com um método rigoroso. Graças a este conhecimento fundamental, toda a espécie de unidade intencional se torna o fio condutor transcendental   das «análises» constitutivas e estas próprias análises adquirem, devido a este conhecimento fundamental, um carácter absolutamente específico; não são análises no sentido habitual (análises reais), mas o pôr a descoberto implicações intencionais (progredindo por exemplo de uma experiência até ao sistema das experiências indicadas como possíveis).

Original

A aucun philosophe ne peut être épargné le chemin que nous avons tenté de dégager et qui nous conduit à des recherches épineuses. La référence universelle de tout ce qui est concevable pour un moi à la vie de sa conscience est sans doute bien connue déjà depuis Descartes comme un fait philosophique fondamental et en particulier on en parle beaucoup à l’époque moderne. Mais il ne sert à rien de philosopher de haut sur ce sujet et de cacher cette référence à la conscience par des trames de pensée — si subtilement imaginées qu’elles soient — au lieu de pénétrer ses ensembles concrets prodigieux et de les rendre féconds d’une manière réellement philosophique. Celui qui philosophe doit, dès le début, amener à la clarté ce qu’avec de bonnes raisons nous avons souligné si fortement et si souvent : que tout ce qui pour le philosophe doit être et doit être ceci ou cela, donc tout ce qui doit pouvoir avoir pour lui sens et validité, est forcé d’être présent à sa conscience sous la forme d’une effectuation intentionnelle propre, correspondant à la singularité de cet existant, et cela de par une donation de sens propre (comme je le disais aussi dans mes Ideen…). On ne peut pas en demeurer à la généralité vide de l’expression : conscience ou aux mots vides : expérience, jugement, et autres de ce genre, et à la rigueur abandonner le reste, [328] comme si cela ne relevait pas de la philosophie  , à la psychologie   — à cette psychologie qui a en partage la cécité pour l’intentionnalité en tant que caractère essentiellement propre de la vie de la conscience ou en tout cas pour l’intentionnalité en tant que fonction téléologique, c’est-à-dire effectuation constitutive. La conscience se laisse dévoiler méthodiquement, de sorte que l’on peut « voir » directement dans son activité donatrice de sens et créant le sens avec des modalités d’être. On peut suivre les transformations suivantes : comment le sens objectif (le cogitatum des cogitationes qu’on considère) prend-il la forme d’un nouveau sens quand ces cogitationes apportent des modifications à l’ensemble des cogitationes qui jouent un rôle de motivation à leur égard ? Comment ce qui est déjà présent s’est-il formé auparavant à partir d’un sens de base qui provient d’une effectuation antérieure ? Si, sur des exemples pris au hasard, on a développé des fragments de telles explicitations intentionnelles, on reconnaît aussitôt qu’on ne peut jamais faire le tour de l’immense tâche qui consiste à mettre à nu dans son universalité cette vie effectuante et par là de rendre compréhensibles, dans l’unité ontique universelle de la vie culturelle (et ce, finalement, à partir de ses origines constitutives), toutes les formations de sens de la vie culturelle naturelle, de la vie culturelle scientifique, de la vie culturelle supérieure tout entière (toutes ces formations intervenant dans cette vie culturelle en tant qu’ « existant »).

[217] Assurément pour une telle tâche on devrait d’abord instituer la méthode, attendu que d’une manière curieuse la découverte de l’intentionnalité par Brentano n’a jamais conduit à ce qu’on voie en elle un ensemble d’effectuations qui dans l’unité intentionnelle constituée que l’on considère et dans ses modes de donnée sont impliquées comme une histoire sédimentée, histoire qu’on peut, dans chaque cas, mettre à nu avec une méthode rigoureuse. Grâce à cette connaissance fondamentale, toute espèce d’unité intentionnelle devient le fil conducteur transcendantal des « analyses » constitutives et ces analyses [329] elles-mêmes acquièrent, du fait de cette connaissance fondamentale, un caractère absolument spécifique; ce ne sont pas des analyses au sens habituel (des analyses réelles) mais des mises à nu d’implications intentionnelles (en progressant par exemple d’une expérience jusqu’au système des expériences indiquées comme possibles).


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