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Auto-donation. Entretiens et conférences.

Henry (AD:93-96) – No mundo, a vida não existe

O CORPO VIVENTE

terça-feira 14 de setembro de 2021

HENRY, Michel. Auto-donation. Entretiens et conférences. Paris: Prétentaine, 2002

tradução

O problema é pensar o corpo vivente, esse corpo que nunca deixamos de fazer a prova silenciosa em nossa vida cotidiana e que pomos em obra em cada uma de nossas ações - não mais a partir do mundo e da experiência do mundo, nem a partir do corpo objetivo. O que se trata é partir não do mundo, mas da vida e se perguntar a si se, nesta vida, podemos entender como nela pode nascer algo como este corpo vivente do qual temos a experiência - e uma experiência mais certa do que a experiência do corpo objetivo. […]

Evidentemente, se queremos ir da vida ao corpo vivente, propondo um tipo de gênese deste corpo vivente no interior do qual cada um de nós nos encontramos postos, teríamos que saber previamente o que é a vida. Ora, para falar da vida, nenhuma época é mais mal situada do que a nossa. Afirmação paradoxal: não é a ciência que lida com a vida, a biologia, a que, no século XX, fez os progressos mais fulgurantes – progressos tais que puseram em questão o nosso modo de vida e levantaram o que se chama de "problemas sociais". E, no entanto, um biólogo muito famoso disse: "Não questionamos mais a vida nos dias de hoje nos laboratórios" [François Jacob]. Esta proposição eu a creio profundamente verdadeira e ela parece tal se nos a referirmos ao que chamei nesta manhã o ato proto-fundador da ciência moderna e, consequentemente, da biologia moderna, quer dizer a decisão de Galileu   de excluir do nosso conhecimento do universo material tudo o que se refere a qualidades sensíveis e, de uma maneira geral, da sensibilidade, da afetividade, da subjetividade, da vida, para não reter como constitutivos deste universo real senão suas determinações geométricas e matemáticas. A determinação geométrica ou matemática destas partículas materiais, quer dizer algoritmos. ao passo que tudo o que se depreende da subjetividade vivente seja deixado de lado por esta ciência como a condição mesma de seu desenvolvimento. Então, não surpreende que, ao final deste desenvolvimento, a biologia apenas redescubra o pressuposto de partida da modernidade, a saber, a colocação entre parênteses da vida. Para a biologia, não há vida.

Se a vida é eliminada a priori   da biologia no próprio pressuposto desta mesma ciência, onde a encontraremos? Seria no mundo? No mundo, não vemos, ao lado de coisas inanimadas, seres viventes, corpos viventes e precisamente nossa vida mais ou menos semelhante à dos animais?

Estou assumindo um segundo risco, o de formular desde o início a tese que governará toda essa análise. No mundo, a vida não existe. No mundo, a vida nunca se mostra e é também por isso que está ausente do campo da biologia, porque esta, apesar da abstração de suas metodologias, ainda busca a vida no mundo, nunca deixando de se concentrar neste fora, que é o mundo. No mundo, é verdade, vemos seres viventes, corpos viventes, mas jamais a vida. Este caráter de ser vivente é uma significação que é inerente à percepção dos corpos viventes e que desempenha um papel essencial nesta percepção. É este caráter de ser vivente, é esta significação de ser vivente que alcançamos na percepção destes corpos, jamais a vida. É precisamente porque nunca atingimos a vida em ela mesma que só a atingimos na forma de significação irreal, quer dizer de uma irrealidade. Esta significação pode muito bem investir o ser vivente e determinar por inteiro a percepção que dele temos, de tal maneira que estes olhos, como diz Husserl  , são percebidos como "olhos que veem", estas mãos são percebidas como "mãos que tocam". Mas estas significações permanecem em sua irrealidade de princípio, não fazem precisamente senão significar a vida sem poder a dar em ela mesma, em pessoa, como dizem os fenomenologistas.

Original

Le problème est de penser le corps vivant, ce corps dont nous ne cessons de faire l’épreuve muette dans notre vie quotidienne et que nous mettons en œuvre dans chacune de nos actions - non plus à partir du monde et de l’expérience du monde, ni à partir du corps objectif. Ce dont il s’agit, c’est de partir non du monde mais de la vie et de se demander si, dans cette vie, on peut comprendre comment en elle peut naître quelque chose comme ce corps vivant dont nous avons l’expérience - et une expérience plus certaine que l’expérience du corps objectif. C’est donc cette seconde voie que je tente d’élucider ce soir.

Évidemment, si l’on veut aller de la vie au corps vivant en proposant une sorte de genèse de ce corps vivant à l’intérieur duquel chacun de nous se trouve placé, il faudrait savoir au préalable ce qu’est la vie. Or, pour parler de la vie, aucune époque n’est plus mal placée que la nôtre. Affirmation paradoxale : la science qui s’occupe de la vie, la biologie  , n’est-elle pas celle qui, au XXe siècle, a fait les progrès les plus fulgurants - progrès tels qu’ils ont mis en cause notre mode de vie et posé [93] ce qu’on appelle des « problèmes de société ». Et pourtant, un biologiste très célèbre a déclaré : « On n’interroge plus la vie aujourd’hui dans les laboratoires » (8). Cette proposition, je la crois profondément vraie et elle apparaît telle si on la réfère à ce que j’ai appelé ce matin l’acte proto-fondateur de la science moderne et, par conséquent, de la biologie moderne, c’est-à-dire à la décision de Galilée d’exclure de notre connaissance de l’univers matériel tout ce qui relève des qualités sensibles et, d’une manière générale, de la sensibilité, de l’affectivité, de la subjectivité, de la vie, pour ne retenir comme constitutives de cet univers réel que ses déterminations géométriques et mathématiques. La détermination géométrique ou mathématique de ces particules matérielles, c’est-à-dire des algorithmes. Tandis que tout ce qui relève de la subjectivité vivante se trouve mis de côté par cette science comme la condition même de son développement. Alors, il n’est pas étonnant qu’au terme de ce développement la biologie ne fasse que retrouver le présupposé de départ de la modernité, à savoir la mise entre parenthèses de la vie. Pour la biologie il n’y a pas de vie.

Si la vie se trouve éliminée a priori de la biologie dans le présupposé même de cette science, où la trouvons-nous ? Serait-ce dans le monde ? Dans le monde, ne voyons-nous pas, à côté des choses inanimées, des êtres vivants, des corps vivants et précisément notre vie plus ou moins semblable à celle des animaux ?

Je prends un second risque, celui de formuler d’entrée de jeu la thèse qui commandera toute cette analyse. Dans le monde, la vie n’existe pas. Dans le monde, la vie ne se montre jamais et c’est d’ailleurs la raison pour laquelle elle est absente du champ de la biologie, parce que celle-ci, en dépit de l’abstraction de ses méthodologies, cherche encore la vie dans le monde, ne cessant de porter son regard dans cet au-dehors qu’est le monde. Dans le monde, il est vrai, nous voyons des êtres vivants, des corps vivants, mais jamais la vie. Ce caractère d’être vivant est une signification qui est inhérente à la perception des corps vivants et qui joue un rôle essentiel dans cette perception. C’est ce caractère d’être vivant, c’est cette signification d’être vivant que nous atteignons dans la perception de ces [94] corps, jamais la vie. C’est précisément parce que nous n’atteignons jamais la vie en elle-même que nous ne l’atteignons que sous la forme d’une signification irréelle, c’est-à-dire d’une irréalité. Cette signification peut bien investir l’être vivant et déterminer de fond en comble la perception que nous en avons, de telle façon que ces yeux, comme le dit Husserl, sont perçus comme « yeux qui voient », ces mains sont perçues comme « mains qui touchent ». Mais de telles significations demeurent dans leur irréalité de principe, elles ne font précisément que signifier la vie sans pouvoir la donner en elle-même, en personne, comme disent les phénoménologues.


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