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Gadamer (VM): verdade hermenêutica

quarta-feira 24 de janeiro de 2024, por Cardoso de Castro

Essa recordação referente a Platão torna-se de novo significativa para o problema da verdade. Na análise da obra de arte, tínhamos procurado demonstrar que o representar-se deve ser considerado como o verdadeiro ser daquela. Com esse fim, havíamos acrescentado o conceito do jogo, o qual já nos projetou a nexos mais gerais: pois tínhamos visto que a verdade do que se representa no jogo não é "de se crer" ou "não se crer", para além da participação no acontecer lúdico. No âmbito estético, isso se entende por si mesmo. Inclusive quando o poeta é honrado como um vidente, isso não quer dizer que reconheçamos no seu poema uma verdadeira profecia como, por exemplo, nos cantos de Hölderlin sobre o retorno dos deuses. O poeta é 492] um vidente porque representa por si mesmo o que é, o que foi e o que será, e testemunha por si mesmo o que anuncia. É certo que a expressão poética leva em si uma certa ambiguidade, como aquela dos oráculos. Mas precisamente nisso se estriba sua verdade hermenêutica. Quem considera que isso é uma falta de vinculatividade estética, que passaria ao largo da seriedade do existencial, não se dá conta de até que ponto a finitude do homem é fundamental para a experiência hermenêutica do mundo. A ambiguidade do oráculo não é o seu ponto fraco, mas justamente sua força. E igualmente atira no escuro aquele que examinar se Hölderlin ou Rilke   acreditavam realmente em seus deuses ou em seus anjos. 2627 VERDADE E MÉTODO TERCEIRA PARTE 3.

Em um empreendimento como este é questão de ordem levar-se em conta a ressonância que o projeto pessoal encontrou junto à crítica. Também nesse caso, não podemos negligenciar que o fato de a história efeitual pertencer à coisa ela mesma é uma verdade hermenêutica. Nesse sentido há que se remeter para o prefácio à 2a edição e o posfácio à 3a e 4a edições. Olhando retrospectivamente, hoje, parece-me que não se alcançou plenamente a consistência de caráter teorético desejada, pelo menos num ponto. Não fica suficientemente claro como se harmonizam os dois projetos fundamentais que contrapõem o conceito de jogo ao princípio subjetivista que determina o pensamento da modernidade. Por um lado, encontra-se a orientação no jogo da arte, e ademais, a fundamentação da linguagem no diálogo, que trata do jogo da linguagem. Com isso coloca-se a questão mais ampla e decisiva: até que ponto consegui tornar visível a dimensão hermenêutica como um além da autoconsciência, e isto quer dizer, não suspender mas conservar a alteridade do outro na compreensão? Tive, assim, que recuperar o conceito de jogo em minha perspectiva ontológica, ampliada ao caráter universal da linguagem. Tratava-se de vincular estreitamente o jogo da linguagem com o jogo da arte, no qual havia vislumbrado como o caso hermenêutico por excelência. Era natural agora pensar a nossa experiência de mundo em seu aspecto da linguagem, que é universal, sob o modelo do jogo. Já no prefácio à 2 — edição de meu livro assim como nas páginas conclusivas de minha contribuição "Die phänomenologische Bewegung  " (O movimento fenomenológico) mostrei a convergência das minhas ideias concebidas nos anos trinta com o conceito de jogo do Wittgenstein   tardio. VERDADE E MÉTODO II Introdução 1.

O que está em jogo aqui é uma verdade hermenêutica, relacionada com o conceito de compreensão prévia. Mesmo a investigação da história da hermenêutica encontra-se sob a lei geral hermenêutica da compreensão prévia. Inicialmente, vamos mostrar isso em três exemplos. VERDADE E MÉTODO II OUTROS 20.

Numa recusa expressa à posição extremista de Benedetto Croce, Betti procura o meio-termo entre o elemento objetivo e o subjetivo da compreensão. Formula um cânon completo dos princípios hermenêuticos, e seu ponto culminante é a autonomia de sentido do texto. Em conformidade com essa autonomia, há que se apreender o sentido, ou seja, a opinião do autor, a partir do próprio texto. Mas com a mesma decisão, ele acentua o princípio da atualidade da compreensão, da adequação do mesmo ao objeto, ou seja, percebe que a vinculação do intérprete com sua própria posição representa um momento integrante da verdade hermenêutica. VERDADE E MÉTODO II ANEXOS 27.