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Gadamer (VM): objetividade do conhecimento

quarta-feira 24 de janeiro de 2024, por Cardoso de Castro

Seja como for, parece claro que Dilthey   não vê na vinculação do homem finito e histórico ao seu ponto de partida um prejuízo fundamental da possibilidade do conhecimento espiritual-científico. A consciência histórica teria de realizar em si mesma uma tal superação da própria relatividade, que, com isso, torne possível a objetividade do conhecimento espiritual-científico. E tem-se de indagar como se deve justificar essa pretensão, sem implicar um conceito do saber absoluto, filosófico, para além de toda a consciência histórica. Qual é a distinção da consciência histórica — face a todas as demais formas de consciência da história — , para que seus próprios condicionamentos não devam suspender a sua pretensão fundamental de alcançar um conhecimento objetivo? VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 1.

Algo assim poderia também ser encontrado em Droysen, mas em Dilthey possui um matiz próprio. Tanto na direção da contemplação como na da reflexão prática surge, segundo Dilthey, a mesma tendência da vida: a "aspiração à estabilidade". A partir disso compreende-se que Dilthey pudesse considerar a objetividade do conhecimento científico e da auto-reflexão filosófica como a realização suprema da tendência natural da vida. O que guia a reflexão de Dilthey não é uma adaptação externa da metodologia das ciências do espírito aos procedimentos das ciências da natureza, mas o fato de que detecta em ambas uma comunidade genuína. A essência do método experimental é a elevação acima da casualidade subjetiva da observação, e com ajuda disso dá-se o conhecimento da regularidade da natureza. Assim, as ciências do espírito também procuram elevar-se metodicamente acima da casualidade subjetiva do próprio ponto de partida e da tradição que lhes é acessível, alcançando assim a objetividade do conhecimento histórico. A própria auto-reflexão filosófica encaminha-se na mesma direção, na medida em que "se torna objetiva para si mesma como fato humano e histórico" e renuncia à pretensão de alcançar um conhecimento puro a partir de conceitos. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 1.

Nessa direção já aponta o papel que desempenha o conceito da dialética na filosofia do século XIX. É um testemunho da continuidade do nexo de problemas desde sua origem grega. Para nós que estamos emaranhados nas aporias do subjetivismo, os gregos nos levam uma certa vantagem no que se refere a conceber os poderes supra-subjetivos que dominam a história. Eles não procurarão fundamentar a objetividade do conhecimento a partir da subjetividade e para ela. Ao contrário, seu pensamento considerou-se sempre, desde o princípio, como um momento do próprio ser. Nele viu Parmênides   o guia mais importante para o caminho rumo à verdade do ser. A dialética, esse antagonista do logos  , não era para os gregos, como já dissemos, um movimento que o pensamento leva a cabo, mas o movimento da própria coisa que aquele percebe. Que isso soe a Hegel   não implica uma falsa modernização, mas atesta um nexo histórico. Na situação do novo pensamento, tal como o caracterizamos, Hegel assume conscientemente o modelo da dialética grega . Por isso, aquele que queira ir à escola dos gregos, já terá sempre passado pela escola de Hegel. Tanto sua dialética das determinações do pensamento, como a das formas do saber, refazem, numa realização expressa, a mediação total de pensamento e ser, que sempre foi o elemento natural do pensamento grego. Se nossa teoria hermenêutica busca o reconhecimento do entrelaçamento do acontecer e compreender, terá de retroceder não somente até Hegel, mas também até Parmênides. VERDADE E MÉTODO TERCEIRA PARTE 3.