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Gadamer (VM): consciência e objeto

quarta-feira 24 de janeiro de 2024, por Cardoso de Castro

Esses conceitos, diferentemente das categorias do conhecimento da natureza, são conceitos vitais. Pois a última pressuposição para o conhecimento do mundo histórico, no qual a identidade de consciência e objeto — esse postulado especulativo do idealismo — ainda representa uma realidade demonstravel [227] é, em Dilthey  , a vivência. Aqui existe certeza imediata. Pois o que é vivência não é divisado num ato, por exemplo, o dar-se conta de algo, e num conteúdo, aquilo de que alguém se dá conta. Pelo contrário, trata-se de um ter presente já não dissociável. Mesmo a versão de que na vivência algo que é possuído, ainda distingue demais. Dilthey persegue agora como se configura um nexo, a partir desse elemento do mundo espiritual, que é imediatamente certo, e como é possível um conhecimento de tal nexo. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 1.

A marca distintiva da consciência histórica não pode consistir em ser realmente "saber absoluto", no sentido hegeliano, isto é, em que reúna numa autoconsciência presente a totalidade daquilo que o espírito veio a ser. Pois a concepção histórica do mundo discute precisamente a pretensão da consciência filosófica de conter em si a verdade inteira da história do espírito. Essa é, antes, a razão pela qual fazia falta a experiência histórica: que a consciência humana não é um intelecto-infinito para o qual tudo seja simultâneo e presente por igual. A identidade absoluta de consciência e objeto é, por princípio, inacessível à consciência histórica e finita. Ela permanece enredada no nexo de efeitos da história. E então em que se apoia sua [239] distinção de elevar-se, apesar disso sobre si mesma e tornar-se assim capaz de um conhecimento histórico objetivo? VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 1.

Evidentemente que para Hegel   o caminho da experiência da consciência tem que conduzir necessariamente a um saber-se a si mesmo que já não tem nada diferente nem estranho fora de si. Para ele a consumação da experiência é a "ciência", a certeza de si mesmo no saber. O padrão a partir do qual pensa a experiência é, portanto, o do saber-se. Por isso a dialética da experiência tem de culminar na superação de toda experiência, que se alcança no saber absoluto, isto é, na consumada identidade de consciência e objeto. A partir daí poderemos compreender por que não faz justiça à consciência hermenêutica a aplicação que Hegel faz à história, quando considera que esta é concebida na autoconsciência absoluta da filosofia. A essência da experiência é pensada aqui, desde o princípio, a partir de algo no qual a experiência já está superada. Pois a própria experiência jamais pode ser ciência. Está em uma oposição insuperável com o saber e com aquele ensinamento que flui de um saber geral teórico ou técnico. A verdade da experiência contém sempre a referência a novas experiências. Nesse sentido a pessoa a que chamamos experimentada não é somente alguém que se fez o que é através das experiências, mas também alguém que está aberto a experiências. A consumação de sua experiência, o ser pleno   daquele a quem chamamos experimentado, não consiste em ser alguém que já conhece tudo, e que de tudo sabe mais que ninguém. Pelo contrário, o homem experimentado é sempre o mais radicalmente não dogmático, que, precisamente por ter feito tantas experiências e aprendido graças a tanta experiência, está particularmente capacitado para voltar a fazer experiências e delas aprender. A dialética da experiência tem sua própria consumação não num saber concludente, mas nessa abertura à experiência que é posta em funcionamento pela própria experiência. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 2.