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Richir (1996:255) – pensamento mítico é politemático
sexta-feira 15 de novembro de 2024
Retomamos a distinção de Fink entre operativo e temático. Poderíamos dizer, a título de antecipação, que em contraste com o pensamento hegeliano, que seria de alguma forma “monotemático” e abstrato (metafísico), procedendo com codificações e recodificações sucessivas da mesma tautologia simbólica do pensamento e do ser, provocando um curto-circuito no hiato inicial, o pensamento mítico seria “politemático” de certa forma, mas em uma desarticulação tal de qualquer tema único e unívoco que haveria algo como uma “dominância operativa” nele, com o mito ligando uma série de operações, cada vez com o mesmo hiato entre a origem e o início. Dessa forma, haveria no mito, que seria narrativo por essa razão, uma contingência irredutível de codificações (em deuses, heróis, episódios, metamorfoses) que poderiam, em princípio, como “golpes de força” operativos da própria gênese, ser vislumbrados pela época fenomenológica hiperbólica de tudo aquilo que, de nossa parte ou para nós, seria um “golpe de força” de nosso pensamento, ou seja, uma tentativa de encontrar, na narrativa, temas que nos são familiares. Na análise fenomenológica das narrativas míticas, mítico-mitológicas e mitológicas, teríamos que distinguir cuidadosamente o enredo (simbólico) do tema: pois não haveria a priori um único tema nesses pensamentos, mas “temas” que estariam fragmentados e que, se os reuníssemos como um só, fariam do mito a alegoria de um pensamento que já é nosso e que, na maioria das vezes, já está expresso na linguagem filosófica. Seria apenas se os tomássemos como fragmentados, ou seja, em sua repetição contingente, trazidos à coesão pelo enredo da narrativa, que o mito apareceria, de acordo com a exigência de Schelling , em sua natureza tautégorica — sendo a tautégoria apenas a do hiato inicial entre a origem e o início que é recodificado na repetição. Nesse sentido, também se poderia dizer que R. Wagner foi um “mitologista” notável, pois ele conseguiu, ao mesmo tempo, desarticular qualquer tema unificador em uma extraordinária pluralidade de leitmotifs, inscrevê-los em um único tecido harmônico coerente — evocando constantemente uma espécie de imensa frase musical ausente — e contar uma história (mythos) em um enredo simbólico implacável em sua “lógica”. Ao mesmo tempo, ele teria trazido à tona o que sempre foi, na música, sua “dominância operativa”, sua capacidade de planejar “eventos” musicais.
[RICHIR , Marc. L’Expérience du penser. Phénoménologie, philosophie, mythologie. Grenoble: Jérôme Millon, 1996]
Ver online : Marc Richir