Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Braver (2014:51) – clareira [Lichtung]

domingo 17 de dezembro de 2017

[…] a clareira, vem das adoradas caminhadas de Heidegger nos bosques, especialmente na Floresta Negra, onde ele passava muito tempo. Quando se caminha por um bosque denso, as árvores se comprimem, bloqueando grande parte da luz, até que, de repente, chega-se a uma clareira onde as árvores são esparsas, a luz entra e tudo é claro e aberto. A clareira (“Lichtung”) é onde há luz (“Licht”) e uma espécie de leveza arejada. Isso, de acordo com Heidegger, é o que nós somos. Em todo esse universo inimaginavelmente enorme, até onde sabemos, todos os tipos de coisas cataclísmicas e banais estão acontecendo o tempo todo, mas sem serem vistas, ouvidas ou testemunhadas. Aqui, neste pequeno canto do universo, por este breve momento, uma clareira se abriu na floresta escura do real. Estamos aqui e somos o lugar em que as coisas podem aparecer. Os entes se manifestam ao aparecerem para nós; testemunhá-los permite que eles venham à luz. Somos o ato da realidade de se tornar consciente de si mesma, um privilégio verdadeiramente impressionante e humilde, embora o ignoremos e o tomemos como garantido ao fazer compras no supermercado e assistir à TV.

Heidegger quer nos conscientizar desse fato mais básico possível de nossa consciência. Em determinado momento, ele chega a sugerir que deixar o ser se mostrar é o único para-quê que todo Dasein compartilha simplesmente por ser Dasein (186/146), uma ideia que ele proporá explicitamente em seu discurso posterior sobre nosso papel como pastor ou cuidador do ser, como veremos. Entretanto, ele não está apenas observando esse fato; ele quer explorá-lo e entendê-lo. Como é a nossa consciência? Que estruturas ela tem? O que faz com que nossa clareira seja do jeito que é? Essa é a versão de Heidegger do exame de Kant   sobre as maneiras pelas quais a mente, de certa forma, “cria” a realidade fenomenal, dando forma à entrada sensorial que recebe de fora, e a análise de Husserl   sobre a constituição da experiência do sujeito transcendental. Entretanto, enquanto Kant   achava que as formas e os conceitos específicos incorporados ao sujeito transcendental são, em última análise, inexplicáveis, uma falta que muitos idealistas alemães o acusaram, Heidegger quer descobrir por que nosso mundo é como é e não de outra forma.

[BRAVER  , Lee. Heidegger. Thinking of Being. London: Polity Press, 2014]


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