Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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GA55 (7-9): Mesmo aqui, os deuses também estão presentes

quarta-feira 31 de janeiro de 2018

Schuback

Diz-se (numa palavra) que Heráclito   assim teria respondido aos estranhos vindos na intenção de observá-lo. Ao chegarem, viram-no aquecendo-se junto ao forno. Ali permaneceram, de pé, (impressionados sobretudo porque) ele os (ainda hesitantes) encorajou a entrar, pronunciando as seguintes palavras: ‘Mesmo aqui, os deuses também estão presentes.’” [1]

Na curiosidade impertinente frente ao pensador e seu abrigo, as pessoas viram-se decepcionadas e desorientadas. Esperavam encontrá-lo numa situação marcada pelo caráter de exceção, raridade [22] e excitação, por oposição à vida cotidiana. Ao visitá-lo esperam encontrar coisas que, ao menos por um certo tempo, ofereçam assunto e matéria para uma prosa despreocupada. Os que desejam visitar o pensador esperam encontrá-lo no momento exato em que está mergulhado nas profundezas, todo “pensativo” —, não para que eles mesmos possam ser tocados pelo pensamento, mas só para poder dizer que viram e ouviram aquele que é considerado um pensador.

Em vez disso, os curiosos encontram o pensador junto ao forno. Trata-se de um lugar tipicamente cotidiano e insignificante. É ali, no entanto, que se faz o pão. Mas Heráclito não estava junto ao forno nem mesmo para fazer pão. Estava ali só para se aquecer. Nesse lugar cotidiano ele mostra, além do mais, toda a indigência de sua vida. Contemplar um pensador sentindo frio não é muito “interessante”. Com o olhar decepcionado, os curiosos perderam a vontade de se aproximar um pouco mais. O que estavam fazendo ali? Qualquer um pode, a qualquer momento, encontrar na sua própria casa essa necessidade cotidiana e sem graça de aconchegar-se ao forno quando se sente frio. Para que então visitar um pensador? Heráclito lê nas suas fisionomias a curiosidade decepcionada. Reconhece que — para as pessoas — basta sentir a falta de uma sensação esperada para que desistam e partam. Por isso as encoraja, convidando-as a entrar com as palavras: είναι   γάρ και ενταύθα θεούς…: “mesmo aqui, os deuses também estão presentes”.

Sua palavra lança outra luz sobre seu abrigo e ocupação. A “estória” não chega a contar se os visitantes compreenderam ou não as palavras, nem se perceberam tudo sob essa outra luz. O fato, porém, de se ter contado e transmitido até hoje a “estória” significa que ela surge da atmosfera própria do pensamento desse pensador, e por isso a designa, κα’ι ενταύθα — mesmo aqui junto ao forno, mesmo neste lugar cotidiano e comum onde cada coisa e situação, cada ato e pensamento se oferecem de maneira confiante, familiar e ordinária, “mesmo aqui”, nesta dimensão do ordinário, είναι θεούσ, os deuses também estão presentes, θεοί   são os θεάοντες και δαίμονες. A essência dos deuses, tal como [23] apareceu para os gregos, é precisamente esse aparecimento, entendido como um olhar a tal ponto compenetrado no ordinário que, atravessando-o e perpassando-o, é o próprio extraordinário o que se expõe na dimensão do ordinário. Aqui também, diz Heráclito, junto ao forno em que me aqueço, vigora o extraordinário no ordinário, και ενταύθα — “mesmo aqui”, diz o pensador, e o diz no sentido próprio dos visitantes, segundo o modo e a mentalidade próprios das pessoas. Na suposição, porém, de que a palavra de um pensador diz o que diz numa forma diferente da linguagem cotidiana, abrigando necessariamente em seu discurso um sentido diverso do corrente, esta palavra de Heráclito, quando considerada como palavra de pensamento, oferece uma curiosa conclusão.

Quando o pensador diz: καί ενταύθα (“mesmo aqui”) έν τώι ίπνώι (“junto ao forno”) vigora o extraordinário, quer dizer, na verdade: só aqui há vigência dos deuses. Onde realmente? No inaparente do cotidiano. Não é preciso evitar o conhecido e o ordinário e perseguir o extravagante, o excitante e o estimulante na esperança ilusória de, assim, encontrar o extraordinário. Vocês devem simplesmente permanecer em seu cotidiano e ordinário, como eu aqui, que me abrigo e aqueço junto ao forno. Não será isso que faço, e esse lugar em que me aconchego, já suficientemente rico em sinais? O forno presenteia o pão. Como pode o homem viver sem a dádiva do pão? Essa dádiva do forno é o sinal indicador do que são os θεοί, os deuses. São οβδαίοντες, os que se oferecem como extraordinário na intimidade do ordinário. Aqueço-me ao forno permanecendo, assim, na proximidade do fogo — em grego πυρ —, que também significa luz e ardor. Vocês me encontram aqui numa relação com o fogo, somente onde é possível que o raio luminoso do olhar compenetrado esteja em unidade com o raio do calor, permitindo que “desperte” para o aparecimento aquilo que no frio seria, ao contrário, vítima da rigidez do não-ser. (p. 22-24)

Original

»Von Heraklit erzählt man (ein Wort  ), das er zu den Fremden gesagt habe, die zu ihm vorgelangen wollten. Herzukommend sahen sie ihn, wie er sich in einem Backofen wärmte. Da blieben sie stehen   (überrascht und dies vor allem deshalb), weil er nämlich ihnen (den Zaudernden auch noch) Mut zusprach und sie hereinkommen hieß mit dem Wort: »Auch hier nämlich sind anwesend Götter  «.«

Die Menge ist in ihrer neugierigen Zudringlichkeit zum Denker   und zu seinem Aufenthalt   enttäuscht und ratlos. Sie glaubt, den Denker in Verhältnissen antreffen zu dürfen, die [7] gegen das sonstige Dahinleben   der Menschen überall die Züge der Ausnahme und des Seltenen und daher Aufregenden tragen. Die Menge hofft, durch ihren Besuch bei   dem Denker Sachen zu finden, die — für eine gewisse Zeit   wenigstens - den Stoff lieferten zu einem unterhaltenden Gerede  . Die, die den Denker besuchen wollen  , hoffen, ihn vielleicht gerade in dem Augenblick   zu sehen  , da er in den Tiefsinn versunken »denkt«, nicht   etwa, um von dem Denken   betroffen zu werden  , sondern lediglich deshalb, damit man sagen   kann, einen gesehen und gehört zu   haben  , von dem man wiederum nur sagt, daß   er ein Denker sei.

Statt dessen finden die Neugierigen den Denker in einem Backofen. Das ist ein recht alltäglicher und geringfügiger Ort  . Allerdings wird hier das Brot gebacken. Aber Heraklit ist ja im Backofen nicht einmal mit dem Backen beschäftigt, sondern er hält sich hier nur auf  , um sich zu wärmen. So verrät er auch noch an diesem alltäglichen Ort die ganze   Dürftigkeit seines Lebens. Der Anblick eines frierenden Denkers bietet wenig »Interessantest Die Neugierigen haben denn auch bei diesem enttäuschenden Anblick sogleich die Lust   verloren, noch näher zu kommen  . Was sollen   sie hier? Diese alltägliche und reizlose Bedürftigkeit, daß einer friert und am Ofen steht, kann jedermann   jederzeit bei sich zu Hause finden. Wozu   sollen sie also einen Denker auf suchen  ? Heraklit liest die enttäuschte Neugier   in den Gesichtem. Er erkennt, daß bei der Menge schon das Ausbleiben einer erwarteten Sensation hinreicht, um die Angekommenen zur Umkehr zu drängen  . Deshalb spricht er ihnen Mut zu und fordert sie eigens auf, doch einzutreten, mit den Worten: είναι γάρ καί ενταύθα θεούς … »auch hier nämlich sind anwesend Götter«.

Dieses Wort stellt den Aufenthaltsort des Denkers und seine Beschäftigung in ein anderes Licht  . Ob die Besucher sogleich und ob sie überhaupt dies Wort verstanden und alles in diesem anderen   Licht anders gesehen haben, sagt diese Geschichte   nicht. Aber daß diese Geschichte erzählt worden und noch uns [8] Heutigen überliefert   ist, beruht darauf, daß diese Geschichte aus der Atmosphäre des Denkens dieses Denkers stammt und sie also bezeichnet, καί ενταύθα - auch hier im Backofen, an diesem alltäglichen und gewöhnlichen Ort, wo jedes Ding   und jeder Umstand, jedes Tun   und Denken durch und durch vertraut, geläufig und geheuer ist, »auch da«, in diesem Umkreis   des Geheueren είναι θεούς, ist es so, daß »anwesen   Götter«, θεοί sind die θεάοντες καί δαίμονες. Das Wesen der Götter, die den Griechen erschienen, ist eben dieses Erscheinen   im Sinne des Hereinblickens in das Geheuere, so zwar, daß das in das Geheuere herein und so aus ihm heraus Blickende das Ungeheuere ist, das sich in dem Umkreis des Geheueren dargibt. Auch hier, sagt Heraklit, im Backofen, wo ich   mich wärme, waltet die Anwesung des Ungeheueren in das Geheuere, καί ενταύθα - »auch da« — sagt der Denker und spricht damit noch auf den Sinn   der Besucher ein und spricht so in gewisser Weise   nach dem Sinn und nach der Gesinnung der Menge. Gesetzt aber, das Wort eines Denkers sagt, was es sagt, in anderer Weise als die Sprache des Alltags, so daß in jedem geläufigen Vordersinn seiner Rede notwendig schon ein Hintersinn sich verbirgt, dann   gibt dieses Wort Heraklits, wenn wir es als denkerisches Wort vernehmen  , einen seltsamen Aufschluß.

Wenn der Denker sagt: καί ενταύθα — »auch da«, εν τώι ίπνώι - »im Backofen«, west das Ungeheuere an, dann will er in Wahrheit   sagen: nur da ist Anwesung der Götter. Wo nämlich? Im unscheinbaren Alltäglichen. Ihr braucht dem Vertrauten und Geheueren nicht auszuweichen und dem Ausgefallenen, dem Aufregenden und Aufreizenden nachzujagen in der trüglichen Hoffnung  , so dem Ungeheueren zu begegnen  . Ihr sollt euch nur an euer Tägliches und Geheueres halten, wie ich hier, der im Backofen sich aufhält und sich wärmt. Ist das, was ich tue und wobei ich mich aufhalte, nicht genug erfüllt mit Zeichen  ? Der Backofen schenkt das Brot. Wie aber soll der Mensch   recht leben ohne die Gabe des Brotes? Diese Gabe des Backofens gibt das Zeichen für das, was die θεοί, die Götter, [9] sind. Sie sind die δαίοντες, die im Geheueren Sichdargebenden als die Ungeheueren. Ich wärme midi am Ofen und bleibe so in der Nähe   des Feuers, griechisch πυρ —, was aber zugleich bedeutet: Licht und Glut. Ihr findet mich hier im Bezug   zum Feuer  , worin allein der Strahl des Lichtblickes der Hereinblickenden möglich ist in einem mit dem Strahl der Wärme, die »aufgehen  « läßt in das Erscheinen, was in der Kälte sonst der Starre des Nichtseins zum Opfer fällt. (p. 7-9)


Ver online : GOTT


[1Aristóteles. De part. anim., A5 645 a 17 ff.