NT: Entscheidung = Entschluss: décision, act concret de l’ (ETEM)
(Sich) entscheiden, “decidir, resolver”, vem (assim como “decidir”) de scheiden que significa “cortar, separar, apartar”. Ent- fortalece o sentido de “separado”. Heidegger liga, por conseguinte, entscheiden a Entweder-oder, ou-ou” (GA65, 90, 101), e a separar e distinguir (Unterscheidung): Das Geschiedene ist so entschieden geschieden, dass Uberhaupt kein gemeinsamer Bezirk der Unterscheidung obwalten kann, “Os termos assim distinguidos são apartados por uma incisão tão decisiva que nenhuma esfera comum da distinção pode explicar com precisão tal afastamento” (GA65, 177. Cf. GA6T1, 476). Tanto Entschlossenheit quanto Entschiedenheit, “deliberação”, estão associadas a Augenblick, lit. “um piscar de olhos”, portanto o “instante (de visão)”. Kierkegaard usava o seu equivalente dinamarquês, øjeblick, sobretudo em O conceito de angústia (1844), para o ponto de contato entre o tempo e a eternidade, o momento de decisão entre a verdade e a ilusão, no qual o crente torna-se contemporâneo de Cristo (cf. SZ, 338n.). Em SZ ele é “o presente (Gegenwart) que está contido na temporalidade autêntica e que é, portanto, autêntico. (…) Significa o arroubo resoluto de Dasein — mas um arroubo contido na de-cisão — que se direciona para as possibilidades e circunstâncias da sua preocupação que vem ao encontro na situação” (SZ, 338). A transformação criativa do tornar-se caótico em entes estáveis, postulada por Nietzsche, envolve “encontrar-se no instante da resolução (im Augenblick der Entscheidung), onde o que quer que o preceda e o acompanhe se eleva à tarefa projetada, sendo assim preservado” (GA6T2, 466s). A decisão resoluta transforma, ainda que preserve o passado (cf. o ponto de vista de Scheler, para quem a questão do arrependimento é alterar o significado de um fato passado.) (DH:33-34)
Depois de SZ, palavras do tipo de entscheiden tendem a suplantar as palavras do tipo entschliessen. Em SZ, o que importa é a Entschlossenheit de Dasein, não a escolha particular que ele faz. À medida que a história e o ser tornam-se mais centrais, Heidegger fica menos interessado na condição do homem ou Dasein individual do que naquilo que fica decidido acerca do ser e dos entes. Ele convenientemente (reinterpreta SZ: é fácil “interpretar mal SZ deste modo, ‘existenciariamente’— ‘antropologicamente’, ver as conexões entre Entschlossenheit — verdade — Dasein em função da de-cisão (Entschliessung) no sentido moral, e não o oposto: em função do solo prevalecente de Da-sein, conceber a verdade como abertura e Ent-schlossenheit como o espaço de temporalização e feitura (die zeitigende Einräumung) do tempo-jogo-lugar (Zeit-Spiel-Raumes) do ser.” Se nos concentramos na questão acerca do sentido do ser, então “o que é aqui chamado de de-cisão (Ent-scheidung) move-se para o próprio âmago da essência do ser, não possuindo, assim, nada em comum com o que chamamos de fazer uma escolha e coisas afins. Significa a própria divergência que separa e, ao separar, admite pela primeira vez a atuação, no afastamento, do acontecimento-apropriador (Er-eignung) do aberto, entendido como a clareira para o que oculta a si mesmo e permanece não-decidido (Un-entschiedene), o pertencimento do homem ao ser como aquele que fundamenta a sua verdade e a indicação do ser para o tempo do último deus” (GA65, 87s). Entscheidung é agora usada de três modos: 1. A separação envolvida no acontecimento do ser, separação entre terra, mundo, homens e deuses, e entre o ser e os entes (GA65, 479). 2. Decisões significativas acerca da vida humana que determinam se um novo começo, um novo acontecimento do ser, ocorrerá e como ele será, decisões tais como “se o homem continuará como ‘sujeito’ ou se ele fundamenta o Da-sein (…) se a arte é uma organização de experiências ou o pôr-se à obra da verdade”, e assim por diante (GA65, 90s). 3. Decisões humanas comuns, individuais ou coletivas, sobre casar-se, ir à guerra etc. Decisões do tipo 1 não são ações humanas e não estão preocupadas com um “ou-ou” (GA65, 84ss). São as próprias divisões do ser em regiões separadas. Criam um espaço ou “tempo-(jogo)-espaço”, para decisões do tipo 3 (GA65, 187, 234, 405, 464). Não podem ser ações humanas por criarem, ou transformarem inteiramente, seres humanos. Decisões do tipo 2 são intermediárias entre 1 e 3. Como 3, têm relação com um “ou-ou”; como 1, têm relação com um “começo” (GA65, 90). Ações humanas e decisões do tipo 3 desempenham um papel, mas elas também não são ações humanas comuns; a própria natureza do homem depende de como a decisão é tomada. Em SZ Entschlossenheit pode ser mal interpretada como pertencendo às decisões do tipo 3. Mais tarde, ela pertence mais às decisões do tipo 2 e portanto do tipo 1; ela é a abertura menos do homem ou Dasein do que do ser; é, em última instância, obra do próprio ser (GA65, 101, 283, 397s). é menos como sair de uma festa para escrever um ensaio do que como sofrer uma queda no caminho de Damasco. (DH:34)