LDMH: Dasein em Ser e Tempo

A primeira definição de Dasein em Ser e Tempo figura na página 7: “Este ente que somos cada vez nós mesmos e que tem, entre outras possibilidades de ser, aquela de questionar, nós lhe damos lugar em nossa terminologia sob o nome de Dasein”.

Aqui, Dasein designa simplesmente o ente que é o homem. Mas desde a página 12, Dasein é caracterizado como “pura expressão de ser”, no sentido que, como diz Heidegger página 25: o Dasein é o “ser do ser humano”. Apesar desta hesitação, em Ser e Tempo, o sentido verdadeiro e novo de Dasein não é homem, mas ser do homem. Todavia, a ambiguidade não está ainda realmente levantada pois a expressão ser do homem é ela mesma problemática na medida que Heidegger não a entende no sentido corrente. No sentido estrito, Dasein não é de fato nem tanto o ser do homem, como o é para Aristóteles a psyche ou a consciência para os modernos, e a fim de evitar toda confusão, Heidegger empregará em Kant e o problema da metafísica (§41) a expressão singular de “Dasein no ser humano”. A montante de toda definição do homem, “o que tenta dizer (…) a palavra Dasein, é precisamente que com o homem, o que se trata antes de tudo e ‘essencialmente’, é de ser” (François Vezin, Être et temps, Gallimard, p. 523). Eis porque o acento tônico porta sobre sein (ser), que dá, enquanto verbo, sua ressonância a esta palavra singular que está essencialmente em movimento. Dasein, é para o ser humano a instância primordial de toda consideração possível, é um ter-de-ser. A ser o que? Falando corretamente: nada, quer dizer o AÍ (Da) — onde vemos que Dasein não determina com efeito nada. Para dar a entender esta nova tonalidade da palavra Dasein (literalmente: ser o aí), Heidegger sublinha no seminário sobre Heráclito de 1966-1967 que “em Ser e Tempo, Dasein está escrito assim: Da-sein” (GA15, 204). O essencial do problema é portanto compreender a passagem de Dasein a Da-sein, assim como sugere um livro de Ivo de Gennaro e Gino Zaccaria magnificamente intitulado, Dasein: Da-sein. Tradurre la parola del pensiero.

À diferença dos textos posteriores ao meio dos anos 1930, em Ser e Tempo, Dasein é de fato raramente escrito com um traço — mas cada vez em pontos decisivos: no título dos parágrafos art36, art38 e art41, que designam as três articulações maiores da subparte intitulada: “A constituição existencial do aí”, e sobretudo na página 350 onde lemos: “O ente que porta o nome de Dasein é “iluminado” (gelichtet)”. Esta iluminação (Lichtung) que é nela mesma o Dasein (SZ 133) e da qual Heidegger verá mais tarde que ela não pode ser plenamente pensada senão a partir da eclosão do ser mesmo (ver “O Afazer do pensamento”, p. 247). esta clareira tem por nome em Ser e Tempo: abertura (Erschlossenheit). E é esta abertura precisamente que designa o AÍ (SZ 132). Não é portanto um acaso o quanto ele se aventura mais adiante no pensamento do AÍ, e que, desde Ser e Tempo, Heidegger escreve Da-sein com um traço. Da-sein não É assim senão à favor do AÍ que, do ser mesmo, em sua flagrância (Offenheit), subitamente abre assim mesmo a ele. (2013, p. 303-304)