É verdade no entanto que estas leituras desconcertantes não são absolutamente sem fundamento: elas devem em parte à ambiguidade que é ainda aquela da palavra Dasein em Ser e Tempo, e que que Heidegger não deixará de clarificar sem cessar na medida que aprofunda a palavra Dasein de maneira sempre mais abissal em particular nos tratados não publicados dos anos 1936-1944. Aprofundamento abissal, em sentido estrito, nisto que se engaja plenamente no sem-fundo (Ab-grund) que “é” o Dasein que Heidegger já dizia no curso de 1925 sobre os “Prolegômenos à história do conceito de tempo”: “Ele não se encontra simplesmente como uma coisa aí-diante, a qual daria um fundamento e um assento ao fato que ele seja, mas o fundamento é existencial, no sentido que é um fundamento aberto (erschlossener) — e em verdade um abismo” (GA20, 402).
É portanto mergulhando na abertura (Erschlossenheit) que se abre o abismo que é o Dasein. Em Ser e Tempo, Heidegger diz bem em conclusão de um parágrafo decisivo: “O Dasein é sua abertura” (ET, 133). Mas para poder assim mergulhar — para dar o salto no Dasein diz por vezes Heidegger —, nos é preciso começar por clarificar a ambiguidade que ainda plana na língua de Ser e Tempo. É clarificando esta ambiguidade que poderemos igualmente elucidar a questão da relação entre o Dasein e o homem. (p. 302-303)