GA89:213-214 – esquecer algo doloroso

Arnhold & Almeida Prado

Boss: E o que acontece com o esquecimento de algo doloroso, que de acordo com a teoria de Freud foi recalcado no inconsciente?

Heidegger: Ao deixar-ficar-o-guarda-chuva no cabeleireiro eu não penso no levar. Ao esquecer algo doloroso não quero pensar nisso. Aqui ele não me escapa, mas eu deixo que ele me escape. Esse deixar-escapar acontece da seguinte forma: cada vez mais me ocupo de outras coisas para que esse desagradável escape. A dor já é o indício de que ela foi atingida pelo acontecimento doloroso na juventude e ainda continua sendo. Mas ela não se deixa envolver por essa dor da qual ela é consciente, senão não poderia ser uma dor para ela. É um desviar de si como si mesmo, que está sendo constantemente atingido pela dor. Nesse desviar de si mesmo ela se reconhece de modo não-temático, e quanto mais ela exerce esse desviar tanto menos tem consciência dele e é absorvida no desviar, sem reflexão.

A representação científico-teórica de que no esquecimento e no recalque deva haver um recipiente físico ou psíquico, para onde o esquecido poderia ser jogado, só faz sentido com base em um reter. Uma representação do recipiente só pode ser motivada com um poder reter. Ao contrário, não se pode (178) derivar o reter do recipiente. Um “engrama” nunca é um reter de algo como algo. Engrama é uma modificação fisiológica, mas um reter é uma relação com algo, para a qual é necessária a compreensão do ser. Entretanto, um engrama é uma modificação puramente objetiva. O reter mesmo, como tal, não é fisiológico.

Xolocotzi Yáñez

Mayr & Askay

Original

  1. Concerning the metaphor of container (Behältnis) as contrasted to existential retaining (Behältnis) see Heidegger, Being and Time, p. 388 f.—translators[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

Designed with WordPress