GA7:18-19 – homem pertence à disponibilidade

Carneiro Leão

Quando tentamos aqui e agora mostrar a exploração (herausfordernde) em que se desencobre (Entbergen) a técnica moderna, impõem-se e se acumulam, de maneira monótona, seca e penosa, as palavras “pôr’’ (stellen), “dis-por” (bestellen), “dis-posição”, “dis-positivo”, “dis-ponível”, “dis-ponibilidade” (Bestand), etc. Isso se funda (Grund), porém, na própria coisa que aqui nos vem à linguagem (Sprache).

Quem realiza a exploração (herausfordernde) que des-encobre (Stellen) o chamado real, como dis-ponibilidade (Bestand)? Evidentemente, o homem (Mensch). Em que medida o homem tem este des-encobrir (Entbergen) em seu poder? O homem pode, certamente, representar, elaborar ou realizar qualquer coisa, desta ou daquela maneira. O homem não tem, contudo, em seu poder o desencobrimento (Unverborgenheit) em que o real (Wirkliche) cada vez se mostra ou se retrai e se esconde. Não foi Platão que fez com que o real se mostrasse à luz das ideias. O pensador apenas respondeu ao apelo que lhe chegou e que o atingiu.

Somente à medida que o homem já foi desafiado a explorar as energias da natureza é que se pode dar e acontecer o desencobrimento da dis-posição. Se o homem é, porém, desafiado e dis-posto, não será, então, que mais originariamente do que a natureza, ele, o homem, pertence à dis-ponibilidade? As expressões correntes de material humano, de material clínico falam neste sentido. O coiteiro, que, na floresta, mede a lenha abatida e que, aparentemente, como seu avô, percorre os mesmos caminhos silvestres, está hoje à dis-posição da indústria madeireira, quer o saiba ou não. Ele está dis-posto ao fornecimento de celulose, exigida pela demanda do papel, encomendado pelos jornais e revistas ilustradas. Estes, por sua vez, pre-dis-põem a opinião pública a consumir as mensagens impressas e a tornar-se dis-ponível à manipulação dis-posta das opiniões. Todavia, precisamente por se achar desafiado a dis-por-se de modo mais originário do que as energias da natureza, o homem nunca se reduz a uma mera dis-ponibilidade. Realizando a técnica, o homem participa da dis-posição, como um modo de desencobrimento. O desencobrimento em si mesmo, onde se desenvolve a dis-posição, nunca é, porém, um feito do homem, como não é o espaço, que o homem já deve ter percorrido, para relacionar-se, como sujeito, com um objeto.

Se o desencobrimento não for um simples feito do homem, onde é e como é que ele se dá e acontece? Não carece procurar muito longe. Basta perceber, sem preconceitos, o apelo (Anspruch) que já sempre reivindica o homem, de maneira tão decisiva, que, somente neste apelo, ele pode vir a ser homem. Sempre que o homem abre olhos e ouvidos e desprende o coração, sempre que se entrega a pensar sentidos e a empenhar-se por propósitos, sempre que se solta em figuras e obras ou se esmera em pedidos e agradecimentos, ele se vê inserido no que já se lhe re-velou. O desencobrimento já se deu, em sua propriedade, todas as vezes que o homem se sente chamado a acontecer em modos próprios de desencobrimento. Por isso, des-vendando o real, vigente com seu modo de estar no desencobrimento, o homem não faz senão responder ao apelo do desencobrimento, mesmo que seja para contradizê-lo. Quando, portanto, nas pesquisas e investigações, o homem corre atrás da natureza, considerando-a um setor de sua representação, ele já se encontra comprometido com uma forma de desencobrimento. Trata-se da forma de desencobrimento da técnica que o desafia a explorar a natureza, tomando-a por objeto de pesquisa até que o objeto desapareça no não objeto da dis-ponibilidade (Gegenstandlose des Bestandes).

Sendo desencobrimento da dis-posição (bestellende Entbergen), a técnica moderna não se reduz a um mero fazer (Tun) do homem. Por isso, temos de encarar, em sua propriedade, o desafio (Herausfordern) que põe o homem a dis-por do real, como dis-ponibilidade. Este desafio tem o poder de levar o homem a recolher-se à dis-posição (Bestellen). Está em causa o poder que o leva a dis-por do real, como dis-ponibilidade. [GA7CFS:21-23]

André Préau

William Lovitt

Original

  1. Nachstellt. L’auteur reprendra ce terme pour caractériser l’être de la vengeance, cf. pp. 130 et suiv.[↩]
  2. 1954: dieses oder jenes Unverborgene! aber die Unverborgenheit als solche? die Entborgenheit?[↩]
  3. 1954: heißt? eigentlicher in das Ereignis vereignet![↩]
  4. 1954: heißt? metaphysisch gesprochen: in einem ausgezeichneten Geheiß des Seins und den entsprechenden Bezug, vgl. Zur Seinsfrage [in: GA Bd. 9[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

Designed with WordPress