GA6T1:176-177 – concepção de conhecimento do platonismo

Casanova

Dizemos platonismo e não Platão porque não pretendemos dar sustentação à concepção de conhecimento aqui em questão a partir de uma análise originária e minuciosa da obra de Platão, mas apenas realçamos de maneira rudimentar um traço determinado por ela. Conhecimento é adequação ao que há para conhecer. O que há para conhecer? O ente mesmo. No que consiste esse ente? Desde onde se determina o seu ser? A partir das ideias e como as ἰδέαι. Elas “são” aquilo que é apreendido quando observamos as coisas em vista do modo como elas mesmas aparecem; em vista disso, como o que elas se dão: em vista de (138) sua quididade (τὸ τί ἐστιν). O que torna uma mesa uma mesa, o ser-mesa, pode ser visualizado; em verdade, não com os olhos sensíveis, mas com os olhos da alma; esse ver confunde-se com a apreensão disso que uma coisa é, de sua ideia. O que é assim visto é algo não sensível. Todavia, na medida em que ele é aquilo sob cuja luz conhecemos pela primeira vez o sensível, esse ente aí como mesa, o não-sensível se acha ao mesmo tempo acima do sensível. Ele é o supra-sensível, a quididade propriamente dita e o ser no ente. Por isso, o conhecer precisa se adequar ao supra-sensível, à ideia, trazer o que não é sensivelmente visível para diante de seus olhos, trazê-lo em geral para diante de si: re-pre-sentá-lo. Conhecer é adequar-se representacionalmente ao supra-sensível. O re-presentar, puro, não sensível que se desdobra em uma ligação mediadora do representado, se chama θεωρία. O conhecer é, em essência, teórico.

Na base dessa concepção do conhecimento como conhecimento “teórico” acha-se uma determinada interpretação do ser: essa concepção de conhecimento só tem sentido e razão de ser sobre o solo da metafísica. Com isso, a pregação de uma “essência eterna imutável intrínseca à ciência” ou bem é um mero modo de falar que não leva a sério o que fala, ou bem permanece, no outro caso, um desconhecimento dos fatos fundamentais da origem do conceito ocidental de saber. O “teórico” não é apenas diferente e diverso do “prático”, mas é fundado em si sobre uma determinada experiência fundamental. O mesmo vale também para o “prático”, que é contrastado a cada vez com o “teórico”. Tanto o “teórico” quanto o “prático”, assim como a cisão entre os dois, só são concebíveis a partir da respectiva essência do ser, isto é, metafisicamente. Nem o prático se altera sempre a cada vez em razão do teórico, nem o teórico em razão da modificação do prático, mas sempre os dois simultaneamente a partir da posição metafísica fundamental.

Krell

Original

  1. “To put forward or present” is an attempt to translate the hyphenated word vor-stellen, which without the hyphen is usually translated as “to represent.”[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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