O que se esconde como um resíduo autêntico verdadeiro no pensamento da filosofia “científica” (cf. a concepção profunda em Fichte e Hegel) é o seguinte: com base e em consequência da ideia do saber como certeza (certeza de si), fundamentar e construir o sabível de maneira uniformemente sistemática (matemática). Ainda vive nesse intuito da filosofia “científica” um ímpeto da própria filosofia, para salvar a sua coisa mais própria em face da arbitrariedade da opinião estruturada em termos de visão de mundo que vem a ser de modo arbitrário e em face do tipo necessariamente restritivo e imperioso da visão de mundo em geral. Pois mesmo na visão de mundo “liberal” encontra-se ainda esse elemento presunçoso no sentido de que ela exige que deixemos cada um ter sua opinião. A arbitrariedade, contudo, é a escravidão do “contingente”.
Mas a coisa mais própria à filosofia é esquecida, mal interpretada por meio da “teoria do conhecimento”; e onde a “ontologia” ainda é compreendida (Lotze), ela permanece uma disciplina entre outras. O fato de e o modo como aqui a antiga questão diretriz (τι τὸ ὄν;) se salvou através da filosofia moderna, ainda que ela tenha aí se transmutado, não alcança um claro saber, porque falta à filosofia já a necessidade e ela deve o seu “cultivo” agora ao seu caráter enquanto “bem cultural”.
[HEIDEGGER, Martin. Contribuições à Filosofia (Do Acontecimento Apropriador). Tr. Marco Antonio Casanova. Rio de Janeiro: Via Verita, 2014, p. 40-41]