GA61:171-175 – A direção do questionamento filosófico

Giachini

Perguntamos, portanto: dentro da filosofia, qual a objetualidade deve ser tomada na concepção prévia, como e (192) para que, e ser apreendida e mantida em sua vitalidade? O “como” já foi indicado em uma perspectiva na definição indicativo-formal da objetualidade, em relação a seu sentido de ser. Com isso, foi dito em que concepção prévia está a objetualidade que é apreendida na execução da travessia das três alternativas, na medida em que ela se decide a cada vez pelo “ou”.

Através do apreender e apreender-assim a respectiva objetualidade, o “para-quê” experimenta sua resposta, ou o próprio apreender nada mais é que execução de uma propensão, execução expressa, genuína quanto à faticidade, correspondendo à situação (na pesquisa, no conhecimento científicos), formulada e apreendida; essa propensão está aí faticamente presente, de forma não destacada e de diversos modos de mobilidade, a fim de “ser” no modo do trazer-a-si-mesmo-ao-ter.

Assim como vida (de forma indicativo-formal) é algo, cujo outro é cada vez seu outro diversamente de seu mundo, assim é ela mesma algo que “é” no modo de ter a propensão de “ser” no sentido de execução do ter-“se” (ter-se: formalmente nos modos fundamentais da apropriação e do perder). Sendo que esse “se” não expressa uma direção de sentido relacional “egoico”, especificamente destacada, desse ter, e esse mesmo não deve ser compreendido, por exemplo, como auto-observação, reflexividade, mas o ter-se e ser se determinam justamente, segundo seu sentido, a cada vez, a partir da situação concreta, ou seja, a partir do mundo de vida vivido. Como, pois, não se decide em princípio em favor da metafísica-do-eu ou coisas do gênero, se na execução da travessia das indicações de decisão se escolhe a objetualidade homem, vida fática, e isso a cada vez na concreção histórico-historial.

Que a questão pelo sentido de ser, e quiçá pelo sentido de ser dessa objetualidade toda própria, é uma questão filosoficamente principial, isso se mostra no fato de que não se trata de uma decisão alternativa sobre se se devem preferir criações culturais, obras no mundo da vida e para esse, (193) frente ao interesse pela vida pessoal, individual; ao contrário, a problemática, a serviço da qual está a alternativa, é precisamente haurir e instaurar categorialmente, primordialmente, o genuíno sentido objetual e sentido de ser de vida, na qual e para a qual se deve poder chegar um ser fático possível nas diversas direções dos mundos possíveis de vida.

A questão pelo sentido de ser da vida fática, concretamente, da vida concreta cada vez própria, pode ser apreendida no modo indicativo formal como a questão pelo sentido do “eu sou”. Todavia, seguindo o embalo da colocação principial do problema, que se dirige ao sentido de ser da vida fática, incide-se num equívoco insuperável e superficial, quando colocamos imediatamente o peso da questão, de forma não motivada e segundo um enfoque tradicional, sobre o “eu”, quando esse sentido de “eu” permanece essencialmente indeterminado, em vez de colocar o peso no sentido do “sou”.

Está precisamente implicado na propensão desse questionamento trazer à compreensão o que, em virtude de sua concepção prévia, a metafísica-do-eu e o idealismo egoico, das mais diversas nuanças, não consegue deixar surgir: a questão pelo sentido do “sou”; – não do eu como fonte e ator de uma problemática constitutiva, apreendida de forma determinada, relativo-transcendental ou idealista-absoluta; a ideia de constituição, e quiçá da constituição fenomenológica, não está necessariamente ligada com questionamento transcendental, do desenvolvimento e impostação de mundo, visto constitutivamente, a partir do eu ou da consciência e nela. Se nos é permitido trazer uma ilustração a partir da história, no sentido da teoria do conhecimento kantiana e suas modificações em direção a um idealismo absoluto, então vale a pena investigar o sentido do sum no cogito-sum de Descartes, dentro de uma problemática originária e na conquista originária das categorias interpretativas.

O sum é o primordial, quiçá, também para Descartes, mas precisamente ali já se encontra o engodo: ele não (194) permanece aí e já dispõe da concepção prévia do sentido de ser, ao modo de mera constatação, e, quiçá, de uma constatação indubitável. Que Descartes tenha podido desencaminhar-se num questionamento próprio da teoria do conhecimento ou tenha podido inaugurar esse questionamento dentro da história do espírito, é apenas uma expressão de que, para ele, o sum, seu ser e sua estrutura catego-rial, de modo algum se lhe afigurou problemático; ao contrário, o significado da palavra sum era tido num sentido indiferente, referido ao ego de forma totalmente não genuína, não esclarecido e acrítico do ponto de vista objetual-formal.

Assim, como não se trata de decidir se a atuação do mundo deve preceder o interesse pessoal, ou se o contrário, tampouco se trata do problema de saber se o mundo deve ser esclarecido a partir do eu, o objeto a partir do sujeito, e como devem ser chamadas as múltiplas e vazias correlações, ou se se deve proceder de forma contrária. No ponto de partida do “eu sou”, como orientação da interpretação categorial, não está em questão, portanto, uma centralização da problemática filosófica no “problema-eu” em alguma de suas possíveis denominações. Aqui, agudizando a questão: No caráter de ser todo próprio do “eu sou”, o decisivo é o “sou” e não o “eu”. O ponto de partida aqui como indicação formal numa problemática totalmente diversa: trazer a vida à demonstração.

Que não se trata de nenhum desses outros questionamentos deve depreender-se daquilo que já se mostrou em detalhes anteriormente, a saber, que a vida é precisamente como vida fática, que vive em seu mundo e se encontra a si mesma como mundo; que, consequentemente, na problemática do sentido objetual em relação à vida, essa não pode ser posta como uma determinada região, separada regionalmente de mundo; que uma divisão regional ou qualquer outra divisão de vida e mundo, que não esteja referida de forma determinada à problemática do sentido de ser, tem de ficar fora de consideração.

A única coisa que se pode fazer é, sempre de novo, pleitear a exigência de se compreender a interpretação como (195) fenomenológica, isto é, provindo de si e a partir do sentido de direção de sua execução, mantendo distanciados os esquemas e conceitos que se insinuam com facilidade (temáticos formais) e as representações já estabelecidas.

A indicação formal do “eu sou”, diretiva para a problemática do sentido de ser de vida, torna-se atuante metodologicamente no fato de ser levada a sua execução fática genuína, ou seja, por ser levada a efeito no caráter demonstrável de questionabilidade (“inquietação”) da vida fática como o questionar historial concreto: “sou eu?”, onde o “eu” deve ser tomado simplesmente no sentido de apontar para minha vida fática concreta, em seu mundo concreto, em sua circunstância histórico-historial e na possibilidade situacional (Situation). Será adequado precisamente ao sentido objetual da vida faticamente ruinante, se permanecer indeterminado, problemático e lábil o que deva significar propriamente “eu” e “meu”, nessa vida fática; também aqui, estágios específicos de execução e de temporalização, como relevantes e participativos no abrir a objetualidade fática como tal.

E acima de tudo, na execução dessa questão indicativo-formal, não podem entrar em jogo nenhuma opinião prévia e determinação sobre o “eu” ou sobre o “si-mesmo” (Selbst), nenhuma determinação conceitual teórica, com determinada formulação teórica e haurida de algum posicionamento filosófico. Metodologicamente, essa indeterminidade do objeto “minha vida” não é uma falta, mas garante precisamente a possibilidade de acesso, necessariamente livre e sempre nova, no avanço e na temporalização da vida fática; uma indeterminidade que não apaga seu objeto, mas lhe assegura a possibilidade de ser encontrado de forma genuína, que aponta, sem no entanto determinar de antemão.

Na execução fática concreta da questão do “sou eu?”, o sentido do “sou” deve deixar-se trazer à experiência, mas não de tal modo a ser encontrado de chofre, direta e simplesmente, de uma vez por todas, como a constatação de (196) uma relação ordenativa entre objetos. O característico dessa execução da questão é precisamente que nele, fundamentalmente, à questão não surge nenhum “sim” direto e pronto, que dirima a discussão viva, nem um “não” com as mesmas funções. Ao contrário, esse questionar fático tem-poraliza em si mesmo um questionar pelo que deva significar ser “aqui”, no círculo do experimentar e do ter da vida fática, um questionar genuinamente novo e, assim, precisamente do ponto de vista objetual, tanto mais empurrando adiante o objeto questionado vida (mostrando-a em sua problematicidade), e qual a confluência de sentido tem esse ser com o “sou”.

Essa temporalização como tal, isto é, o característico de que essa questão indicativo-formal “sou eu?” só pode ser executada faticamente desse modo, que ela temporaliza a outra questão específica, mostra que o objetual (Gegenständliche) (vida fática) e seu sentido de ser não são algo meramente constatável, que a determinidade de ser de vida não pode ser apreendida genuinamente numa tomada de conhecimento descomprometida e realizada aleatoriamente de um objeto que está à mão. [O interrogado e o questionado – a repercussão desse questionar no questionado está aninhada no sentido dessa explicitação fenomenológica.]

Rojcewicz

Original

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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