GA29-30:254-255 – libertação do ser-aí no homem

Casanova

Voltemos ainda uma vez o olhar para o percurso que fizemos até aqui. Nós tentamos elucidar uma tonalidade afetiva fundamental de nosso ser-aí, um tédio profundo do ser-aí, sob o fio condutor e em meio à claridade do fenômeno clarificado do tédio, em especial do tédio profundo. Esta elucidação movimentou-se sob a forma de um questionamento. Partimos aí de um momento do tédio profundo, da serenidade vazia no sentido do recusar-se do ente na totalidade. No tédio profundo pelo qual perguntamos, a esta recusa corresponde a permanência de fora da opressão, a falta do segredo em nosso ser-aí, que só conhece penúrias e mecanismos de defesa. Estas penúrias e estes mecanismos movimentam-se, por sua vez, imediatamente na mesma superficialidade ou talvez em uma superficialidade ainda mais supérflua do ser-aí. Ao traço interno da serenidade vazia, à permanência de fora da opressão, corresponde uma retenção insigne no sentido do instante indiretamente coanunciado. De acordo com a permanência de fora da opressão na totalidade está coanunciada a necessidade para esta situação, a necessidade da exigência mais extrema que pode ser feita ao homem: a exigência para que ele assuma expressa e explicitamente uma vez mais seu próprio ser-aí, para que ele precise tomá-lo sobre os ombros. O homem precisa realmente decidir-se ou primeiro aprender a decidir-se uma vez mais para esta exigência. Não porque é dito em uma preleção qualquer, mas apenas se a exigência ocorrer a partir de uma real opressão do ser-aí na totalidade. Em meio a esta forma questionadora, o que nos cabe é quando muito a cunhagem da prontidão para esta opressão e para o instante que lhe é pertinente; para o instante que o homem atual interpreta equivocadamente como a velocidade de sua reação e como a subtaneidade de seus programas. Junto a esta exigência não se trata deste ou daquele ideal do homem em um âmbito qualquer de seu agir possível, mas sim da libertação do ser-aí no homem. Esta libertação é ao mesmo tempo a tarefa de dar para si o próprio ser-aí uma vez mais como um fardo real – libertação do ser-aí no homem, do ser-aí que cada um e apenas cada um pode realizar a cada vez a partir do fundamento de sua essência. Mas isto não significa que nesta requisição residiria um retirar-se da realidade atual, desprezando-a ou combatendo-a. Nem tampouco significa – o que seria correlato – encontrar medidas até certo ponto emergenciais para a cultura ameaçada no interior de uma má instantaneidade. Junto à intelecção desta requisição de que o homem precisa hoje assumir efetivamente uma vez mais seu próprio ser-aí, precisamos nos manter afastados desde o início desta incompreensão intrínseca à suposição de que finalmente nos aproximaríamos em algum lugar do essencial através de uma confraternização universal no inessencial. A requisição coloca muito mais em jogo que todo e qualquer ser-aí compreenda sempre a cada vez por si esta necessidade a partir do fundo de sua essência. Se a opressão de nosso ser-aí permanece hoje de fora apesar de todas as penúrias e se falta o segredo, então trata-se inicialmente de conquistar aquela base e aquela dimensão para o homem, no interior das quais algo do gênero de um segredo de seu ser-aí venha novamente ao seu encontro. Está plenamente em ordem o fato de o homem normal de hoje e o janotinha bem-comportado se atemorizarem e terem talvez mesmo por vezes as suas vistas embaçadas em meio a esta exigência e ao empenho por nos aproximarmos do segredo. Está plenamente em ordem o fato de eles se agarrarem através daí tão convulsivamente a seus ídolos. Seria uma incompreensão querer algo diverso. [CFMMFS:199-200]

Panis

McNeill

Original

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

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