GA19:13-14 – O ser do ente

Casanova

De início, o ente é tomado de maneira totalmente indeterminada, e, em verdade, como o ente do mundo, no qual o ser-aí é, e como o ente do próprio ser-aí. Esse ente só é descerrado de início em certa esfera. O homem vive em seu mundo circundante, que só é aberto em certos limites. A partir dessa orientação natural em seu mundo, emerge para ele algo assim como a ciência, que é uma elaboração do mundo existente e do próprio ser-aí em determinadas perspectivas. Mas o que está aí inicialmente ainda não é conhecido no sentido do saber. Ao contrário, a consciência tem quanto a isso uma determinada visão, δόξα, que considera o mundo tal como ele aparece e se mostra de saída, δοκει. Assim, formam-se no ser-aí natural, de saída, determinadas visões, opiniões sobre a vida e seu sentido. E o sofista e o orador movimen-tam-se nelas. No entanto, na medida em que a partir desse ser-aí natural abre-se o caminho para a pesquisa científica, essa pesquisa precisa atravessar de maneira penetrante justamente essas opiniões, essas determinações correntes, buscando o caminho até as coisas mesmas, de tal modo que estas se tornam mais determinadas, e ela precisa conquistar a partir daí os conceitos. Isso não é óbvio para o ser-aí cotidiano, e é difícil que ele toque no ente em seu ser — e isso precisamente para um povo como o grego, porém, cuja vida cotidiana estava atrelada à língua. O Sofista — e cada um dos diálogos — mostra Platão a caminho; ele mostra o rompimento das proposições fixas e o chegar à compreensão dos fenômenos; e ele mostra ao mesmo tempo como Platão precisa ficar parado e como ele não chega a penetrar.

Para que possamos ver Platão em seu trabalho e reconstruí-lo corretamente, carece-se da posição correta. Requisitaremos, (14) por isso, a Aristóteles uma informação sobre que ente ele mesmo e, com isso, Platão e os gregos tinham em vista e quais são para eles os modos de acesso a esse ente. Assim, a partir de Aristóteles, nós nos colocaremos na postura correta, na maneira correta de ver, para questionarmos o ente e seu ser. Só quando tivermos uma primeira orientação quanto a isso, estaremos diante da possibilidade de nos transpormos para o modo correto de consideração de um diálogo platônico e, transpostos para esse modo correto, de segui-lo em cada um de seus passos. A interpretação não tem nenhuma outra tarefa senão discutir uma vez mais, do modo mais originário possível, o diálogo. (p. 13-14)

Rojcewicz & Schuwer